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Denúncia de corrupção põe Zé Carlos na mira de operação do Gaeco

MP apreende documentos, computadores e celulares nas casas do presidente da Câmara e do seu advogado Rafael Creato

Isadora Stentzler | Ronnie Romanini | Thiago Rovêdo
18/08/2022 às 08:55.
Atualizado em 18/08/2022 às 08:55
Agentes do MP e Gaeco recolhem documentos em cumprimento a mandado de busca e apreensão contra o presidente da Câmara, Zé Carlos (Gustavo Tilio)

Agentes do MP e Gaeco recolhem documentos em cumprimento a mandado de busca e apreensão contra o presidente da Câmara, Zé Carlos (Gustavo Tilio)

O presidente da Câmara de Campinas, Zé Carlos (PSB), e o advogado comissionado do parlamentar na Casa de Leis, Rafael Creato, foram alvos de uma operação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) que apura cobranças de propinas para a manutenção ou prorrogação dos contratos de execução de serviços terceirizados junto ao Poder Legislativo. Segundo o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), as investigações continuam e novas diligências serão realizadas futuramente.

Foram cumpridos mandados na residência do vereador, no Conjunto Habitacional Padre Anchieta, um na casa de Creato, em Jundiaí, outro no seu escritório de advocacia em Campinas, na Câmara Municipal e no Teatro Bento Quirino, onde atualmente funcionam o gabinete do presidente e outros setores da Casa. Houve a apreensão de diversos documentos, computadores, pen drives e aparelhos de telefone celular.

De acordo com o promotor do Gaeco, Rodrigo Lopes, a investigação começou a ser realizada no segundo semestre do ano passado, após denúncia feita pelo também vereador Marcelo Silva (PSD) junto ao MPSP. O órgão apontou que após Zé Carlos assumir a presidência da Câmara, em janeiro de 2021, ele começou a chamar as empresas que prestam serviços terceirizados na Casa de Leis e propor pagamento de propina para que os contratos continuassem a ser renovados.

"Eram pedidos genéricos de dinheiro, com uns valores mais baixos e outros mais altos, dependendo do tamanho da empresa. Os investigados chegaram a falar para uma das empresas que se ela não pagasse o que era pedido, já haveria outra prestadora de serviço que estava disposta a pagar", afirmou o promotor.

O promotor Felipe Bertolli informou também que há gravações que corroboram com as acusações, nos quais é possível identificar tanto Zé Carlos, como Creato, pedindo a propina para que os contratos fossem renovados. A empresa Grupo Mais, por exemplo, responsável pela TV Câmara, foi uma das que receberam proposta para repassar dinheiro. O promotor ressaltou que, conforme apurado até agora, nenhum dos empresários fez qualquer tipo de pagamento.

"Quando ele [ZÉ CARLOS]passou a desconfiar que estava sendo gravado, ele pedia para deixarem celulares e relógios no banheiro antes das reuniões acontecerem. Vamos aprofundar as investigações sobre outras empresas e outras diligências podem ser feitas", disse o promotor. 

A operação foi denominada Lambuja. Participaram cinco promotores de justiça, sete servidores do MPSP e 43 policiais militares. De acordo com o órgão, a investigação prossegue para identificar outros eventuais casos de corrupção ativa, lavagem e ocultação de bens. Há também a apuração para identificar se alguma empresa pagou os valores pedidos pelo presidente da Câmara.

A operação recebeu a denominação de Lambuja em alusão à cobrança ilegal feita pelos investigados para que empresários lhes concedessem vantagens pessoais, condição exigida para que os contratos firmados com a Câmara fossem mantidos ou prorrogados.

Mais uma

Esta é a segunda vez somente neste semestre que Zé Carlos vira alvo do MPSP. No final de julho, o promotor de justiça Ângelo Carvalhaes instaurou um inquérito civil que apura as denúncias contra o parlamentar por supostos crimes de rachadinha - quando um político fica com parte do salário dos seus assessores.

O promotor informou que, por não ter tido elementos suficientes para o arquivamento da denúncia, os indícios de participação nas supostas irregularidades continuam. O presidente da Câmara nega a prática da rachadinha, disse que prestou todos os esclarecimentos e que recorreu da decisão da promotoria.

Segundo Cavalhaes, a decisão pela instauração de um inquérito civil e a continuidade das investigações contra o vereador Zé Carlos ocorreu pelo fato de quatro assessores parlamentares que trabalham com o político, dois na presidência da Casa e dois no gabinete, terem se negado a colaborar com a apuração das denúncias. De acordo com o promotor, os quatro assessores do parlamentar se recusaram a entregar, de forma espontânea, extratos bancários de suas contas à Promotoria.

Wandão aguarda desfecho do caso

Presidente do PSB em Campinas, Wandão de Almeida disse que irá aguardar as investigações para se posicionar. "Primeiro vamos aguardar o desfecho. Trata-se de uma investigação, não é uma condenação. Então não podemos fazer condenação prévia. Vamos aguardar o desfecho das investigações, aguardar o posicionamento do Zé Carlos, porque, como figura pública, estamos sempre exposto", disse.

Ao telefone, Wandão disse que trocou mensagens com Zé Carlos, ontem, para saber como ele estava. "Não havia suspeita. Eu até recebo [a informação da operação] com certa surpresa. Não tenho conhecimento prévio de nada", apontou. Segundo ele, o partido também irá aguardar o desfecho das investigações. "Não posso emitir nenhum juízo sem sequer ter conhecimento do teor da denúncia. Então a posição nossa é aguardar. Dar o direito de defesa", reforçou.

A reportagem fez contato com o PSB Estadual e Nacional, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição. Prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos) se limitou a dizer que "é um assunto interno do Legislativo" e também não comentou o caso.

O professor da Pontíficia Universidade Católica de Campinas (PUC) e cientista político Vitor Barletta Machado disse que escândalos de corrupção impactam a atuação do Legislativo. "No ano de eleições, qualquer tipo de denúncia pode ter um impacto no eleitorado. Agora, a questão é qual é o desdobramento dessa denúncia", avaliou. Em relação ao Legislativo, Machado apontou que o funcionamento da Casa acaba se voltando à denúncia, deixando aquém outros projetos devido à necessidade de investigação e acompanhando do caso. Já em relação à sociedade, a percepção de casos de corrupção depende da bagagem política de cada indivíduo. "Temos um conjunto de pessoas, um número considerável do eleitorado, que já se coloca meio à margem das questões políticas, e, pra eles, o escândalo que apareça, é só mais um dentro daquilo que imagina que já acontece no cenário da política. Independente do que esteja acontecendo vão manter essa imagem negativa que já possuem", explicou. 

Silva fez a denúncia após receber áudios ‘comprometedores’

Autor da denúncia, o vereador Marcelo Silva explicou que recebeu, de um funcionário de uma empresa terceirizada, três gravações realizadas nas dependências da Câmara que demonstravam os pedidos de propinas feitos pelos investigados. Após isso, ele decidiu levar o material até o MPSP.

"Em fevereiro de 2021 o rapaz da terceirizada me procurou com os áudios. Eram dois do advogado Rafael [CREATO]e um do Zé Carlos. Eu como homem público, como vereador, estaria prevaricando caso não fizesse algo. Mas são áudios explícitos, que fala em mudar contrato caso não receba dinheiro", contou. 

Marcelo também afirmou que fez apenas o que era obrigatório de sua parte e não se trata de perseguição política. "Se tivesse qualquer desavença, eu teria vazado esses áudios no ano passado, justamente para preservar a presunção de inocência do presidente da nossa Casa", disse. 

Outros partidos também se pronunciaram sobre o assunto. A bancada do PT, formada por Cecílio Santos, Guida Calixto e Paolla Miguel, informou que as denúncias são preocupantes e devem ser apuradas. "Defendemos que as investigações ocorram sem nenhuma forma de impedimento ou resistência, que seja garantido o inquérito investigativo imparcial, com garantia do pleno direito de defesa", disse através de nota.

Para Gustavo Petta (PCdoB), outras iniciativas poderão ser tomadas. "Defendemos a investigação e apuração dos fatos e que ela ocorra de forma transparente e que os culpados sejam identificados e responsabilizados", disse.

A vereadora Mariana Conti e líder de bancada do Psol afirmou que considera as denúncias graves. "Logo cedo recebemos a notícia da operação policial na Câmara. Exigimos investigação e responsabilização", disse. Líder da bancada do PL, o vereador Jorge Schneider afirmou que, no momento, as apurações devem ser realizadas pela Justiça. 

‘É prematuro falar em afastamento’, diz Tórtima 

O advogado Ralph Tórtima Filho, que atua na defesa do vereador Zé Carlos, nega as acusações e disse que é "prematuro" falar em cassação. Ele conversou com a imprensa por volta das 12h de ontem, na saída do prédio da Câmara, onde promotores do Ministério Público (MP) cumpriram um dos cinco mandados de busca e apreensão. "É muito prematuro falar em afastamento. Nós solicitamos acesso aos autos e o vereador fará questão de prestar todos os esclarecimentos", disse. A reportagem questionou sobre as acusações de favorecimento a empresas, vantagens ilícita e corrupção. De acordo com o advogado, em conversa que teve com Zé Carlos, "ele nega que isso tenha existido".

Pela manhã, Zé Carlos permaneceu em casa. A reportagem foi até a casa dele, que também foi alvo da ação do MP, e sua esposa disse que ele daria uma coletiva de imprensa à tarde. Por orientação de Tórtima, ela foi cancelada. Segundo o advogado, Zé Carlos estava "muito tranquilo". "Ele me garante que não há problema. Ele queria se manifestar. Mas nós queríamos conhecer os autos para então ele prestar todos os esclarecimentos possíveis. Não adianta ele prestar algum esclarecimento sobre aquilo que ele ainda não conhece", contextualizou.

A defesa do advogado Rafael Creato, que também foi alvo da operação Lambuja do MP, com mandado cumprido no município de Jundiaí, não foi localizada. Tórtima não comentou o caso envolvendo Creato. 

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