LEGISLAÇÃO

Comércio ilegal de fios entra na mira da Prefeitura de Campinas

Decreto que regulamenta Lei tem por objetivo combater o furto e a procedência ilícita

Luis Eduardo de Sousa/ luis.reis@rac.com.b
25/05/2023 às 08:58.
Atualizado em 25/05/2023 às 08:58

Com regulamentação da Lei deve aumentar a fiscalização em estabelecimentos como ferros velhos e cooperativas de reciclagem para detectar se há venda de cobre de procedência duvidosa (Rodrigo Zanotto)

Um decreto publicado na quarta-feira (24) no Diário Oficial (DO) de Campinas fecha o cerco contra o comércio ilegal de cobre e alumínio na cidade, mas causa preocupação a proprietários de ferros velhos e, principalmente, aos catadores que dependem de materiais recicláveis para sobreviver.

O decreto regulamenta a Lei nº 13.696, de 9 de outubro de 2009, que trata da comercialização dos objetos em formato de fios no mercado de reciclagens. Embora a legislação esteja vigente há mais de dez anos, a regulamentação vem como um reforço para combater furtos de fios e pequenos objetos (que possuem cobre) na região central e no chamado ‘centro expandido’, que contempla bairros como a Vila Industrial, Botafogo, Bonfim e Vila Itapura. Uma reportagem publicada pelo Correio Popular na edição do último dia 12 mostra que o alto número de furtos se tornou um problema para moradores destas regiões e para as forças de segurança, gerando preocupação.

Na Vila Itapura, por exemplo, moradores relataram que é constante a invasão de propriedades para furtar fios da instalação elétrica e pequenos aparelhos eletrônicos, como interfones, câmeras e monitores. 

Com a regulamentação da Lei deve aumentar a fiscalização em estabelecimentos como ferros velhos. Catadores e proprietários de pontos comerciais temem prejuízos pelo menor fluxo de material. Isso porque, na visão deles, é impossível identificar o que é de origem lícita ou ilícita nos materiais, de modo que a regra beneficia empresas que atuam no ramo e aperta o comércio de cobre e alumínio, os dois materiais mais caros. A Administração alega que, por ter alto valor agregado, os materiais raramente são encontrados no lixo e, quando furtados, são rapidamente vendidos.

A lei é de autoria do prefeito Dário Saadi (Republicanos), criada quando o político ainda era vereador. A sanção foi concedida pelo então prefeito, Hélio de Oliveira Santos, em 09 de outubro de 2009. Apesar de estar em vigência há mais de dez anos, nas ruas os comerciantes do segmento seguem comprando produtos de cobre e alumínio em formato de fios mesmo sem saber a origem.

Em um ferro velho localizado na Vila Lemos, a proprietária compra o material em pequenas quantidades e paga R$ 22 o quilo, um valor menor que o oferecido no mercado, já para evitar que catadores levem fios até o local. Mesmo assim, ela acha que nos termos em que a lei é constituída, causa prejuízo a quem depende de reciclagem para sobreviver. “Nos afeta porque todo eletrônico que entra tem fio, batedeiras, liquidificadores velhos e similares. O acúmulo desse material ao longo do mês dá uma boa quantidade. Mas, como você vai provar que isso não é de origem ilegal? Se um vendedor trouxer uma quantidade muito grande, acredito que seja necessária a comprovação da origem, mas no caso desses picados, é impossível. Se a polícia bater aqui, a gente vai pagar o pato?”, relata Andreia Miguel Vieira, de 43 anos.

Para Andreia, a lei desestimula o trabalho no segmento. O estabelecimento dela tem dois anos de operação e emprega cinco pessoas fixas e mais duas esporádicas. O trabalho confere uma renda média de R$ 1,5 mil mensais aos colaboradores. “É um desestímulo que vai de encontro com o baixo preço do material, que caiu muito no último ano, e com a pequena margem de lucro que temos. A gente trabalha muito aqui para ganhar muito pouco”, diz.

Valdino Luiz Teles, de 41 anos, está em Campinas há apenas 15 dias. Goiano, ele tem pegado reciclagens para conseguir dinheiro enquanto não arruma emprego. Mesmo há pouco tempo na cidade, conta que já teve problemas por causa dos fios de cobre. “Parei de pegar qualquer coisa que tenha cobre, pois quando a polícia te pega não tem como justificar. Veja esse monitor”, disse, mostrando à reportagem o aparelho que estava em um contêiner de lixo. “Isso aqui tem um monte de cobre dentro e está no lixo, eu poderia pegar. Mas para pegar eu preciso justificar, e não tem como”, completa Teles, soltando o monitor de volta ao lixo.

Há 10 anos, Jorge da Silva, de 57 anos, vive exclusivamente do material reciclável. O catador conta que começa sua jornada diária no Cambuí às 4h. De lá, ele percorre todas as ruas e avenidas da região central com seu carrinho e vai coletando papelões, plásticos e qualquer material que possa render alguns trocados, com exceção de fios. “Pegar os fios poderiam me dar uma renda maior, mas eu já sei que se for parado vai dar problema, então evito”, conta Jorge. O trabalho rende ao catador uma média de R$ 50 por dia. O quilo do cobre chega a ser comercializado a R$ 40 em alguns ferros velhos, quase o total da renda diária do trabalhador.

A diferença de preços dos materiais é elevada. Enquanto o cobre chega a custar R$ 40, papelão e plástico (reciclados em maior volume) rendem R$ 0,15 centavos e R$ 0,40, respectivamente.

POSICIONAMENTO

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, o intuito da lei é combater o furto de fios de procedência ilícita. “Por ter um alto valor agregado, é muito difícil encontrar este tipo de material no lixo”, diz em nota.

A pasta alega ainda que a regulamentação da lei se deu, pois, a cidade tem registrado aumento de furto desse material e, o que se pretende ao multar e apreender esses produtos, é reduzir este tipo de crime.

A Segurança diz que vai aumentar a frequência da fiscalização em conluio com a Secretaria de Serviços Públicos. Enquanto a primeira vai aplicar multa que pode chegar a R$ 4,4 mil e realizar as apreensões, a segunda vai cassar o alvará de funcionamento de estabelecimentos que estiverem comprando os materiais. Oficialmente, só será legal vender fios na cidade em lojas de equipamentos elétricos e com nota fiscal. A regra se aplica a materiais provenientes inclusive em reformas residenciais.

LEGISLAÇÃO

O decreto de regulamentação leva a assinatura dos secretários Peter Panutto (Justiça), Carolina Baracat Lazinho (Planejamento e Urbanismo) e Christiano Biggi Dias (Segurança Pública), além do prefeito, que é autor da Lei.

"Decidimos regulamentar a Lei porque a cidade tem registrado aumento de furto desse material e ao multar e apreender esse material reduzimos esse tipo de crime", afirma Dário.

O alto número de registros de pequenos furtos na área do Centro e suas adjacências é motivo para que se feche o cerco contra o comércio de fios. No dia 23 de abril, bandidos furtaram 75 metros de fio do Túnel Joá Penteado. A Polícia Militar prendeu o receptador do material, que é proprietário de uma pensão localizada no Centro.

Conforme define a Lei, o valor da multa é de 1 mil Unidades Fiscais de Campinas (UFIC’s), sendo reajustado na medida em que há mudança da unidade fiscal. Conforme artigo 4º da Lei, os valores arrecadados com as multas aplicadas serão recolhidos diretamente na conta do Fundo Municipal de Incentivo à Segurança Pública.

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