Cidade dispensa 600t de frutas, hortaliças e ovos, porém, programa da Ceasa usa parte para consumo humano por meio da alimentação sustentável
Distribuição de alimentos do programa da Ceasa na entidade Lar Promoção do Jovem, na Rua Padre Francisco Abreu Sampaio, no Parque Itália, em Campinas: fila para compor a cesta básica das famílias (Dominique Torquato/AAN)
Campinas perde cerca de 600 toneladas por mês de produtos hortifrutigranjeiros. Os números são das Centrais de Abastecimento de Campinas S/A (Ceasa). No entanto, deste volume, 41,5% são aproveitados pelo Instituto de Solidariedade para Programas de Alimentação (ISA), que direciona esse volume para programa de alimentação sustentável (consumo humano). Outros 16,6% são doados para consumo de animais. O restante, 41,9% são literalmente desperdiçados e vão parar no aterro sanitário. Entenda-se por perda, produtos (frutas, hortaliças e ovos) que sofrem pequenas avarias, como por exemplo um amassadinho, e leva à completa inviabilidade de valor de mercado — não podendo ser comercializado. Já o desperdício se refere ao ato de jogar fora alimentos que podem ser consumidos, por exemplo uma casca de banana que tem valor nutricional e pode ser usada na preparação de várias receitas. No Brasil, segundo o professor Walter Belik, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), estima-se um desperdício de 44,6 milhões de toneladas por ano. Estudo feito pelo Mudanças Climáticas do World Resources Institute (WRI) Brasil, uma instituição de pesquisa internacional, cita que o País está entre os dez países que mais perdem e desperdiçam alimentos no mundo. “Não há uma estatística sobre a perda e desperdício de alimentos no mundo, pois a metodologia aplicada é muito complexa e difícil de se fazer em razão das culturas. Mas estima-se uma perda mundial de 30% sobre o que é produzido”, disse Belik. Só de grãos a produção brasileira é de 250 milhões de toneladas/ano. No estado de São Paulo, segundo o técnico-operacional da Ceasa/Campinas, Claudinei Barbosa, as perdas chegam a 280 mil toneladas ao mês. A Ceasa/Campinas é abastecida por 715 municípios brasileiros, mas há certos períodos do ano que chega a 914. Em média, a central campineira recebe cerca de 700 mil toneladas/ano de produtos hortigranjeiros. A Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), na Capital, recebe um volume cinco vezes maior que Campinas e atende todo o Brasil e mais cerca de 15 países. Para Belik e Barbosa, a perda e desperdício de alimentos tem diversas implicações. No caso da perda, duas delas são a falta de estrutura no meio transporte, com ausência de uma cadeia de frios, e a outra um sistema inteligente de classificação, ou seja de negociação. Razões das perdas Para eles, no primeiro caso perde-se muitos alimentos com o sistema arcaico de transporte. Frutas ou legumes, por exemplo, que saem do Norte do País, são transportadas em caminhões a céu aberto, sem nenhum tipo de segurança ou embalagem. “Eles sofrem as oscilações de temperaturas, os impactos de buracos nas estradas e tantos outros que quando chegam ao destino, tem produto que está avariado”, disse Belik. No sistema de classificação, segundo o economista, a negociação entre produtor e entreposto deveria ser acertada antes de ser transportada. “Um agricultor manda o produto dele para uma Ceasa, por exemplo, e ele não sabe como estará o clima no local, a demanda entre outros. Muitas das vezes, quando o caminhoneiro chega com o produto precisa ficar horas esperando e com isso, só vai prejudicando ainda mais o que foi transportado”, explicou Belik. Já em relação ao desperdício, a falta de educação somada a ausência de informação por parte do consumidor na maioria das vezes explica o fenômeno, segundo os especialistas — o consumidor não sabe quanto comprar, como conservar o alimento e também aproveitar certos produtos. Voluntário e involuntário “A perda é diferente do desperdício. A perda é involuntária. Ninguém perde de propósito. Já o desperdício é voluntário. As pessoas compram exageradamente e muitas não sabem que há produtos que podem ser aproveitados em seu todo”, frisou Belik. Segundo Barbosa, no desperdício a falta de conscientização ambiental e cultural é o que mais pesa. Apesar do volume que vai para o lixo ter sido reduzido para 50%, ele poderia ser ainda menor. Acredita-se que se houvesse uma melhor triagem, higienização e destilação, 80% dos produtos descartados poderiam ser usados. “A casca da banana por exemplo, tem muito valor proteico. Ela pode ser usada para fazer uma receita de bolo, de risole. A casca do ovo pode ser transformada em farinha. É inadmissível convivermos com esse paradoxo fome versus desperdício”, disse.