O plano de gestão do professor José Antonio Rocha Gontijo, candidato a reitor da Unicamp, propõe a constituição de uma universidade "relevante, inovadora e socialmente impactante" (Divulgação)
Nos dias 25 e 26 de março a comunidade acadêmica da Universidade de Campinas (Unicamp) volta às urnas para votar em quem deve ser o reitor entre abril de 2025 a abril de 2029. O segundo turno da consulta conta com os professores Paulo César Montagner (Cesinha), da Faculdade de Educação Física, e José Antônio Rocha Gontijo, da Faculdade de Ciências Médicas. No dia 12 de março, a Comissão Organizadora da Consulta (COC) divulgou que Cesinha obteve 46,88% dos votos no primeiro turno e terminou em primeiro lugar, à frente de Gontijo, com 39,58% dos votos, e da professora Maria Luiza Moretti, que ficou em terceiro com 15,54% dos votos e está fora da disputa. Ao todo, 11.352 eleitores participaram do primeiro turno.
De acordo com a Unicamp, integram o colégio eleitoral cerca de 38.300 eleitores, divididos aproximadamente em 1.900 professores, 6.900 demais servidores e 29.400 estudantes. O voto é facultativo. Para vencer no primeiro turno, o candidato precisaria obter mais de 50% dos votos ponderados válidos – das categorias docente, discente e servidores. O peso do voto dos docentes é de três quintos. Já o peso dos votos dos servidores e dos estudantes é de um quinto.
A consulta marca a sucessão do reitor Antonio José de Almeida Meirelles, no cargo desde abril de 2021. Ao final do segundo turno, o Conselho Universitário (Consu), órgão máximo de deliberação da Universidade, deverá elaborar uma lista tríplice e encaminhar o documento ao governador do Estado, que nomeará o novo reitor. Tradicionalmente, o governador indica o primeiro nome da lista elaborada pelo Consu. O Correio Popular publicou ontem matéria com o candidato Cesinha e agora revela como foi a entrevista com o professor José Antônio Rocha Gontijo. Confira.
Quais as razões que levaram o senhor a decidir disputar a Reitoria da Unicamp?
O cargo de reitor deve ser ocupado por pessoas que sejam capazes de representar a comunidade em todas as suas dimensões: política, acadêmica, ética. Deve ser um concretizador das visões de médio e longo prazo dos caminhos que a instituição deve trilhar para se estabelecer inequivocamente relevante para a sociedade. Precisam ter capacidade de dialogar, agregar e negociar na forma democrática e cidadã os vários segmentos que compõem a instituição, interna e externamente. Deve ter envergadura suficiente para ser ouvido e respeitado pelos agentes externos à Universidade. Durante minha vida, de 38 anos servidos à Unicamp, acumulei um conjunto de competências e experiências, por meio das posições de liderança dentro da Unicamp (fui diretor da Faculdade de Ciências Médicas, chefe de gabinete da Reitoria), assim como externamente à Unicamp (fui coordenador da Área da Medicina I da CAPES). Sou respeitado e conhecido pela minha trajetória acadêmica e administrativa, por lideranças nacionais e mundiais, entre diretores de agências de fomento, instituições estrangeiras renomadas e personalidades políticas, alguns dos quais até tiveram aulas comigo. Não menos importante, fui estimulado a esta candidatura apoiada por uma parcela significativa da comunidade acadêmica, o que me enche de entusiasmo e responsabilidade neste pleito de assumir o cargo máximo representativo de uma das principais universidades da América Latina. Vale ressaltar que os desafios do próximo quadriênio não são pequenos. A Unicamp, para cumprir cada vez melhor sua função social de formar recursos humanos, gerar conhecimento, propor soluções para problemas da sociedade, bem como atuar de forma responsável em ações de inclusão social, precisa estar sempre disposta a inovar e se reinventar. Para tanto, a garantia de nosso recurso do Tesouro do Estado diante da consolidação da reforma tributária é fundamental para garantirmos a Unicamp pública, gratuita, autônoma. A Unicamp é um centro gerador de conhecimento e na formação de pessoas, tendo, hoje, cerca de 50% de suas vagas preenchidas por estudantes advindos de escolas públicas, o que denota sua importância como agente transformador da sociedade. Também será preciso atrair, engajar e manter o qualificado corpo de professores, pesquisadores e funcionários, buscando valorizar as pessoas e suas carreiras. Ademais, tenho amplo conhecimento e vivência das questões associadas à área da saúde da Unicamp, que incluem o HC, CAISM, Gastrocentro, Hemocentro e também o Hospital de Sumaré. E tudo isso precisa ser feito com alguém que seja respeitado como interlocutor e preparado para as negociações e construções com as diversas esferas e entes que se relacionam com a Universidade.
Destaque, por favor, três compromissos do seu plano de gestão.
Nosso plano de gestão, construído com desenhos de várias mãos, está estruturado em torno de compromissos fundamentais para fortalecer a Unicamp como instituição de ensino, pesquisa e impacto social. Três compromissos a serem destacados são:
1) Defesa da Universidade Pública, Autônoma e Gratuita – está no nosso cerne, desde a nossa fundação, o caráter público, que a Unicamp deve ter. Isto fortalece o seu papel como agente promotor de mudanças, com capacidade de uma visão holística e menos vulnerável à influência dos interesses momentâneos e de setores específicos da sociedade. Gratuidade, pois a missão de formação de pessoas não deve pressupor contrapartida financeira de quem o recebe e autônoma pois essa forma de gestão garante a estabilidade de longo prazo à instituição;
2) Recuperação e fortalecimento do protagonismo da Unicamp – avançar nas fronteiras do conhecimento e na vanguarda acadêmica, oferecendo sua contribuição para as políticas públicas e desenvolvimento da região, do estado e do país. Também contribuirá para uma sociedade independente cientificamente, sem perder sua característica de fortalecer uma sociedade justa e democrática. A presença ativa nas mesas de discussão com os vários níveis de governo e entes da sociedade fortalece e destaca o seu relevante papel. Nosso importante compromisso com a sociedade que nos financiou e apoiou nestes já 58 anos completos é manter a Unicamp relevante, inovadora, socialmente impactante;
3) Valorização das Pessoas e das Carreiras – o maior patrimônio da Unicamp são as pessoas que a compõem – docentes, servidores e estudantes. Um capital humano inestimável. Defendemos uma gestão voltada ao bem-estar, à valorização profissional e ao fortalecimento de carreiras, promovendo um ambiente acadêmico saudável e inovador. Isso exige melhorias nos espaços físicos, recursos tecnológicos atualizados e o necessário compromisso com a sustentabilidade de recursos e ambiental. Entendemos a diversidade como um valor e aprimoraremos os programas de ações afirmativas, acessibilidade, engajamento e permanência.
Como pretende promover a aproximação da Unicamp com os diferentes segmentos da sociedade?
A Unicamp tem um compromisso com a sociedade que vai além da formação acadêmica. Nossa proposta inclui o fortalecimento de conselhos consultivos, que serão compostos com vários representantes da sociedade. Vamos estruturar um sistema permanente de diálogo com a população, garantindo que a Unicamp responda ativamente às demandas da sociedade. Além disso, temos planos específicos para a "Expansão da extensão universitária". Fortaleceremos os programas e as ações que constroem conhecimento e inovação em parceria com a comunidade, desde ações sociais e ambientais até iniciativas tecnológicas para pequenas e médias empresas. Também com "Parcerias estratégicas". Estimularemos colaborações com os setores públicos e privados, promovendo desenvolvimento econômico e soluções para desafios sociais e ambientais. Contribuir com as políticas públicas sempre esteve na rotina das ações da Unicamp e pretendemos que isso seja revigorado e se volte a ser uma marca da universidade.
O custeio da área de saúde da Unicamp sempre foi motivo de preocupação por parte dos gestores da universidade. Qual a realidade atual e como pretende tratar dessa questão?
A Unicamp desempenha um papel crucial na assistência hospitalar na região (e até fora dela) e na formação de profissionais da saúde, e a área da saúde representa um campo importante para pesquisa, inovação e extensão para todas as unidades da Unicamp. Será necessário um conjunto de ações para que a área se recupere e cresça, sem comprometer o restante da Universidade. Ao mesmo tempo, a própria Unicamp não pode ser um entrave para que a área da saúde receba os apoios que outras instituições conseguem. Nesse sentido, vamos trabalhar na "Diversificação do financiamento" – maior participação dos governos estadual e municipal, além de outras fontes extraorçamentárias; "Desburocratização e eficiência" – melhorias nos processos internos para reduzir custos operacionais sem comprometer a qualidade dos serviços; e "Defesa do financiamento público" - manteremos o compromisso com um atendimento de excelência e de caráter público da assistência à saúde, mantendo aproximação e diálogo constante com as secretarias de saúde da região, Departamento Regional de Saúde, Secretaria de Estado da Saúde e Ministério da Saúde.
Existe uma demanda na RMC pela oferta de novos cursos por parte da Unicamp, inclusive no período noturno. O seu plano de gestão contempla este aspecto? Se sim, que novos cursos poderiam ser oferecidos pela universidade?
Sim, novos cursos podem ser oferecidos pela universidade. Entendemos a necessidade de ampliar a oferta de cursos, especialmente aqueles alinhados às demandas regionais. Nossa gestão buscará a expansão do ensino noturno para facilitar o acesso ao ensino superior para estudantes trabalhadores. A ideia é buscar novos cursos estratégicos, como Direito, Engenharia Biomédica, Fisioterapia e cursos ligados à Tecnologia da Informação, uma área de imensa demanda hoje e uma das quais a Unicamp é considerada referência. Além disso, é necessária a flexibilização curricular, permitindo formações mais adaptadas às realidades dos estudantes como profissionais e cidadãos, dentro dos parâmetros regulatórios e de elevada qualidade.
Nos últimos anos, a Unicamp ampliou as políticas de ação afirmativa e promoveu a inclusão de diferentes segmentos em seus cursos. Há espaço para novas medidas nesse sentido? Se sim, como o senhor pretende implementá-las, considerando que elas também exigem consistentes programas de permanência?
Sim. A Universidade se enriqueceu de conhecimento, abordagens epistêmicas diversas e reforçou seu caráter transformador da sociedade, desde que programas como o Programa de Formação Interdisciplinar Superior (ProFIS), que beneficia os egressos de escolas públicas regionais, e a implantação de cotas étnico- raciais e vestibular indígena foram implantadas. Além de manter e aprimorar as ações já existentes, Há espaço para a ampliação de cotas para novos grupos sub-representados. Realizaremos também o reforço nos programas de permanência estudantil, garantindo suporte financeiro, moradia e alimentação para quem mais precisa e o apoio psicológico e acadêmico para estudantes fortalecendo a inclusão real e efetiva.
Frequentemente, a autonomia das universidades públicas é alvo de ameaças. Como reagir a esses ataques e como envolver a sociedade nessa questão?
A autonomia universitária é um pilar fundamental da democracia e precisa ser protegida. Para garantir que a Unicamp continue sendo pública, gratuita e autônoma, nossa gestão atuará em três frentes principais: articulação política e jurídica, junto aos políticos e gestores públicos, assegurando que a Constituição Estadual e a autonomia da Unicamp sejam respeitadas; mobilização da comunidade acadêmica e da sociedade civil, demonstrando o impacto positivo da universidade no desenvolvimento econômico, social e científico do país; e transparência e diálogo constante com a sociedade, reforçando que a Unicamp não é apenas um espaço de ensino e pesquisa, mas um patrimônio coletivo, um bem público que beneficia toda a população. Além disso, precisamos nos preparar para os desafios impostos pela reforma tributária, que será consolidada até 2029 e pode afetar o financiamento das universidades estaduais paulistas. A Unicamp deve atuar ativamente junto ao Cruesp (Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas) para garantir que o Governo do Estado mantenha o compromisso com o financiamento público do ensino superior. O reitor da Unicamp deve liderar um esforço estratégico de relações externas, fortalecendo a presença da universidade em instâncias decisórias e ampliando o engajamento da sociedade. Para isso, é essencial um plano de comunicação que trabalhe de forma ativa na conscientização da população sobre o papel da Unicamp como um laboratório de ideias, ou um protótipo da sociedade. A defesa da Unicamp deve ter amplo apoio da sociedade, que precisa ser esclarecida para entender a dimensão de sua contribuição e, então, valorizar a universidade pública, gratuita e de qualidade como um bem essencial para o desenvolvimento do Estado de São Paulo e do Brasil. Para isso, devemos destacar sua importância na formação de profissionais qualificados pela graduação e pela pós-graduação, na produção de conhecimento, na geração de empregos, na inclusão social e na troca de conhecimentos e experiência com os demais membros da sociedade.
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