Houve 49 ocorrências contra 31 dos primeiros seis meses de 2021
Os casos de janeiro a junho deste ano são também 25,6% maiores que os registrados durante todo o ano de 2020 (Agência Brasil)
Denúncias de homofobia em Campinas cresceram 58% no primeiro semestre deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. Os dados são da Polícia Civil e foram divulgados pelo Centro de Referência LGBT de Campinas (CR LGBT), que completou 19 anos na última sexta-feira. Os indicadores apontam que, só nos seis primeiros meses de 2022, foram registradas 49 ocorrências dessa natureza contra 31 casos no mesmo período de 2021.
Os casos de janeiro a junho deste ano são também 25,6% maiores que os registrados durante todo o ano de 2020, quando houve 39 ocorrências em 12 meses.
São casos de intolerância e preconceito ao gênero e às relações afetivas, que impactam a vida de quem passa por essas situações.
O Centro de Referência LGBT de Campinas oferece atendimento e apoio a essas pessoas, a fim de minimizar os danos causados pelas ações homofóbicas e propor mecanismos para combater esse problema na sociedade.
De acordo com a gestora de Políticas Públicas LGBT de Campinas, Valdirene Santos, quando um caso desses chega ao CR, é oferecido apoio psicológico e feito encaminhamento para outros órgãos, como a Defensoria Pública e a coordenação estadual de políticas para a diversidade.
“Qualquer tipo de violação de direitos causa preocupação, sobretudo com a vítima e sua forma de lidar com isso. Algumas pessoas sempre serão mais atingidas que outras, então, buscar fortalecer psicologicamente essa vítima é nosso primeiro ato. Cada pessoa reage de uma forma aos processos pelos quais passa. O trabalho com as pessoas não é linear, mas podemos dizer que traumas causados por situações de preconceito e discriminação vão causar imensos estragos na vida de alguém”, explica Valdirene.
Dinte das particulridades do ser humano, Valdirene explica que muitas pessoas nem chegam a formalizar a denúncia e querem apenas buscar apoio no CR.
“Algumas pessoas não querem se expor, outras não acreditam no processo, outras entendem que é muito moroso e não vale a pena, enfim… cada caso é um caso e assim ele é tratado no CR LGBT”, afirma.
Conscientização de direitos
Ao analisar esses dados, o advogado e professor doutor da Faculdade de Direito da Pontíficia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), Luís Guilherme Soares Maziero, aponta que eles não dizem respeito apenas ao aumento de casos de violência, mas também à maior conscientização sobre direitos por essas populações.
“A própria polarização sócio-política existente no mundo contemporâneo – e não apenas no Brasil – tem fomentado ações discriminatórias contra minorias e grupos vulneráveis como um todo. Nesse contexto, aliado à sensação de anonimato que a internet proporciona, há como resultado o aumento e a rápida difusão dessas agressões. Em contrapartida, com o passar do tempo, também temos visto maior união, organização e empoderamento dessas minorias e grupos vulneráveis, incluindo as populações LGBTQIAP+, que, conscientes de seus direitos e deveres, têm buscado a reparação das agressões que sofrem e a punição dos agressores. Juntas, essas duas razões explicam bem o aumento nos números narrados”, analisa.
No Brasil, conforme explica Maziero, não há uma legislação específica que proteja as populações LGBTQIAP+ nas áreas específicas do Direito Civil, Criminal e Trabalhista. O que há é a previsão geral na própria Constituição Federal que, no artigo 5º, garante que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
Segundo Maziero, o Supremo Tribunal Federal (STF) é que tem exercido papel fundamental tanto para a proteção das populações LGBTQIAP+, como também para o combate às práticas homofóbicas.
Entre essas medidas, o especialista aponta o direito ao estabelecimento da união estável entre casais homoafetivos, determinado em 2011, e a decisão que considerou atos homofóbicos como crimes, em 2019.
“Embora a discussão quanto à necessidade de proteção seja cada vez mais presente e difundida nos meios de debate, ainda há enorme dificuldade dessas pautas avançarem nos espaços públicos, sobretudo no âmbito do Poder Legislativo, afinal, ali, dividem espaço com paradigmas tradicionais e conservadores da sociedade, que tem se mostrado resistentes ao necessário processo de mudança e adaptação”, aponta Maziero.