Projeto moderniza sistema de produção e garante autossuficiência para comunidades rurais do Vale do Ribeira
Para os quilombolas, o programa da Coordenadoria garante vida digna ao homem do campo e ainda a preservação de valores afrodescendentes (Divulgação)
A Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) investe cerca de R$ 10 milhões no aprimoramento da produção agrícola em 32 quilombos, comunidades rurais habitadas por descendentes de escravos. Os núcleos — localizados basicamente no Vale do Ribeira — recebem os recursos disponibilizados pelo Banco Mundial e os investem prioritariamente na compra de equipamentos essenciais para colheita, processamento e transporte de mercadorias. Os representantes das comunidades quilombolas estiveram em Campinas no mês passado e prestaram contas sobre os projetos implementados. Grande parte das comunidades integram o programa desde a década passada, quando o aporte de recursos estrangeiros — negociado pelo governo paulista — financiou o Programa das Microbacias, que incrementou a produtividade do campo. Acontece que, no caso dos quilombos, a verba não se limita à roça. O projeto financia a preservação do próprio patrimônio cultural das antigas aldeias. Além do dinheiro para comprar um trator ou uma roçadeira, o núcleo agora tem recursos para adquirir instrumentos musicais, organizar festas, instalar centros culturais, construir escolas.“O programa tem como objetivo principal garantir a qualidade de vida nos quilombos. Não queremos que os jovens sejam obrigados a deixar o núcleo e procurar trabalho na cidade. O cidadão pode muito bem trabalhar e sobreviver dignamente na comunidade onde nasceu”, explica o engenheiro-agrônomo Antônio Eduardo Sodrzeieski, diretor-técnico do Escritório de Desenvolvimento Regional da Cati em Registro. E, se originalmente os quilombos se mantinham apartados da sociedade, hoje a situação é bem diferente. O projeto busca a “inclusão” das comunidades rurais no mercado. A produção rural, agora, abastece as redes atacadistas. E os núcleos se tornam pontos turísticos, que recebem visitantes o tempo todo. “O quilombo gera a renda para a sua própria sobrevivência”, explica o engenheiro. E que ninguém esnobe a capacidade produtiva das comunidades rurais. O programa da Cati, por exemplo, já financiou o plantio de 260 mil mudas de pupunha na roça, o que colaborou para fazer do Vale do Ribeira um dos líderes nacionais na produção do palmito. “Conseguimos modernizar o campo, impulsionar a economia do Vale do Ribeira”, diz. Antes, o cacho nas costas Para os quilombolas presentes à Cati, o programa da Coordenadoria hoje garante vida digna ao homem do campo, ao mesmo tempo em que permite, a todas as famílias, a preservação de valores afro e o culto aos ancestrais. “Ganhamos um trator com carreta. Antes, o lavrador descia o morro com o cacho de banana nas costas. Agora não. O trator chega ao topo, volta carregado. As lâminas cortam o mato, abrem o carreador”, comemora o professor Noel Castelo da Costa, de 49 anos, presidente de uma associação que reúne descendentes do Quilombo do Abobral, localizado às margens do Rio Ribeira do Iguape. Noel se entusiasma e fala de outras mudanças. “Antes, se gastava a noite toda para debulhar uma saca de milho. Hoje, a debulhadeira arranca a palha em minutos. O povo tem mais tempo pra estudar, pra viver com a família, pra se divertir.” Atração turística Benedito Alves da Silva, de 63 anos, conhecido como “Ditão” nasceu e cresceu no Quilombo Iporunduva, ali pertinho da Caverna do Diabo, conhecido ponto turístico do Vale do Ribeira. Ele conta que a comunidade existe desde o século 17. Mais de 500 pessoas moram por ali. Ele conta, orgulhoso, que os recursos do programa transformaram a aldeia. As famílias sobrevivem da produção de arroz, milho, mandioca, legumes, verduras, frutas… Com o dinheiro, os lavradores compraram um caminhão e ergueram um barracão para a estocagem agrícola. E as verbas também financiam as atividades de um centro cultural que apresenta aos turistas atrações históricas do lugar, como uma igreja erguida em taipa de pilão, em louvor a Nossa Senhora do Rosário. “O turismo mudou o nível de vida do lugar. Chegam excursões de todo lado. Principalmente de escolas. É bonito ver como as pessoas se interessam pela nossa história”, afirma.