Dois dos principais protagonistas da guerra velada do transporte público de Sumaré trabalham dentro da Prefeitura da cidade, expondo um evidente conflito
Agressão de motorista, na última semana, intensifica disputa entre as categorias do segmento: condutores e cobradores de ônibus planejam greve (AAN)
Dois dos principais protagonistas da guerra velada do transporte público de Sumaré trabalham dentro da Prefeitura da cidade, expondo um evidente conflito de interesses entre as funções que exercem como funcionários comissionados, e ao mesmo tempo em que desempenham papéis no controle do sistema de transporte complementar, hoje operado com 14 vans e microônibus no município. A própria Administração admitiu o fato por meio de nota enviada ontem ao Correio Popular, mas não se pronunciou sobre o fato de Renato Machado Silva e Eduardo Romiti de Souza operarem, de dentro do Paço Municipal, as ações da Cooperativa dos Perueiros de Sumaré (Coopersum), entidade com diversas suspeitas de irregularidades, inclusive em relação à sua própria legalidade. Desde a semana passada, após uma agressão do perueiro João Paulo Dela Coleta contra uma motorista, caso que ganhou notoriedade em nível nacional, veio à tona uma série de perseguições e agressões a motoristas e funcionários da Viação Ouro Verde, empresa com a qual disputam o domínio das linhas. Desde 2013, foram registrados pelo menos 20 boletins de ocorrência na Polícia Civil, muitos dos quais enviados para que a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Rural para que providências fossem tomadas. O caso mais recente ocorreu quarta-feira passada, quando uma motorista de ônibus foi atacada por um motorista de van dentro de seu coletivo por ter atrasado 10 minutos para chegar num ponto. Ela foi levada ao hospital com sangramentos na testa. A agressão simbolizou a gota d'água para o Sindicato dos Condutores de Americana e Região, que deflagrou uma paralisação geral dos coletivos a partir de hoje até que representantes da Prefeitura, Guarda Municipal e Polícia Militar apresentem melhores garantias de segurança aos motoristas e cobradores da Viação Ouro Verde. A Prefeitura apenas informou que Silva e Souza não são permissionários do sistema de transporte complementar, embora frequentemente se apresentem como diretores da cooperativa. Durante a greve dos caminhoneiros, por exemplo, Souza foi procurado pela reportagem para comentar os impactos no transporte e autorizou ser identificado como diretor da Coopersum. Há uma matéria do portal UOL, publicada semana passada, na qual também traz uma declaração de Souza como representante da cooperativa. O problema é que em 19 de janeiro de 2017 ele começou a trabalhar como assistente administrativo na Secretaria de Serviços Públicos e, em tese, teria de se afastar da cooperativa, pelo fato de seu setor de atuação ter relação direta com as ações da Administração. Duas semanas depois, Renato iniciou seus serviços na Secretaria de Planejamento Urbano. A reportagem apurou que atualmente ambos recebem salário de R$ 3.242,95 da Prefeitura. Os cargos não foram confirmados pela Administração. Questionado sobre a suposta “vida dupla”, Souza recua: “Eu me associei à Coopersum desde 2001, mas estou licenciado desde o ano passado em função de ter sido chamado pelo prefeito (Luiz Dalben-PPS) para assumir um cargo na Prefeitura. É claro que continuo acompanhando o que acontece no transporte, ajudo no que é possível, mas sem atividade constante como antes”, tentou se justificar. A reportagem, então, perguntou quem manda na Coopersum e Souza mencionou os nomes de Claudemar, Gilmar, Patrícia e Alan e se prontificou a passar o contato de um deles para uma posição oficial da cooperativa sobre a crise no transporte da cidade, mas não retornou depois. Já Renato Machado Silva, conhecido pelos perueiros como presidente da Coopersum, também foi procurado, mas não atendeu às chamadas telefônicas feitas em seu celular ontem e sexta-feira passada. Assassinato O histórico de problemas da Coopersum começou a partir de 2002, quando seu ex-presidente Wilson Moreira Franco, o Mineiro, foi assassinado com oito tiros numa padaria. De lá para cá, sucessivas trocas de comando na diretoria, suspensões da licitação para atuação no transporte complementar da cidade e escândalos de perseguições e agressões a motoristas de ônibus da Viação Ouro Verde, com quem rivalizam pelo domínio das linhas, têm se tornado corriqueiros, o que levou o Sindicato dos Condutores de Americana e Região a deflagrar uma paralisação geral dos coletivos a partir de hoje. Atualmente, a cooperativa não possui nenhuma sede fixa, telefone ou sequer página oficial em rede social. Ameaças X greve Representantes do transporte complementar, que circulam com micro-ônibus, encaram a possível greve dos motoristas de ônibus a partir de hoje como uma afronta. O clima, que já é tenso há alguns anos, tende a esquentar, caso a paralisação se confirme. Um áudio, que circula no WhatsApp, atribuído a um perueiro exemplifica os ânimos acirrados das duas categorias. “Vou mandar um papo bem reto para o pessoal que fica postando fotinha (sic) e vídeo (da agressão a motorista) por aí. Fala pra esse pessoal se calar e ficar numa boa. Eu não estou mais medindo consequências da minha vida pra acabar com esse transporte. A hora que me der na cabeça eu termino com isso rapidinho. Se continuar esse tipo de brincadeirinha, o bagulho vai ficar louco e vai embaçar, vou comprar essa briga”, diz o áudio. Em outra agravação, atribuída a um líder dos perueiros, há uma ameaça explícita ao Sindicato dos Motoristas de Ônibus e sugere que o presidente da entidade, Paulo Sérgio da Silva, o Paulinho, repense a ideia de paralisar os coletivos, o que pode prejudicar diretamente o trabalho dos perueiros. “O ônibus atrasa, não tem horário. Fica a maior guerra na rua por causa dessas atitudes, já passamos pra Câmara e nada. Não gosto de agressividade, não concordo com o que o motorista fez, mas o que o Paulinho quer mais? Quer vir zoar a nossa cidade, nosso povo?”, aponta o áudio. Segundo Eduardo Romiti, que já se apresentou recentemente como diretor da Coopersum, mas se diz atualmente licenciado, todo tipo de ameaça é condenável. ”O que o menino (perueiro) fez foi uma infelicidade e ele já foi expulso por isso. Carro nosso ele não dirige mais. Muito se fala dos perueiros, mas ninguém tem ideia do quanto a gestão Cristina Carrara (ex-prefeita) nos quebrou”, afirma. Ao Correio, Paulinho salientou que a luta é por segurança. “Nosso movimento é contra a agressão a nossa companheira. Desde a última semana, pedimos para alguém da Prefeitura nos atender e até agora, nada.”