PATRIMÔNIO VILIPENDIADO

Bustos de estátuas viram alvo fácil de bandidos na rua

Onda criminosa se espalha e coloca em risco a memória e a cultura da cidade

Isadora Stentzler/ [email protected]
01/11/2023 às 09:01.
Atualizado em 01/11/2023 às 09:01
O busto do renomado cientista japonês Hideyo Noguchi foi recuperado na segunda-feira, após ter sido furtado provavelmente na noite de domingo na praça ao lado do Nipo (Rodrigo Zanotto)

O busto do renomado cientista japonês Hideyo Noguchi foi recuperado na segunda-feira, após ter sido furtado provavelmente na noite de domingo na praça ao lado do Nipo (Rodrigo Zanotto)

Os bustos de estátuas, além de serem alvos frequentes de atos vandalizadores, agora enfrentam também a ameaça de furto em Campinas. O busto que representa Álvaro Ribeiro, fundador do Correio Popular, encontra-se desaparecido do Largo do Pará. Simultaneamente, outro busto, retratando o cientista japonês Hideyo Noguchi, foi identificado como furtado e localizado na segunda-feira (30). Este tipo de crime é considerado uma ocorrência recente, conforme ressaltado pelo delegado da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic), José Carlos Fernandes da Silva, que alerta para a atuação de receptadores que adquirem e convertem o material em sucata.

O delegado destaca que essa forma de furto geralmente é praticada por indivíduos envolvidos com drogas, os quais roubam qualquer objeto negociável para obter recursos destinados à compra de entorpecentes. Ele ressalta a ausência de registros desse tipo de delito envolvendo bustos anteriormente.

A percepção do aumento na incidência desse crime, segundo o delegado, decorre de um problema social em que muitos dependentes químicos, que estão nas ruas, não conseguem mais obter dinheiro em espécie por meio de roubo. Portanto, recorrem a qualquer objeto que possa ser convertido em dinheiro, como fios de cobre, tampas de bueiro, estátuas e outros itens.

Uma vez furtados, esses objetos e outros semelhantes são vendidos a empresas de reciclagem e comércio de sucatas. O custo varia de acordo com o tipo de material. Os furtos ocorrem rapidamente, geralmente durante a noite, sendo os itens prontamente repassados a receptadores, que os transformam em material reciclável para revenda.

O delegado enfatiza que adquirir objetos provenientes de furto constitui igualmente um delito, sujeito a uma pena de até três anos de reclusão. Ele salienta que, dada a impossibilidade da presença policial em todos os cantos, torna-se crucial o registro do Boletim de Ocorrência e a apresentação de denúncias. Essas ações contribuem para intensificar o patrulhamento em áreas com maior incidência criminal. Além disso, a partir do registro do Boletim de Ocorrência, a Polícia Civil inicia investigações sobre os crimes de furto e receptação, reforça o delegado. 

HIDEYO NOGUCHI

O busto do renomado cientista japonês Hideyo Noguchi foi recuperado na segundafeira (30), após ter sido furtado provavelmente entre a noite de domingo e a madrugada da mesma segunda-feira, da praça do Instituto Cultural Nipo Brasileiro de Campinas. O presidente da entidade, Tadayoshi Hanada, percebeu o desaparecimento da estátua por volta das 6h50 de segunda-feira, durante sua caminhada matinal.

Originário do Japão, o busto foi inaugurado em 5 de junho de 1967, confeccionado a pedido do governador de Fukushima como uma homenagem ao médico bacteriologista Hideyo Noguchi, natural daquela cidade. Noguchi destacou-se como pesquisador de diversas doenças, incluindo a febre amarela.

Por volta das 14h de segunda-feira, na Avenida Barão de Itapura, a Polícia Militar avistou três indivíduos empurrando um carrinho de supermercado. Ao perceberem a presença policial, dois fugiram, enquanto um permaneceu no local. Ao se aproximarem, os agentes identificaram o busto, e o indivíduo retido foi encaminhado à Delegacia.

Atualmente, o busto encontra-se sob custódia do Departamento de Parques e Jardins. Antes de ser realocado, o presidente da Província de Fukushima em São Paulo pretende examiná-lo e, dependendo de seu estado, informar o governador de Fukushima. Não há informações disponíveis sobre o furto do busto de Álvaro Ribeiro no Largo do Pará.

VANDALISMO

Quando não são alvo de furtos, as estátuas e outros símbolos públicos enfrentam o preocupante problema do vandalismo, gerando um custo anual de R$ 1 milhão aos cofres públicos para restaurar locais atacados em Campinas.

No final de agosto, o jornal Correio Popular destacou a importância do acervo campineiro, composto por 105 monumentos tombados pelo patrimônio histórico e cerca de 20 não tombados. Entretanto, a falta de uma política efetiva de segurança, valorização e preservação tem levado a consequências graves.

A reportagem percorreu praças e áreas públicas, revelando pedestais sem bustos de bronze, placas ausentes, partes danificadas e extensas pichações. Algumas preciosidades históricas foram furtadas, como o busto do Padre Anchieta (em frente ao colégio Carlos Gomes), o monumento da Companhia Mogiana (em frente à Estação Cultura) e peças do monumentotúmulo de Carlos Gomes (na Praça Bento Quirino).

Em setembro, a Prefeitura divulgou um balanço alarmante, apontando uma ocorrência de vandalismo a cada dois dias. Em resposta, a Guarda Municipal de Campinas criou, no final do mês passado, um Grupo Antivandalismo. Este grupo monitora e coíbe danos ao patrimônio, empregando a inteligência da corporação para rastrear os autores por meio de redes sociais, além do trabalho dos agentes operacionais nas ruas. O Setor de Monitoramento de câmeras na Cimcamp também participa ativamente dessa força-tarefa.

Durante uma série de ataques a bens públicos, incluindo pichações nos sanitários e placas informativas da Lagoa do Taquaral, incêndio no bambuzal do mesmo parque e a drástica poda de 40 mudas de árvores nativas recémplantadas na Rua Soldado Percílio Neto, a Guarda Municipal registrou 12 ocorrências relacionadas ao vandalismo em um mês, sendo 5 de pichação e 12 de dano ao patrimônio público.

Em resposta a esses desafios, a Prefeitura elaborou um laudo e realizou um mapeamento na cidade para identificar áreas de maior risco, buscando reforçar a segurança.

Dentre os casos, destacase a identificação de dois adolescentes que vandalizaram uma bica d'água no Bosque dos Jequitibás, resultando em uma multa de 800 UFICS (aproximadamente R$ 3,5 mil). Uma placa histórica da Força Expedicionária Brasileira (FEB), datada de 1945 e pertencente ao Instituto Agronômico de Campinas, foi recuperada com um suspeito na Avenida Brasil com Anchieta e devolvida ao IAC. Na ocasião, o indivíduo afirmou que encontrou o objeto na rua, conforme relatado pela GCM.

Outra ocorrência envolveu a GM flagrando um casal realizando pichações no viaduto da Avenida Aquidaban. Ambos foram conduzidos ao distrito policial, onde um termo circunstanciado de ocorrência foi elaborado, e multas foram aplicadas.

Quanto aos bustos, as equipes do Grupo Antivandalismo estão empenhadas em obter informações e imagens de câmeras de segurança para identificar os responsáveis.

No que diz respeito aos crimes do mês anterior, foi identificado o indivíduo responsável por pichar o banheiro da Lagoa do Taquaral, resultando no encaminhamento de um relatório pela GM para a abertura de inquérito.

Foram identificados outros quatro grupos de pichadores que têm atuado na prática de vandalismo em monumentos públicos. As áreas mais afetadas compreendem parques públicos, praças, edifícios e monumentos.

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