Texto sugere que município deve atuar em áreas de ‘decadência urbana decorrentes da concentração de usuários de drogas’, removendo usuários e combatendo traficantes (Cedoc)
Foi adiado pela quarta vez pela Câmara de Vereadores, o Projeto de Lei Ordinária (PLO) 115/19 do vereador Nelson Hossri (PSD) que, entre outras coisas, determina a internação compulsória de dependentes químicos. Em todas as sessões, a pauta foi acompanhada de protestos por integrantes da luta antimanicomial que se baseiam em orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) (que já emitiu parecer contrário a esse tipo de tratamento). Na última, de segunda-feira (12), base aliada se somou ao pedido de vista da oposição e o tema voltará à pauta somente no próximo ano.
Hossri justificou seu projeto com base na Lei Federal 11.343/2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e prevê internação desses usuários, e na Lei 10.216/2001, que institui a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais.
“O projeto autoriza convênios com clínicas particulares que tenham equipe multidisciplinar, retaguarda médica e todo tratamento adequado que um dependente químico e sua família, quando ainda existir vínculo, merecem. Isso por que o município não tem vagas suficientes, e a forma que a saúde mental tem sido trabalhada não tem demonstrado sucesso, prova disso é o aumento de moradores de rua dependentes químicos”, argumentou.
O texto, proposto ainda no ano de 2019, estabelece deveres ao município com relação à prevenção ao uso de drogas, internação compulsória de dependentes químicos e responsabilidade do Poder Público por áreas de “decadência urbana decorrentes da concentração de usuários de drogas”.
O PLO entende como concentração de usuários de drogas locais que reúnam pelo menos dois dependentes químicos, de forma sistêmica. O PLO sugere que o município atue na recuperação desses espaços, removendo os usuários, combatendo narcotraficantes e priorizando investimentos na área.
A medida ainda aponta que devem ser dadas alternativas de tratamento para os usuários de drogas, bem como apoio aos familiares. O município também poderá contratar entidades privadas para atuação no processo de recuperação. Caberá ao município fazer a fiscalização.
O texto segue dizendo que se esses locais forem ligados a alguma religião, o direito de crença deve ser respeitado.
Segundo o documento Contagem da População de Rua, elaborado pela Prefeitura Municipal de Campinas no ano de 2021, o município possuía, na época, 932 pessoas em situação de rua. A pesquisa perguntou a eles se faziam uso de alguma substância. Dos 932, 181 não responderam. Dos 751 que responderam, 15% disseram que não usam e 85%, índice que corresponde a 638 entrevistados, disseram que usam. A maioria afirmou consumir álcool (64,4%), seguido de tabaco (32,2%). Um número expressivo disse usar mais de uma substância.
A mesma pesquisa também mostrou a distribuição geográfica dessa população. A maioria, 50,7%, estava na região Leste, 23% na Sul, 18,8% na Norte, 4,1% Sudoeste e 3,3% na Noroeste. Também chama a atenção no levantamento que 15,8% dos entrevistados disseram possuir algum transtorno psíquico.
Questionado se esse projeto não daria margem para um higienismo social, Hossri negou. “O que desejo é tratamento adequado para quem precisa ser tratado. Se eles não possuem mais discernimento, o município precisa intervir tanto na recuperação do indivíduo como na revitalização dos espaços públicos que foram criados para convivência, lazer e qualidade de vida. Ou vamos deixar nosso Centro se tornar a maior cracolândia do Brasil?”, questionou.
Na segunda-feira (10), o Governo Federal lançou o Plano Ruas Visíveis - Pelo Direito ao Futuro da População em Situação de Rua. A medida promove a efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua e tem investimento inicial de R$ 982 milhões. Para Hossri, no entanto, a medida é paliativa. “Não adianta investir em moradia e trabalho sem antes tratar um dependente das drogas. Primeiro trata e depois oferece trabalho e moradia”, defendeu.
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