Falhas, principalmente na gestão de Dr. Hélio, travam avanço e podem levar a prejuízo de R$ 260
João Ferreira molha a rua onde fica sua casa, no Jardim Marisa, para reduzir a poeira e ajudar sua mãe, que tem problemas respiratórios (Érica Dezonne/AAN)
Erros básicos de cálculos e medições, irregularidades em procedimentos, incompetência e a eterna burocracia que se arrasta pelos corredores da Prefeitura podem fazer com que Campinas perca um total de R$ 260 milhões em verbas federais e contrapartidas do próprio Município que poderiam beneficiar a população em diversas regiões da cidade.Atualmente, 53 projetos ou obras fazem parte da pauta da Administração, mas 33 deles — 62% — estão suspensos ou paralisados pelos problemas já citados. Enquanto isso, os prazos correm. Apenas em licitações revogadas e contratos rescindidos, por exemplo, a cidade tem R$ 111,5 milhões “engessados”, aguardando definições legais para serem aplicados. Outros R$ 138 milhões são referentes a projetos que ainda precisam de passos simples, como um relatório de sondagem do solo, sinalização de trânsito, equipamentos de menor porte ou assinaturas.Outro caso que chama a atenção diz respeito a oito naves-mães — orçadas em R$ 16 milhões no total — que já deveriam ter sido entregues. Isso não foi possível porque, depois dos projetos terem ficado prontos, percebeu-se que os prédios eram maiores que os terrenos que os abrigariam. Um erro que nem um estudante de engenharia do primeiro ano cometeria. Esse cenário de muitas propostas “cenográficas”, mas sem um resultado prático, está ligado principalmente à “herança” deixada pelo prefeito cassado Hélio de Oliveira Santos (PDT) e sua equipe de governo.A reportagem do Correio percorreu diversos locais onde deveriam existir melhorias que ainda não saíram do papel. No bairro São Bernardo, um amontoado de blocos, madeira e ferro espera se transformar em um Centro de Saúde desde o primeiro mandato do Dr. Hélio. Um investimento de R$ 1,5 milhão coberto pelo mato. Mas a placa de propaganda continua lá, com um slogan que deixou suas marcas: “Primeiro os que mais precisam” .Os vizinhos do local se mobilizam como podem. “Já cansei de pedir no serviço 156 da Prefeitura para que essa obra seja feita. Já que eles não têm condições de completar o que foi começado, será que dá para pelo menos demolir o que ficou aqui? Esse lugar virou ponto para consumo de drogas e esconderijo de bandidos”, reclama uma vizinha que prefere não se identificar.No Jardim Marisa, na região do Campo Belo, o aposentado João Ferreira espera há anos pelo asfalto no seu bairro. A velha história se repete: nos dias de sol, poeira; quando chove, lama. Morando com a mãe de 83 anos que tem problemas respiratórios e vive em hospitais para controlar suas crises, ele não encontrou outra alternativa a não ser molhar o trecho da rua em frente à sua casa diariamente. “Assim, a poeira baixa e minha mãe melhora. Espero o asfalto, mas até agora nada”, diz.A rua já conta com guias e a poucos metros dali há uma creche. As crianças também sofrem. A auxiliar de atendimento Janaína Araújo passa por situações complicadas com a filha Maria Eduarda, de 2 anos. “Ela vive no Posto de Saúde com problemas respiratórios”, conta. O Jardim Marisa é um exemplo claro do que ocorre em Campinas. Existe uma verba federal prevista para o asfaltamento do bairro de R$ 11,2 milhões, sendo R$ 936 mil referentes à contrapartida da Administração Municipal. O dinheiro federal está ligado ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Pavimentação. Mas mesmo assim, segundo documentos da Prefeitura, ainda há a necessidade do desenvolvimento de um projeto para realizar tal melhoria.No Parque Oziel, o Centro de Saúde existente afronta qualquer noção de dignidade ou bom-senso. O lugar é apertado e sem estrutura para quem trabalha ou é atendido ali. Por isso, há o projeto de construção de um novo local. O valor total do contrato é de R$ 1,6 milhão. Um problema entre o poder público e a empresa contratada fez com que o trabalho parasse. Um documento fornecido pela Prefeitura mostra que apenas 1,83% das obras foi realizado. Porém, o que a reportagem viu no local foi apenas mato e barro. “Um posto novo seria muito bom pra gente. O que tem aqui é apertado, tem muita espera, fila. Mas, pelo jeito, vamos ter que continuar assim”, comenta a dona de casa Ângela Brandão, com a filha Maysa, de 9 meses, nos braços.No Jardim Santa Eudóxia, o Pronto Atendimento Sul-Leste é outro projeto que não vira realidade. Com o contrato fixado em R$ 6,6 milhões, a estrutura está apenas 62,96% acabada — percentual que já foi pago pelo serviço — e a obra está paralisada. Os R$ 2,4 milhões restantes dessa conta ainda não saíram dos cofres públicos e estão sem um fim certo. CearNa pasta de Esportes e Lazer, o ginásio poliesportivo do Centro Esportivo de Alto Rendimento (Cear), orçado em R$ 17 milhões, se resume a tapumes caindo aos pedaços. O lugar já era para estar pronto, mas não saiu do papel. A direção da própria Confederação Brasileira de Basquete (CBB) procurou recentemente a Secretaria de Esportes e Lazer para reservar o ginásio para os treinos da seleção masculina e foi surpreendida com a notícia de que o espaço para treinamento e jogos ainda não existia. O que poderia ser uma cesta de três pontos de Campinas acabou sendo, mais uma vez, um gol contra.