PROJETOS

CNPEM assina acordo com a China na área de alta tecnologia

Cooperação científica inclui a troca de conhecimento em fontes de luz síncroton

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
31/05/2023 às 09:15.
Atualizado em 31/05/2023 às 09:15
Diretor-geral do CNPEM, Antonio José Roque da Silva, assinou o acordo com vice-diretor do Escritório de Assuntos Americanos e Oceânicos da academia chinesa, Yiqi Jiang (Rodrigo Zanotto)

Diretor-geral do CNPEM, Antonio José Roque da Silva, assinou o acordo com vice-diretor do Escritório de Assuntos Americanos e Oceânicos da academia chinesa, Yiqi Jiang (Rodrigo Zanotto)

A nova relação entre Brasil e China começa por Campinas. O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) instalado na cidade e o Instituto de Física de Alta Energia (IHEPS, na sigla em inglês), organização da Academia de Ciências da China, assinaram na terça-feira (30) de manhã o primeiro acordo resultado de memorando de entendimentos assinado, em abril passado, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante viagem aquele país. A organização privada sem fins lucrativos, sob a supervisão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), colaborará com a instalação de um laboratório de luz síncrotron do IHEPS, abrindo a possibilidade de negócios para empresas brasileiras, inclusive instaladas na região de Campinas, e geração de novos empregos.

O CNPEM opera quatro laboratórios nacionais e é o berço do projeto mais complexo da ciência brasileira, o Sirius, uma das fontes de luz síncrotron mais avançadas do mundo. Muitos dos equipamentos utilizados são considerados referência e usam tecnologia desenvolvida pelo CNPEM e repassada, através de parcerias, para empresas, que passaram a se tornar fornecedoras Entre elas, o de ultra-alto vácuo, fabricado por uma empresa nascida a partir de uma startup e ainda sediada na região de Campinas. 

São usados materiais raros para a construção do equipamento e do esquentamento do sistema para remover a água e restos de gases que se depositam nas superfícies da câmara, o que é importante para um ambiente totalmente livre de qualquer impureza e evitar o desvio da luz usada na pesquisa. Outra tecnologia desenvolvida pelo CNPEM são os ímãs com altos requisitos de estabilidade

“O Sirius é um equipamento extremamente sofisticado que demanda uma série de especialidades de engenharia, que vão do ultra-alto vácuo a mecânica de precisão, eletrônica sofisticada, passando pela construção desses ímãs”, explicou o diretor-geral do CNPEM, Antonio José Roque da Silva, que assinou o acordo com vice-diretor do Escritório de Assuntos Americanos e Oceânicos da academia chinesa, Yiqi Jiang. “Todos esses desenvolvimentos envolveram dezenas de empresas brasileiras, desde grandes até pequenas. [...]Um projeto como esse impacta durante sua construção as empresas de alta tecnologia, que tem, inclusive, capacidade para exportar. Um parceria como essa, por exemplo, com a China pode envolver a exportação de produtos brasileiros”, acrescentou.

SOLUÇÕES

O Sirius teve como um dos seus objetivos estimular o desenvolvimento da indústria brasileira, por meio da indução de demandas de serviços, matérias-primas e equipamentos. Graças ao envolvimento das empresas brasileiras, 85% dos recursos do projeto foram investidos no Brasil.

Em contrapartida, os pesquisadores do Centro passarão a desenvolver trabalhos conjuntos com pesquisadores do país que hoje mais investe em tecnologia no mundo, beneficiando-se dessa captação de conhecimento científico. Em 2022, a China investiu US$ 448,2 bilhões (R$ 2,28 trilhões) em pesquisa e desenvolvimento (P&D), o equivalente a 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. O montante é 25,3 vezes maior do que os R$ R$ 89,5 bilhões destinados pelo Brasil em 2019, último dado disponível.

“Queremos unir esforços para encorajar a comunidade científica a trabalhar em colaboração, usufruindo das técnicas de luz síncrotron não só para publicar artigos, mas para abordar projetos de longo prazo em busca de soluções para grandes problemas mundiais”, afirmou Yiqi Jiang. O chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Carlos Matsumoto, que esteve em Campinas, disse que o acordo assinado entre o CNPEM e o IHEPS é o primeiro de outros que serão firmados, que começaram a ser discutidos na terça-feira (30) com os representantes da Academia de Ciências da China.

Na época da visita de Lula, o governo brasileiro estimou que as parcerias com os chineses poderiam atingir R$ 50 bilhões. A parceria Brasil-China em ciência e tecnologia envolve também satélites, biotecnologia, nanotecnologia e outras áreas. O laboratório de luz síncrotron que está sendo construído pelo chineses é de quarta geração, assim como o Sirius.

Ele utilizará energia mais alta, permitindo projetos complementares ao instituto brasileiro. “Esses equipamentos sofisticados são importantes para resolver problemas do mundo hoje. Energias renováveis, problemas de saúde. É central que essas instituições se juntem porque a solução desses problemas é uma busca mundial”, disse Roque da Silva.

Esses projetos podem desenvolver soluções que depois serão repassados para a indústria para chegar a sociedade como um todo, como novos fármacos para produção de medicamentos. O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que integra o CNPEM, é considerado o mais avançado do mundo em seu segmento e é um dos três de quarta geração existentes – os outros estão instalados na Europa (Suécia e França).

“Hoje, nossa parceria, consolidada pelo conhecimento e experiências compartilhados, está sendo formalizada através desse acordo assinado entre o CNPEM e o IHEP para possibilitar nossas colaborações científicas e tecnológicas e iluminar o caminho para um futuro melhor, promovendo conhecimento, descoberta e inovação para o benefício de ambas as nações”, afirmou o diretor do LNLS, Harry Westfahl Jr.

A Academia de Ciências da China tem hoje acordos com 105 institutos e quatro universidades em todo o mundo, com o número de pesquisadores envolvidos saltando de 41 mil, em 2015, para 67 mil, em 2021. Essas parcerias envolvem também empresas de alta tecnologia em diversas áreas e centros de educação e pesquisa de ponta, como o Massachusetts Institute of Technology (MIT). Apenas a academia destinou para pesquisa e desenvolvimento US$ 13 bilhões (R$ 65,78 bilhões) em 2021, o equivalente a 75,73% de tudo o que Brasil investiu nessas áreas em 2019.

RECURSOS

Além do LNLS, o CNPEM conta com mais três laboratórios nacionais, o de Nanotecnologia (LNNano), Biorrenováveis (LNBR) e o de Biociências (LNBio), que desenvolvem pesquisas em diversas áreas, incluindo saúde, novos materiais, energia e outras. O Centro reúne equipes multitemáticas altamente especializadas, infraestruturas laboratoriais globalmente competitivas e abertas à comunidade científica, linhas estratégicas de investigação, projetos inovadores em parceria com o setor produtivo e formação de pesquisadores e estudantes.

O Sirius começou a operar em 2020, quando a primeira linha de luz síncrotron, como são chamadas as estações de pesquisa, foi aberta prioritariamente para pesquisas relacionadas a aprofundar os conhecimentos sobre o vírus Sars-CoV-2 e contribuir com o combate à pandemia de covid-19. Atualmente, seis linhas estão em operação, e outras quatro estão começando a operar no modo de comissionamento científico, quando são realizados experimentos que ajudam a avaliar os parâmetros das estações de pesquisa.

O diretor-geral do CNPEM divulgou que aguarda para a próxima semana a liberação de novos recursos do governo federal para o andamento dos projetos, sem divulgar o valor. O Centro também negocia outras verbas para concluir a chamada primeira fase do LNLS, com a instalação de mais quatro linhas de luz síncrotron, totalizando 14, e melhorias dos aceleradores. Ao visitar o Sirius no final de março, a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana dos Santos, disse que a liberação de R$ 450 milhões poderia ser negociada imediatamente e outros R$ 270 milhões dependeriam da aprovação da projeto de lei complementar do Congresso Nacional (PLN) que prevê o descontingenciamento de um montante de R$ 9,6 bilhões para recompor o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

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