O vereador Nelson Hossri: “A educação está sofrendo demais com a falta de ordem dentro das escolas” (Camara Municipal de Campinas)
Uma proposta de autoria do vereador Nelson Hossri (PSD) para uma segunda tentativa de implantação de uma escola cívico-militar em Campinas voltará à pauta de discussões e votação da Câmara Municipal na sessão desta quarta-feira (8). Se aprovada, uma frente parlamentar composta por parlamentares de diversos partidos será formada para debater o assunto. Em 2019, primeiro ano de governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, que defendia esse modelo pedagógico de ensino, a proposta de implantação de uma escola nesses moldes chegou a ser avaliada, mas a ideia não prosperou porque a Justiça mandou suspender a sua tramitação.
Parar compensar o fato de que a nova gestão federal rejeita esse modelo de ensino, o vereador diz contar com o apoio do governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ele informou que já dispõe de 16 assinaturas de homólogos na Câmara em apoio à sua propositura e diz estar otimista quanto à aprovação dela. "Após conseguir as assinaturas, a proposta entra na sessão para votação para ver se conseguimos a maioria dos votos e, assim, a aprovação", explica o vereador.
De acordo com Hossri, a escola cívico-militar apresenta um conceito de gestão nas áreas educacional, didático-pedagógica e administrativa com a participação do corpo docente da escola e apoio dos militares. O ensino é gratuito e visa a contribuir com a qualidade do ensino na educação básica. "Hoje, a educação está sofrendo demais com a falta de ordem dentro das escolas. A evasão escolar é absurda, o desrespeito com os professores por conta da falta de organização e isso acaba refletindo nas nossas crianças", pontua.
Ele também ressalta que a criminalidade é um fator que, muitas vezes, faz com que as crianças abandonem a sala de aula e que o papel da escola cívico-militar é resgatar a qualidade da educação e proporcionar um ambiente seguro. O vereador diz que a "ordem é o carro chefe", pois com professores mais motivados, as crianças terão um incentivo maior para irem estudar. Essa motivação seria advinda de uma ideia de que o docente é visto como autoridade, de acordo com o político do PSD.
Hossri afirma que uma boa instituição de ensino não abre espaço para os professores promoverem um debate político. "O professor vai continuar sendo professor, só que com uma diferença que ele não vai entrar na sala de aula para colocar o seu ponto de vista político e sim para ensinar, levar a história verdadeira", ressalta o vereador.
O papel dos militares, segundo ele, se limita à gestão da instituição de ensino. Ao ser questionado sobre o conhecimento dos militares em assuntos pedagógicos, o vereador diz que "nenhum militar da reserva que vai trabalhar nessas escolas vai trabalhar sem saber o que está fazendo".
Para Hossri, o diferencial da escola cívico-militar é a promoção de atividades culturais e esportivas, deixando um pouco de lado o estímulo ao pensamento crítico. "As críticas podem ocorrer, mas, se você está em uma escola cívico-militar onde resgata o civismo, dedicação, honestidade, podem até ocorrer críticas, mas são menos rasas".
A primeira tentativa de implantação do modelo de ensino cívico-militar em Campinas ocorreu em 2019. A instituição escolhida para acolher a proposta foi a EMEF Professora Odila Maia Rocha Brito. No entanto, a Justiça mandou suspender o processo. A então secretária de Educação, Solange Pelicer, disse que foi exigido pela Justiça uma consulta aos Conselhos das Escolas, Conselho da Escola Odila Maia Rocha Brito e Conselho Municipal de Educação. Os dois primeiros reprovaram o modelo e o último pediu três meses para avaliar a proposta.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo informou que há uma escola cívico-militar em funcionamento no município de Guarujá, na Baixada Santista, e pontua que "caso não haja continuidade (na implantação do modelo cívico-militar) em nível federal também não haverá nas escolas da rede estadual de São Paulo que venham a ter interesse na adesão".
Oposição
O vereador Cecílio Santos (PT) afirma discordar totalmente da proposta apresentada pelo seu colega Nelson Hossri. "Eu acho que isso é um retrocesso", frisa. O petista ainda defende que a relação de aluno e professor deve ser uma via de mão dupla. "Eu entendo que a educação tem que ter investimento, valorização dos professores, liberdade para que os alunos possam trazer os seus saberes", afirma.
O vereador entende que é preciso estimular o pensamento crítico dos estudantes. "Precisamos construir massa crítica para que os jovens e adolescentes possam questionar, saber e entender do que estão falando e aprofundar o conhecimento científico e ao que me parece não é a proposta da escola cívico-militar", pontua.
Dirce Zan, doutora em educação e professora do Departamento de Ciências Sociais e Educação da Unicamp, diz que a escola cívico-militar não é sinônimo de evolução. Para ela, não há nada que esse sistema agregue positivamente. "Um dos principais retrocessos das escolas cívico-militares é ter na centralidade de sua proposta pedagógica a disciplina dos corpos e um ensino que reproduz conhecimentos, limitando a possibilidade de criação e de crítica dos estudantes. É uma proposta educacional que nos remete a um ensino tradicional e uma perspectiva de aprendizagem bastante mecanizada e automatizada. Escola é espaço de construção de conhecimento em que o diálogo e a liberdade de pensamento são fundamentais", ressalta a doutora.
Ela também pontua a importância de ter o conhecimento necessário para trabalhar com pedagogia. "A instituição de ensino demanda formação específica nas áreas da educação e afins para que se possa atuar. Demanda trabalho sério e comprometido de professores e não de militares", afirma.
A professora acredita que ainda há pessoas que defendem esse sistema, porque "temos um setor da sociedade que é conservador e que almeja que seu projeto reacionário de sociedade seja assimilado pelas novas gerações sem possibilidade de questionamento. Há na sociedade atual pessoas autoritárias e muitos saudosos de um tempo em que o pensamento divergente deveria ser eliminado, juntamente com os representantes deste pensamento".
Por sua vez, Rauer Rodrigues, doutor em estudos literários, aponta que a educação precisa muito mais do que reformas e propaganda. "Precisamos de uma revolução na educação, uma mudança de paradigma. Se os governos pararem de pensar em obras, propaganda e resoluções de curto prazo, seria já um primeiro passo. A educação é algo muito sério que define futuro dos jovens e do país", conclui.