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Automedicação, um hábito no País

Quase metade se automomedica ao menos uma vez por mês e, pasmem, um quarto faz isso todos os dias ou pelo menos uma vez por semana

Francisco Lima Neto
12/05/2019 às 15:54.
Atualizado em 03/04/2022 às 22:23

Pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) alerta que 77% da população brasileira se automedica regularmente. Quase metade se automomedica ao menos uma vez por mês e, pasmem, um quarto faz isso todos os dias ou pelo menos uma vez por semana. A pesquisa foi feita pelo Instituto Datafolha. O estudo detectou um tipo diferente de automedicação, aquela feita a partir de remédios prescritos. Nesse caso, a pessoa passou pelo profissional da saúde, teve um diagnóstico, recebeu uma receita, mas não usou o medicamento conforme orientado, alterando a dose receitada. Esse comportamento foi relatado pela maioria dos entrevistados, especialmente homens, e jovens de 16 a 24 anos. A principal alteração na posologia foi a redução da dose recomendada. O motivo para isso, aponta a pesquisa, foi a sensação de que "o medicamento fez mal" ou "a doença já estava controlada". Outro razão é que os medicamentos foram considerados muito caros. Dúvidas Entre os entrevistados que utilizaram medicamentos nos últimos seis meses, 22%, mesmo com prescrição, tiveram dúvidas com relação à dose e contraindicações contidas na bula. O mais grave é que cerca de um terço deles não procurou esclarecer as dúvidas e, desses, a maioria parou de usar o medicamento. Depois do médico, a internet e a bula são as principais fontes de informação para tirar dúvidas sobre o uso dos remédios. Os farmacêuticos (que prescreveram ou dispensaram o medicamento) foram a quarta fonte mais consultada, tendo sido citados por 6% dos entrevistados. Familiares, amigos e vizinhos foram os mais citados como influenciadores na escolha dos medicamentos usados. Para o presidente do Conselho Regional de Farmácia (CRF-SP), Marcos Machado, a pesquisa dimensiona a gravidade de um problema que já era de conhecimento de todos, a automedicação dos brasileiros. "Não é por acaso que os medicamentos surgem como uma das principais causas de intoxicação no País. É uma cultura que necessita mudar. A população precisa ser orientada que medicamento não é um produto qualquer, seu uso implica em riscos à saúde", diz. A empregada doméstica Adriana Francisco de Souza, 33, diz que ela e o marido costumam comprar remédios para problemas simples. "Remédio para dor de cabeça, antialérgico, pra gripe, xarope. Geralmente já sei o que quero, pego e vou embora. Só às vezes falo com o farmacêutico. É perigoso, mas como já uso, não tem problema", diz. A publicitária Paula Carneiro Amin, 35, é exceção. "Sempre fui tratada com homeopatia, desde criança. Eu compro, mas é muito raro. Se eu tenho uma dor de cabeça, eu deixo passar, faço um chá, procuro métodos naturais. Se preciso de remédio, peço informação para o farmacêutico porque acho que com a saúde não se brinca. A maioria gosta de comprar remédio, meio viciado", afirma. Conselho faz campanha de orientação Para alertar a população sobre a gravidade do problema, o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo, CRF-SP, promove a partir desta semana, a ação "Farmacêutico na Comunidade", em que farmacêuticos voluntários prestarão serviços gratuitos como aferição de pressão arterial, além de orientar sobre formas corretas de utilização, efeitos colaterais, interações medicamentosas, descarte correto e muito mais. Em Campinas, a ação ocorreu ontem, na Av. Carlos Araújo Gobbi, 529. O evento ocorrerá também durante a semana em outras 28 cidades do Estado de São Paulo. Para professora, acesso fácil aos remédios é problema Patrícia Moriel, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unicamp, diz que o fácil acesso aos medicamentos é um problema. "A pessoa tá com dor de cabeça, lembra que sempre vê comercial na TV, vai lá e pega o remédio. Mas não sabe se a dor de cabeça é simples, se é por ter ficado muito tempo em jejum, de menstruação, ou coisas mais graves", diz. Ela lembra que é muito comum as pessoas terem uma caixinha com medicamentos em casa. "Não é certo. As pessoas guardam no banheiro, onde tem muita umidade, ou na cozinha, onde é muito quente. Algumas moléculas químicas podem sofrer oxidação e se tornar tóxico e trazer prejuízos", alerta. Outro problema é a interação medicamentosa. Quando um remédio interage com outro pode reduzir a eficácia de ambos e até causar reações adversas. "Já teve caso no PS da infantil da Unicamp de um pai que chegou com a criança com intoxicação hepática por paracetamol. Ele disse que estava dando por causa da febre. Quando a criança tinha 35 graus ele dava. Mas isso nem é febre e ele estava dando sem necessidade", revela. Esses, segundo ela, são os principais riscos da automedicação. Entretanto, ela sabe que a saúde pública não comporta mais essa demanda. "Nosso País tem falência na Saúde Pública. Não dá pra falar para a pessoa procurar um Pronto-Socorro quando está com dor de cabeça". Para esses casos, ela aponta que a saída é a automedicação responsável. Toda farmácia tem um farmacêutico responsável e é ele que deve ser procurado nesses casos. "Ele tem capacidade técnica para verificar o que pode ser tomado para uma dor de cabeça, por exemplo, e prescrever os medicamentos que não são tarjados. Ele faz questionamentos e pode indicar ir para o PS, faz uma espécie de triagem", explica Patrícia. A farmacêutica Tânia Piva Moreira confirma que são várias as pessoas que entram na farmácia, pegam remédio e vão embora sem perguntar nada. "É arriscado porque se falam com a gente, a gente pergunta se tem alergias, o tempo dos sintomas e orienta da melhor maneira", diz.

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