MOMENTO DE COMOÇÃO

Com 300 anos, jequitibá-rosa desaba e comove a população

Jornal detalha história e queda da árvore em 1999 que era patrimônio da cidade

Gilson Rei/ Pesquisa e arquivo: William Ferreira
04/05/2022 às 09:23.
Atualizado em 05/05/2022 às 08:14
Considerado símbolo natural de Campinas, o jequitibá-rosa foi plantado antes mesmo do surgimento da cidade, foi preservado na construção do Paço Municipal e estava com 60 metros de altura quando desabou (Cedoc)

Considerado símbolo natural de Campinas, o jequitibá-rosa foi plantado antes mesmo do surgimento da cidade, foi preservado na construção do Paço Municipal e estava com 60 metros de altura quando desabou (Cedoc)

Registrar momentos de comoção e fatos que marcaram a população de Campinas sempre foi uma das missões do Correio Popular ao longo de quase 95 anos de existência. O jornal relatou com detalhes, por exemplo, um acontecimento que provocou grande impacto na cidade: a morte do jequitibá-rosa em frente ao Paço Municipal, árvore que tinha mais de 300 anos e era patrimônio cultural e histórico, considerado indivíduo vegetal de preservação permanente na cidade.

O maior e mais velho jequitibá-rosa, que ficava em frente ao Paço Municipal, caiu no sossego na manhã de um sábado, dia 16 de janeiro de 1999, devido à infiltração e apodrecimento das raízes, dentre outros fatores. A árvore foi plantada antes mesmo do surgimento de Campinas e estava com 60 metros de altura. Era um símbolo natural da cidade e foi até personagem de livro do jornalista José Hamilton Ribeiro. A morte da árvore deixou muita gente emocionada e indignada com a falta de cuidado.

A população leu na edição de domingo do Correio Popular, em 17 de janeiro, uma bela reportagem do premiado repórter José Pedro Martins. No abre da matéria, o jornalista descreveu: "Campinas amargou ontem de manhã a perda de seu maior símbolo natural. O gigantesco jequitibá-rosa que distribuía suas sombras generosas no paço Municipal desabou às 7h30, em um triste sinal da destruição ambiental na cidade. A queda da árvore de 60 metros e com séculos de idade produziu um pequeno tremor de terra e um estrondo ouvido em toda a região central, mas não deixou vítimas e nem afetou a estrutura do Palácio dos Jequitibás".

O texto informou que a direção em que a árvore caiu, no sentido da faixa central do jardim da Prefeitura, evitou uma catástrofe. "O resultado seria trágico se o jequitibá caísse em direção ao prédio da Prefeitura, sobretudo se fosse um dia útil", mostra um dos trechos da matéria publicada. 

Especialistas, botânicos e pesquisadores das universidades da cidade realizaram uma primeira vistoria logo pela manhã. Dionete Santin, agrônoma e pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), confirmou que a árvore tinha sintomas de apodrecimento no pivô central, principal ponto de sustentação do sistema radicular do jequitibá. Isto indicou que o apodrecimento foi resultado de um processo de deterioração de muitos anos. "Uma das causas deve ter sido a abertura de um pequeno buraco no tronco da árvore, que facilitou a ocorrência de infiltrações de água das chuvas e ataques de microorganismos", relatou Dionete no texto.

Patrimônio histórico

O jequitibá-rosa, denominado "Seu Rosa", era um sobrevivente da enorme floresta nativa que cobria a região, de onde veio o nome original da cidade: Campinas do Mato Grosso. Com o passar dos anos, a árvore foi incorporada à área da Santa Casa de Misericórdia. Na década de 60, essa área foi desmembrada para sediar o novo Paço Municipal, iniciativa do prefeito Ruy Novaes. O jequitibá foi uma das poucas árvores preservadas para a construção do prédio, que acabou sendo batizado com seu nome: Palácio dos Jequitibás. A árvore foi também declarada patrimônio cultural e histórico e considerada indivíduo vegetal de preservação permanente na cidade. 

Segundo botânicos da Escola de Engenharia Florestal da Universidade do Estado de São Paulo (USP), a semente que originou o jequitibá-rosa do Paço, o Seu Rosa, teria aproximadamente 1.200 anos e foi retirada em forma de ramo no interior da região Sudeste no tempo do Império português, no pé de uma colina de pequena inclinação. O Seu Rosa era nessa época apenas um ramo verde, que estava dois palmos acima do chão e com meia dúzia de pequenas folhas. 

Violinos

Dois violinos foram fabricados com a madeira do Seu Rosa. Um dos exemplares partiu da ideia do motorista, violinista e artesão José Carlos Garcia, paranaense que havia se mudado para Campinas em 1999, ano da morte do jequitibá.

Garcia disse na coluna "Baú de Histórias" do Correio Popular, em 4 de junho de 2000, que ficou emocionado com a comoção provocada na população de Campinas naquela ocasião e resolveu pegar um pedaço de madeira do jequitibá para fazer um violino. A proposta era de deixar o violino exposto no Centro de Convivência, como símbolo e memória do gigante Seu Rosa. Porém, a Prefeitura não acolheu a ideia e Garcia vendeu-o a um bar e restaurante da cidade. O violino tem como curiosidade a mais o fato de ter oito cordas, em vez das quatro cordas que normalmente o instrumento tem.

Uma obra artística semelhante, também um violino, foi desenvolvida com a madeira do Seu Rosa pelo luthier (artesão especializado em instrumentos de corda) Cláudio Bensal, que doou a peça ao Museu de Arte Contemporânea de Campinas (Macc).

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