SEGURANÇA

Aumento da violência gera pânico em escolas da região de Campinas

Situação é preocupante deixando em alerta pais, alunos, professores e funcionários

Luis Eduardo de Sousa/ luis.reis@rac.com.br
31/03/2023 às 08:30.
Atualizado em 31/03/2023 às 08:30

Na unidade do Ceprocamp José Alves, no Satélite Íris, um homem de 24 anos entrou no local e tentou tirar uma estudante de 20 anos à força para resolver uma suposta “briga de casal” (Alessandro Torres)

Quatro dias após o atentado que matou a professora Elisabeth Tenreiro e deixou outras três pessoas feridas na Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo, os olhares de pais, alunos, professores e funcionários estão voltados à violência nas áreas internas e próximas de escolas de Campinas e região.

Em quatro unidades escolares de Campinas houve ontem registro de alguma movimentação atípica. A reportagem percorreu três delas. No bairro Satélite Íris, um homem invadiu a unidade do Centro de Educação Profissional Prefeito Antônio da Costa Santos (Ceprocamp) unidade José Alves e tentou arrancar uma aluna da sala à força. Ele foi impedido por servidores, que acionaram a Guarda Municipal (GM). Nas outras, pais procuraram servidores preocupados, após boatos de ameaças. Ao Correio Popular, a assessoria do secretário estadual de Segurança Pública, Guilherme Derrite, disse que o chefe da Pasta autorizou “medidas imediatas”.

Casos

Na manhã de ontem, mensagens trocadas entre pais e alunos da Escola Municipal Padre Emílio Miotti, no Jardim Santa Lúcia, fizeram com que alguns tutores evitassem mandar os alunos para a escola. “Meu filho chegou em casa e falou para mim que tem um aluno dizendo que vai levar uma faca para a escola e fazer um massacre” dizia a mensagem obtida pela reportagem. A Secretaria Municipal de Educação disse que a unidade não teve conhecimento de nada do tipo e as aulas aconteceram normalmente.

No bairro Satélite Íris foram dois casos. O primeiro na Escola Estadual São Judas Tadeu. Alunos relataram à direção que um homem estava andando na rua da escola com uma faca. Com medo, os estudantes correram pelas ruas do bairro desesperados e a Polícia Militar (PM) foi acionada. Na escola, a direção evitou falar sobre o caso. “Alguns alunos retornaram para casa, pais vieram para saber o que estava acontecendo, mas não aconteceu nada”, informou um funcionário da secretaria escolar.

A poucos metros dali uma confusão generalizada terminou na delegacia em unidade do Ceprocamp José Alves. Um homem de 24 anos entrou no local e tentou tirar uma estudante de 20 anos à força para resolver uma suposta “briga de casal”. A vítima, que é aluna de curso profissionalizante, se recusou a sair. Revoltado, o rapaz ameaçou funcionários, que acionaram a GM. Por fim, vítima e uma representante da unidade foram encaminhadas à 2ª Delegacia de Defesa da Mulher, onde um Boletim de Ocorrência foi registrado. “Nós fomos acionados pelos funcionários que disseram que o rapaz queria resolver uma briga de casal dentro da unidade. Quando chegamos, o rapaz fugiu e não foi capturado. A vítima prestou depoimento e saiu daqui com uma medida protetiva”, informou o guarda municipal Mendonça, que apresentou a ocorrência.

Uma professora da unidade, que preferiu não ser identificada, contou as cenas constrangedoras que viveu em sala der aula. “Ele entrou na sala tentando conversar com ela. Nós não conseguimos ver se estava armado, embora alguns alunos tenham dito que sim. Como ela se recusou, ele tentou tirar ela da sala. Nos seis anos que trabalho na rede nunca tinha vivido isso. Ela já tem um filho, a situação dela é complicada”, contou a docente.

Sobre o caso, a Secretaria de Educação de Campinas emitiu uma nota em conjunto com a GM. No texto, a Pasta lamentou o ocorrido e disse que os “profissionais estão atentos às situações de conflito”. “A Educação lamenta o ocorrido na unidade do Ceprocamp João Alves e está prestando todo o apoio à aluna. Os profissionais perceberam o rapaz diferente da comunidade escolar e prontamente acionaram a GM. A Secretaria promove ações de Cultura de Paz em suas unidades. Temas como violência, racismo, entre outros são tratados em sala de aula de maneira interdisciplinar.”, informou a nota.

O quarto e último caso na metrópole aconteceu na Escola Estadual Mário Natividade, na Vila Castelo Branco. A direção da unidade informou que dois homens, aparentemente embriagados, tentaram entrar na escola no horário da chegada dos alunos, por volta das 6h50. Funcionários impediram o ingresso da dupla e uma viatura foi acionada. Assustados com a presença de viaturas da PM, alguns alunos retornaram para casa e pais procuraram a escola para entender que havia acontecido. “Os alunos mandam fotos das viaturas para os pais, não explicam direito o que está acontecendo e gera pânico”, comentou a diretora, que pediu para não ser identificada. Após o caso, os alunos que entraram na unidade tiveram aula normal.

Além dos casos em Campinas, outros dois foram registrados na região. Ontem, em Sumaré, a PM foi acionada para conter uma briga entre alunos em uma Escola Estadual no Parque Florely. Durante revista, um deles foi apreendido com drogas na mochila.

Na terça-feira, dia 28, em Mogi Guaçu, a 60 km de Campinas, uma inspetora de alunos foi agredida por uma estudante de 14 anos. De acordo com a Polícia Civil, o motivo teria sido um atraso da aluna. A funcionária foi alvo de chutes, socos e puxões de cabelo, e precisou de atendimento médico.

Comportamento

Para o psicólogo e filósofo André Roberto Torres, da PUC Campinas, os últimos casos de atentados em escolas contribuem para um medo coletivo, que faz com que pais, alunos e professores hiperdimensionem fatos. “A morte pela violência deixa as pessoas muito assustadas. Qualquer pessoa pode sofrer uma ameaça e isso gera um medo coletivo, fazendo com que as pessoas busquem uma maneira de se protegerem. Quando temos um caso como o que aconteceu em São Paulo, as pessoas adquirem uma espécie de trauma e que pode até culminar num estresse pós-traumático”, explicou.

Em relação à violência nas escolas, Torres explicou que houve nos últimos anos um incentivo pesado à cultura da violência. “Existem grupos que têm culturas mais violentas e grupos com culturas mais pacíficas, mas nada disso é natural. É tudo fruto de uma construção social promovida pelo grupo. Nos últimos anos houve um incentivo pesado à cultura da violência, que respondeu muito rapidamente e muito agressivamente. Historicamente o Brasil já é um País violento e se a gente não cuida dessa questão, essas culturas mais violentas se potencializam”, concluiu.

Já o sociólogo e professor Vitor Berletta, da Faculdade de Ciências Humanas da PUC Campinas cita dois fatores que têm contribuído para a escalada dos conflitos. “Nós já temos uma situação de vulnerabilidade social nas escolas que coloca os alunos em um contexto de violência, mas, especialmente nos últimos anos, esses jovens encontraram um espaço na internet para crescerem em grupos extremistas. Em contrapartida, cada vez mais os professores perderam espaço para posições antagônicas” dissertou.

Medidas

Ao Correio Popular, a assessoria do secretário estadual de Segurança Pública, Guilherme Derrite, disse que o titular da Pasta já tem atuado na prevenção dos casos de violência, reforçando a segurança nas unidades da rede estadual. “Todos os capitães, comandantes de todas as companhias do Estado, estão entrando em contato com os diretores das escolas de suas áreas para discutir e entender como podem potencializar os programas de segurança. A nossa intenção é aproximar os profissionais da Educação e da Segurança para ampliar a rede de proteção aos alunos de toda e rede pública de ensino”, disse.

Na última semana, o governador Tarcísio de Freitas informou que estuda contratar policiais da reserva para que fiquem de forma permanente nas escolas, fazendo uma ponte entre a polícia e a Educação.

Conforme noticiado pelo Correio Popular, uma pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva e pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) revelou que 45% dos alunos da rede estadual em Campinas se sentem inseguros no entorno das escolas.

A nível municipal, a Secretaria de Segurança Pública não informou sobre possíveis medidas para evitar aumento de casos. Na Câmara, o vereador Marcelo Silva (PSD) protocolou um Projeto de Lei que autoriza o Executivo a transferir parte do contingente da GM para a Rede Municipal. O projeto deve ser pautado nas próximas sessões. A Segurança Pública não comentou a medida.

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