ORDEM NA CASA

Bares de Campinas tomam medidas para proteger mulheres de assédio

Estabelecimentos se mobilizam para cumprir lei sancionada por Tarcísio de Freitas

Ronnie Romanini/ [email protected]
08/02/2023 às 08:57.
Atualizado em 08/02/2023 às 08:57
Lanchonete tradicional do bairro Nova Campinas está cumprindo a lei com a fixação de cartazes com senhas de alerta para mulheres que se sintam em risco ou inseguras (Kamá Ribeiro)

Lanchonete tradicional do bairro Nova Campinas está cumprindo a lei com a fixação de cartazes com senhas de alerta para mulheres que se sintam em risco ou inseguras (Kamá Ribeiro)

Bares, lanchonetes e casas noturnas de Campinas começam a se adequar à lei estadual sancionada no dia 3 de fevereiro pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que obriga os estabelecimentos no Estado de São Paulo, incluindo restaurantes e casas de eventos, a adotar medidas em auxílio às mulheres que se sintam em situação de risco dentro do local, entre elas a comunicação à polícia ou a oferta de um acompanhante até o carro (ou outro meio de transporte). Os proprietários também deverão colocar cartazes nos banheiros femininos ou em outros ambientes do espaço para informar que o estabelecimento está à disposição para auxiliar quem esteja em perigo.

A reportagem visitou alguns locais que ou já contavam com algumas ações para garantir que o público feminino se sentisse seguro no local ou que começaram a se adaptar a partir da aprovação da lei, que está em vigor. Uma lanchonete na Nova Campinas, parte de uma tradicional e reconhecida rede, colocou cartazes em diversos pontos do lugar com a explicação da lei estadual. Dentro do banheiro feminino, há cartazes com o intuito de chamar a atenção das clientes mulheres, porém o conteúdo destes é diferente.

"Nos banheiros femininos nós colocamos cartazes com uma palavra-senha. A hora que qualquer um da equipe ouvir essa palavra, já sabe que a pessoa está passando por algum problema. Ela fica no banheiro feminino para apenas as mulheres terem acesso", contou o diretor comercial da rede, Roger Antonio Domingues, 46 anos. 

Ele acrescentou que pelo fato de a lanchonete existir há décadas, e pelo horário de funcionamento que vai até seis horas da manhã, estão acostumados a lidarem com um público que sai de bares e casas noturnas, muitos embriagados, e que se cansaram de presenciar atitudes de assédio ou constrangimento a mulheres por parte de homens. Embora os cartazes tenham surgido após a aprovação da lei, essas cenas fizeram com que desde muito antes a casa já adotasse algumas medidas de proteção às mulheres, como a atenção aos casos em que alguma esteja mais vulnerável pelo estado etílico.

"O nosso caso é diferente porque lidamos com o público da noite e da madrugada. Cansamos de ver episódios constrangedores e realizamos abordagens para tentar solucionar o problema. Às vezes tem uma mulher alcoolizada e um homem percebe e vai até ela (com a intenção de se aproveitar). Quando percebemos isso, nós a abordamos para acalmá-la, dar água, perguntar se tem alguém que possamos ligar ou chamamos um táxi." Para o diretor comercial, a vantagem agora é que eles podem intervir com um respaldo na legislação.

Um bar localizado na Avenida Carolina Florence tem adotado desde 2019 algumas ações de segurança às mulheres que frequentam o espaço. A primeira delas foi justamente colocar nos banheiros femininos cartazes com palavras-chave que podem ser ditas para os funcionários do bar de maneira discreta para que medidas possam ser tomadas. A sugestão inicial veio justamente de uma cliente mulher. Agora, os mesmos cartazes estão fora dos banheiros para que até os homens estejam cientes da nova lei e de que agressores não são bem-vindos no estabelecimento.

"Nós estamos sempre atentos aos clientes para promover uma experiência bacana (...) nesse momento de maior atenção é quando a gente consegue observar os possíveis comportamentos inadequados. Quando isso acontece, o nosso time está orientado a tomar a atitude necessária de maneira imediata. Em casos de assédio, seja físico, verbal, psicológico, agente está preparado - do segurança ao barman - para as medidas necessárias e com a preocupação de não tomar nenhuma atitude errônea, principalmente não constranger a mulher naquele momento ou deixá-la em um perigo maior ainda."

Pela característica do bar, nenhuma ocorrência mais séria aconteceu. Segundo o proprietário, Gabriel Fahl, 31, os clientes são tranquilos, mas o fato de ter algumas medidas anteriores à lei já fez com que algumas clientes confiassem no bar em alguns momentos, como em um 'primeiro encontro' marcado por meio de um aplicativo de relacionamentos.

"Ela estava um pouco nervosa com a situação e explicamos as nossas medidas e o que ela poderia fazer caso sentisse medo, ficasse insegura. Ela se sentiu bem acolhida. Além disso, ciente da situação, a gente tentou - com cautela e sem invadir a privacidade daquele encontro - observar em alguns momentos se ela realmente estava bem, se tentou pedir ajuda de alguma forma, mas deu tudo certo e tudo correu bem."

No Distrito de Barão Geraldo, outro tradicional bar e casa noturna também aprovou a nova lei. Uma das sócias do local, Marina Piacentini, explicou que desde que assumiu a função orientou os seguranças e toda a equipe para não haver questionamentos se uma mulher relatasse algum constrangimento ou sensação de insegurança. A ordem é clara: verificar imediatamente e se constatar que há algo ocorrendo, a pessoa que causou o incômodo é expulsa do bar. Ela contou que os próprios clientes do bar têm a postura de observar e denunciar atitudes suspeitas, portanto a comunicação costuma ser rápida mesmo que não parta da vítima. Ela relatou ter presenciado em uma ocasião uma briga de ex-namorados e que o homem empurrou a mulher que bateu a cabeça. Enquanto chamavam a ambulância, tomaram todas as medidas necessárias para identificar quem era o autor da agressão e poder contribuir com a apuração do caso. 

Agora, diante da aprovação da lei, ela afirmou que vão ampliar o protocolo para incluir os cartazes que funcionarão como uma sinalização e extensão do trabalho que a equipe realiza durante os eventos. 

Frequentadores

A maquiadora Beatriz Góes, 29, costuma frequentar alguns bares e restaurantes em Campinas e relatou que, infelizmente, já presenciou em muitas ocasiões assédios de homens - com ela, amigas e até mulheres desconhecidas. Nestes casos, a solução era recorrer à segurança do local. Agora, ela diz que o fato de os estabelecimentos estarem cientes sobre a possibilidade de ocorrências contra as mulheres clientes, e a obrigação de prestar auxílio, acarreta em uma maior segurança.

A maquiadora disse já ter visto em banheiros femininos de alguns lugares cartazes com orientações, como pedido de ajuda a funcionários ou palavras-chaves, para que as mulheres possam buscar amparo sem que o abusador perceba. Beatriz acrescentou que uma medida que daria ainda mais tranquilidade às clientes seria ter uma funcionária mulher para lidar com a vítima de alguma violência.

"Acho que ajudaria um pouco mais ter sempre uma funcionária mulher para ajudar com isso, mas nem sempre vai ter uma mulher no lugar. Seria o ideal, ainda mais se o cara foi agressivo, seria bom ter uma pessoa que a gente confiasse mais para nos acalmar", concluiu.

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