VIRALIZOU NAS REDES

Campinas é referência no assunto polêmico do momento, os bebês reborn

Empresa da cidade que fabrica e comercializa o produto está há 18 anos no mercado e recebe turistas de outros estados para conferir as bonecas hiper-realistas

Bruno Luporini/[email protected]
20/05/2025 às 13:48.
Atualizado em 20/05/2025 às 14:30
Tema virou febre nas redes sociais nas ultimas semanas, principalmente por meio de vídeos nos quais adultos interagem com os brinquedos como se fossem bebês de verdade, dando de mamar, trocando roupas e levando para passear, por exemplo; cerca de 90% do público da loja que existe há quase duas décadas em Campinas é composto por crianças, e a maioria dos clientes adultos trata os bebês reborn apenas como um hobby (Rodrigo Zanotto)

Tema virou febre nas redes sociais nas ultimas semanas, principalmente por meio de vídeos nos quais adultos interagem com os brinquedos como se fossem bebês de verdade, dando de mamar, trocando roupas e levando para passear, por exemplo; cerca de 90% do público da loja que existe há quase duas décadas em Campinas é composto por crianças, e a maioria dos clientes adultos trata os bebês reborn apenas como um hobby (Rodrigo Zanotto)

Campinas é referência nacional no assunto do momento nas redes sociais, os bebês reborn, bonecas hiper-realistas de recém-nascidos. Uma loja da cidade é destaque na fabricação e comercialização do produto e está há dezoito anos no mercado. Uma das sócias do negócio, Daniela Baccan contou que a procura aumentou desde que o tema viralizou, chegando à capacidade máxima de fabricação, atualmente em cem bonecas por mês. Confeccionados à mão, os bebês reborn custam de R$ 750 a R$ 9,5 mil. “Quanto mais realista, mais caro.”

O assunto se alastrou há cerca de três semanas, principalmente por meio de vídeos postados no TikTok e no Instagram. Neles, adultos interagem com os brinquedos como se fossem bebês de verdade, realizando atividades como dar mamadeira, trocar as roupas e levar para passear. Daniela afirmou que 90% do público da loja é composto por crianças e que a maioria dos clientes adultos trata os bebês reborn como um hobby, sem viver em função das bonecas como se fossem ser humano.

Ela citou uma cliente de 82 anos, que costuma ganhar as bonecas dos próprios filhos. As entregas são feitas com o objetivo de potencializar a experiência, uma vez que as bonecas são entregues em carrinhos, como se fossem de verdade. “Ela ficou muito depressiva após o falecimento do marido, agora com esse hobby ela está muito mais feliz.” Outro exemplo citado por Daniela é o de uma cliente que comprou um bebê reborn para levar nas sessões de quimioterapia, para tratar de um câncer. “Ela usou o bebê naquele momento como um escape, uma forma de amenizar o peso daquele momento.”

Daniela destacou que pessoas de outros estados já visitavam a loja mesmo antes de o assunto repercutir nas redes sociais. Agora, a visitação virou praticamente uma tendência. Por isso, a empresária desenvolveu um roteiro de visitas à loja, levando em consideração viajantes que desembarcam em Guarulhos, Congonhas e Viracopos. “O roteiro conta com opções de hospedagem em resorts, hotéis e pensões, com opções de alimentação, deslocamento e tempo de permanência na cidade. É comum recebermos famílias inteiras que vêm nos visitar.”

As bonecas mais simples são produzidas mais rapidamente, cerca de quinze por semana, porém as bonecas mais realistas demoram bem mais. “Somente para colocar o cabelo são três dias, podendo chegar a três semanas até finalizar todo o processo de fabricação”, revelou. No início, quando o negócio foi oficializado em 2007, o objetivo era produzir bonecas de forma artesanal. O processo evoluiu, e os bebês reborn foram aprimorados, assemelhando-se um pouco mais ao que é hoje. Até que em 2020, durante a pandemia, surgiu a ideia de tornar a experiência a mais realista possível. A loja se tornou a “Maternidade de Bonecas”. Os produtos saem do ateliê, localizado em Barão Geraldo, com cordão umbilical, certidão de nascimento e carteira de vacinação. “Somos os pioneiros em trazer, para além da venda de uma boneca, a experiência da maternidade para os clientes habituais e para as pessoas que vêm conhecer a loja.”

CLIENTELA

Mayara Gimenez, 31, é mãe da Manuella, 12, que desde os cinco anos se encantou pelo universo dos bebês reborn, somando nove bonecas na coleção. “Ela é apaixonada por esse mundo das reborn.” A mãe diz que a filha sabe separar o que é brincadeira e o que é mundo real. Para ela, a atividade de cuidado com as bonecas é lúdica. “Com isso, ela praticamente não usa aparelhos eletrônicos, não tem o costume de jogar virtualmente. É como na minha infância, quando brincávamos com as bonecas da época. A maior diferença é o realismo delas.”

Manuella contou que se diverte bastante com as bonecas e que é divertido quando está com as amigas, pois não há mal em emprestá-las, desde que sejam bem cuidadas. Sobre a diferença entre brincadeira e hobby, ela disse acreditar que “o bebê reborn é feito mais para as crianças mesmo, pois é muito legal de brincar, mas tem muitos adultos que também podem colecionar."

ASPECTO PSICOLÓGICO

Com a repercussão midiática sobre o assunto, muitas pessoas questionam até que ponto o hobby pode ser considerado saudável. Por isso, o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP), por meio de nota, pontuou que os profissionais de psicologia devem considerar o papel subjetivo desses objetos na construção da subjetividade nos casos em que os bebês reborn são tratados como substitutos simbólicos ou reais de afeto, pois eles podem funcionar como suporte emocional em situações de luto, trauma ou solidão. A psicologia deve observar quando essa prática representa rigidez ou sofrimento e intervir com escuta, acolhimento e ética, conforme o código da profissão. A nota ainda apontou que é preciso reconhecer o papel de gênero, uma vez que as mulheres podem ser ridicularizadas por essa prática, enquanto hobbies similares entre homens, como colecionar miniaturas ou camisas de futebol, são normalizados.

A psicóloga Amana Assumpção explicou que as bonecas desempenham um papel de transição na infância, pois ajudam a criança a lidar com a ansiedade da separação da figura materna, servindo como um consolo emocional e facilitando a transição para a independência. A boneca representa um vínculo seguro, permitindo que a criança explore suas emoções e pratique interações sociais, refletindo a necessidade de contato e afeto.

Já na vida adulta, especialmente entre mulheres, as bonecas podem continuar a exercer um papel afetivo, como no caso dos bebês reborn. Portanto, as bonecas hiper-realistas, muitas vezes encomendadas como obras de arte terapêuticas, podem servir para preencher lacunas emocionais, como o luto pela perda de um filho ou a infertilidade. Além disso, elas podem oferecer conforto em situações de solidão e ansiedade para mulheres que não têm filhos e desejam exercer o papel de mãe, ou até mesmo para mães que queiram reviver a experiência da maternidade. A psicóloga observou que na infância a boneca é um instrumento de desenvolvimento emocional, e na fase adulta ela pode se tornar um objeto de apego simbólico, “revelando como as necessidades de afeto e conexão persistem ao longo da vida.”

ÁREA DA SAÚDE

Além das vendas ao público em geral, uma das fontes de renda do negócio é a área hospitalar. Daniela explicou que esse é um mercado recente, que começou a se desenvolver há cerca de três anos. As bonecas são encomendadas por maternidades que utilizam os objetos nos cursos de amamentação e de parto, incluindo na preparação para os casos prematuros. “São médicos, doulas e fisioterapeutas os que mais utilizam as bonecas em seus cursos preparatórios.” 

Outra finalidade apontada por Daniela são as bonecas que representam as crianças que sofrem de epidermólise bolhosa, grupo de doenças genéticas raras que causa fragilidade da pele e mucosas, com formação de bolhas em resposta a mínimos atritos ou traumas. Ela contou que a organização não governamental (ONG) Jardim das Borboletas, voltada para a conscientização da doença, encomendou cinco bebês reborn com as características da epidermólise bolhosa. “Eles são utilizados para mostrar para as mães as melhores formas de cuidar e tratar das feridas nos bebês, simulando como devem ser feitos os curativos, o banho e outras atividades do cotidiano.”

LEGISLAÇÃO

O assunto rendeu tanto nas últimas semanas que até chegou à política. Tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, um projeto de lei protocolado por Zacharias Calil (União), que dispõe sobre a aplicação de multas a quem utilizar um bebê reborn ou artifício similar para obter benefícios destinados a crianças de colo, como atendimento preferencial em unidades de saúde, prioridade em filas, uso de assentos preferenciais ou obtenção de descontos e gratuidades para responsáveis por bebês de colo.

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