Justino Alfredo lutou pela Saúde e pela Ponte Preta
O Segundo Batalhão da 5.ª Companhia do 6.° Regimento de Infantaria do Exército Brasileiro, com Justino Alfredo (Associação dos Expedicionários Campineiros)
Sob a intensa neve do rigoroso inverno europeu, 25.834 pracinhas brasileiros desembarcaram em etapas, no porto de Nápoles, Itália, em 1944, destinados a reforçar pelotões norte-americanos na luta para desentocar os nazistas alemães das diversas elevações estratégicas dos Apeninos, na Segunda Guerra Mundial.
Entre esses heróis, estava o campineiro Justino Alfredo, aos 21 anos, que lutou bravamente nos memoráveis combates de Monte Carmelo e Monte Castelo, mas que ontem tombou, aos 101 anos, travando sua última batalha, tendo enfrentado, como inimigo implacável, uma complicação renal.
Justino Alfredo foi o último dos 328 soldados campineiros integrantes da Força Expedicionária Brasileira (FEB) a tombar fora dos campos da Segunda Guerra. Apesar do intenso fogo inimigo, e do poderio que ainda detinham os nazistas, já no final da guerra, todos saíram ilesos e cumpriram jornada de vida em Campinas e outras localidades.
Com honras militares, Justino Alfredo será sepultado às 9h30 de hoje, no Cemitério Flamboyant, Ele deixa a esposa Olete Alfredo, de 97 anos, e os filhos Guacyro Justino Alfredo, Guaracy, Jane, e Elisabeth.
Nessa trajetória longeva, legou à cidade um histórico marcante, com atuações nos campos da Saúde e dos esportes.
Especializado na área da Enfermagem, foi servidor público municipal, atendendo no antigo posto da rua José Paulino, ao lado dos Bombeiros - a chamada “Assistência Médica”, embrião do Hospital “Mário Gatti”.
Segundo o filho Guacyro Justino Alfredo, 67, médico ginecologista e obstetra, após a guerra, seu pai dedicou-se à profissão, dando suporte e ajudando na construção e consolidação do “Mário Gatti”.
“Ele amou Campinas e a ela se dedicou como poucos”, conta o médico. “Tinha consciência de que a cidade demandava um hospital municipal e, com outras pessoas, lutou muito para que o atendimento ambulatorial prestado à época evoluísse para a referência que é hoje o Hospital Mário Gatti”.
Torcedor apaixonado da Associação Atlética Ponte Preta, entrou de corpo e alma na campanha pela construção do estádio “Majestoso”, colocando-se a serviço de Moisés Lucarelli, seu idealizador. “Dedicava-se a auxiliar nas obras e passava muitas noites em claro, guardando os materiais para que não roubassem”, conta o filho.
Guacyro diz que seu pai “sempre foi um guerreiro”, e que começou a trabalhar muito cedo, aos 12 anos de idade. Aos 21, alistou-se no Exército e seguiu para o Rio de Janeiro, tendo antes passado por intenso treinamento em Caçapava, no estado de São Paulo.
Com a mudança de posição do governo Getúlio Vargas, em favor dos aliados. em janeiro de 1942, o Exército Brasileiro principiou a formação de uma Força Expedicionária, que teve, como emblema, uma cobra fumando, porque a ironia, à época, pregava que seria mais fácil a cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra.
Uma das histórias que costumava contar era sobre o dia da partida para a Itália, Era o começo de junho de 44, e todos dormiam pesado nos alojamentos da Vila Militar, no Rio de Janeiro. Psssava das duas horas da manhã quando o corneteiro-mor soou o toque da Alvorada, despertando cinco mil soldados que imaginavam ser uma emergência. “Meu pai pensou que fosse apenas um treinamento de rotina”, lembra-se Guacyro.
Ao contrário, os pracinhas foram amontoados em caminhões e levados à zona portuária, onde ficaram assombrados com as dimensões do navio de transporte estadunidense “USS General W.A. Mann”, cercado de destróieres que cumpririam a escolta do contingente da FEB até o estreito de Gilbraltar - possessão inglesa ao Sul da Espanha.
“Meu pai relatava que todos a bordo pensavam em uma transferência para algum porto próximo. Ele somente compreendeu a realidade quando viu que o Cristo Redentor ficava cada vez mais distante, e que se encontravam em alto mar”.
Os pracinhas chegaram a Nápoles trajando uniformes de tecido fino, e tiveram de trocá-los, pois a temperatura batia os -20 graus.
Em sua passagem por Lucca, Justino sensibilizou-se com a fome, e alimentou um menino de três anos, chamado Gian Luigi, com ele dividindo sua ração diária.
Na simbólica batalha de Monte Castelo, Justino ajudou a salvar muitos brasileiros feridos, teve problemas de circulação sanguínea nas pernas, e se curou sob o sol do Senegal.
UM MUSEU DE EXPEDICIONÁRIOS
Campinas homenageou seus heróis com a fundação em outubro de 1945 da Associação dos Expedicionários Campineiros, instalada em prédio da rua Falcão Filho, 96, nos fundos do Mercado Municipal, como forma de manter viva a memória de seus heróis.
Na associação, estão armazenados objetos da guerra, uniformes dos ex-pracinhas e farto material fotográfico. De acordo com César Azambuja, vice-presidente da entidade, o prédio passa por reformas, e o museu será reinaugurado.