reflexos

Crescem os óbitos de pretos e pardos

No comparativo com o ano passado, o aumento de mortes foi menor na população branca

Francisco Lima Neto
24/07/2020 às 12:08.
Atualizado em 28/03/2022 às 20:33
Para Tirza Aidar, a população mais empobrecida é também mais vulnerável a vários problemas de saúde (Cedoc/RAC)

Para Tirza Aidar, a população mais empobrecida é também mais vulnerável a vários problemas de saúde (Cedoc/RAC)

Durante a pandemia do novo coronavírus, houve elevação do número de mortes de pessoas autodeclaradas pardas e pretas em Campinas. Entre 16 de março e 30 de junho deste ano, o Município teve um aumento de 9% no total geral de mortes, considerando todas as etnias, em comparação com 2019. No entanto, a distribuição foi desigual. Enquanto a população branca registrou alta de óbitos de 7,5%, entre os declarados pretos o crescimento de 19,6%. Já para os pardos, o índice foi de 11,9%. Em números absolutos, as mortes registradas em cartórios neste período totalizaram 2.657, sendo 1.889 óbitos de pessoas declaradas branca — no mesmo período do ano passado foram 1.758, aumento de 7,5%. Já entre os pardos, foram 462 neste ano ante 413 em 2019, um aumento de 11,9%. Já entre os pretos, o número de mortes em 2020 foi de 220, contra 184 no mesmo período do ano passado, um crescimento de 19,6%. Constam, ainda, 51 óbitos cuja raça/cor não foi declarada pelo médico e/ou o declarante no momento do registro de óbito, ante 47 no ano passado, aumento de 8,5%. As informações estão no novo módulo do Portal da Transparência, plataforma desenvolvida pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), que reúne os registros de óbitos feitos pelos cartórios brasileiros, e disponível para todos desde a primeira quinzena do mês, dentro da página Especial Covid (http://transparencia.registrocivil.org.br/especial-covid). Os dados utilizam como base as informações contidas nas Declarações de Óbitos (DOs), emitidas pelos médicos no ato de falecimento, e que são a base da certidão de óbito. Dos 458 óbitos apenas por Covid-19 no período avaliado de 2020, foram 70,7% de pessoas declaradas brancas, 18,3% de pessoas declaradas pardas, e 10% da população preta. No Estado, 63,8% óbitos envolveram pessoas declaradas brancas, 24%, pardas, e 8,1% da população preta. Para Tirza Aidar, estatística e doutora em demografia e pesquisadora do Núcleo de Estudos de população Elza Berquo (Nepo) e professora do Departamento de Demografia no IFCH, da Unicamp, a população mais empobrecida que vive nas grandes cidades é vulnerável a vários problemas de saúde. Muitos estudos desenvolvidos no Nepo têm demonstrado, por exemplo, que são os jovens pobres e negros (pretos ou pardos) as maiores vítimas de homicídio e acidentes de motocicletas. "Pesquisas demonstram também que as áreas da cidade onde residem as pessoas mais pobres e com baixa escolaridade coincidem com a maior proporção de população que se auto declara como negra, preta ou parda, e com a maior prevalência e mortalidade precoce devido a doenças crônicas evitáveis, tais como hipertensão e diabetes. Estes são fatores de risco já comprovados para a letalidade da infecção pela Covid-19", diz. Além disso, segundo ela, esses grupos populacionais residem em domicílios com alta densidade, muitas pessoas convivendo em poucos e pequenos cômodos, e em locais sem infraestrutura urbana adequada, como suprimento de água potável diariamente, e possibilidade de mobilidade urbana segura por meio de transporte público. "Outra razão muito importante é que justamente essa população não tem facilidade financeira alguma para manter o desejável isolamento e distanciamento social para evitar a contaminação. Portanto, mesmo que o SUS conseguisse atender todos que necessitam, muitos apresentam quadros já comprovados como de alto risco para agravar o estado de saúde devido à infecção", argumenta. Para a pesquisadora, é uma conjugação de fatores, que incluem o acúmulo de carências ao longo da vida, que faz com que tais grupos se tornem mais vulneráveis à pandemia. "Para diminuir o risco seriam necessárias várias ações direcionadas a essa população, que incluíssem, em primeiro lugar, a garantia de sobrevivência em tempos de desemprego e impossibilidade de trabalhar em casa. Sem falar nas crianças, adolescentes e jovens que necessitam manter o mínimo de estímulo para atividades escolares on-line", finaliza.

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