INDEFINIÇÃO

Anac não cumpre prazo para relicitação de Viracopos e deixa futuro do terminal incerto

Tribunal de Contas da União quer que a Agência Nacional de Aviação Civil se manifeste em até 15 dias para justificar a perda da data-limite estipulada

Edimarcio A. Monteiro/[email protected]
03/06/2025 às 10:39.
Atualizado em 03/06/2025 às 12:46
Prazo para relicitação da concessão do aeroporto foi definido pelo TCU ao rejeitar o pedido de adiamento feito pela Aeroportos Brasil Viracopos; o prazo de quatro anos venceria em 2024, mas foi suspenso pela tentativa de acordo entre a ABV e a Anac para manter a empresa e evitar uma nova concorrência, negociação que fracassou (Rodrigo Zanotto)

Prazo para relicitação da concessão do aeroporto foi definido pelo TCU ao rejeitar o pedido de adiamento feito pela Aeroportos Brasil Viracopos; o prazo de quatro anos venceria em 2024, mas foi suspenso pela tentativa de acordo entre a ABV e a Anac para manter a empresa e evitar uma nova concorrência, negociação que fracassou (Rodrigo Zanotto)

O prazo para relicitação do Aeroporto Internacional de Viracopos venceu ontem sem que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) tenha sequer aberto o processo, o que deixa a situação futura do terminal aeroportuário incerta. No início da noite de ontem, o Tribunal de Contas da União (TCU) tornou público o despacho do relator do caso, ministro Bruno Dantas, dando o prazo de 15 dias para que a Anac “apresente as razões de justificativa para a consumada perda do prazo legal para a conclusão do processo de relicitação do Aeroporto Internacional de Viracopos."

Ele cobrou também do diretor-presidente interino da agência reguladora, Roberto José Silveira Honorato, explicação sobre “as consequências para o interesse público da não conclusão da relicitação dentro do prazo”. O ministro não indicou as possíveis medidas por parte do Tribunal em função do descumprimento.

A Anac informou que está à disposição da Corte para prestar todos os esclarecimentos necessários sobre o assunto. “A Anac registra que sempre pautou sua atuação, em todos os processos de relicitação que conduziu, pelos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, boa fé e legalidade estrita, além de sempre observar orientações e determinações expedidas por órgãos competentes, tendo se submetido voluntária e proativamente à fiscalização do TCU em todos os atos praticados, sendo que jamais recebeu qualquer ressalva ou apontamento quanto à irregularidade de sua atuação.”

Por enquanto, a concessionária Aeroportos Brasil Viracopos (ABV) segue à frente da gestão de Viracopos até a definição de uma nova administradora, o que ainda não tem data prevista para ocorrer. A empresa apontou que manterá todas as operações normalmente, sem impacto para os passageiros e companhias aéreas.

A data de 2 de junho para abertura de uma nova concorrência pública foi definida em fevereiro, por unanimidade, pelo plenário do TCU, mas o prazo foi descumprido pela Anac, mantendo o impasse sobre o futuro do maior aeroporto de cargas do país e um dos principais de passageiros. Em novembro passado, a Anac enviou a minuta de relicitação para a Corte e aguarda o retorno para a publicação. Em seu voto durante sessão realizada há quatro meses, Bruno Dantas declarou que “esse prazo (vencido ontem) é fatal e somente caberá prorrogação se atendidos os critérios estabelecidos [...]da Lei 13.448.”

LEVANTAMENTO

Em fevereiro, o TCU determinou também a realização de uma auditoria independente para ter subsídios para avaliar os direitos e deveres, tanto da agência quanto da ABV, no caso em tramitação sobre a devolução de Viracopos para a União, que se arrasta desde 2020. Em março, o Tribunal autorizou a Anac a prorrogar o contrato para a realização da auditagem, com o documento sendo aprovado na última sexta-feira (30) pela agência reguladora.

O relator do caso no TCU, ministro Bruno Dantas, considerou que esse levantamento é primordial para definir as indenizações e evitar incertezas sobre o processo, até mesmo para garantir os valores adequados da nova concorrência. Documento protocolado pela Agência Nacional de Aviação Civil no TCU apontou que a concessionária tem direito a uma indenização de R$ 2,5 bilhões, valor referente a 31 de dezembro de 2022, pelos investimentos realizados no aeroporto e ainda não amortizados. Do saldo, serão descontadas na relicitação as dívidas da empresa com a Anac, como outorgas vencidas e multas não quitadas.

Já a ABV indicou no Relatório da Administração Exercício 2023, apresentado em março de 2024, ter direito a um ressarcimento de aproximadamente R$ 4 bilhões, “o que é mais do que suficiente para saldar todo o valor devido ao poder concedente”. Independentemente do processo em andamento no TCU, após o fracasso de uma tentativa de acordo para manutenção do atual contrato de concessão, a ABV e a Anac retomaram a negociação no processo de arbitragem que corre na Câmara de Comércio Internacional (CCI). Esse tribunal arbitral, com sede em Paris, representa os interesses de milhões de empresas em mais de 170 países. Seu objetivo é estabelecer regras e políticas relacionadas a negócios e investimentos para entidades comerciais e atuar como um árbitro quando surgirem disputas.

MANIFESTAÇÕES

O prazo para relicitação da concessão do aeroporto foi decidido, por unanimidade, pelo Tribunal de Contas de União ao rejeitar em votação no plenário o pedido de adiamento feito pela Aeroportos Brasil Viracopos. O prazo de quatro anos para relicitação venceria em julho passado, mas foi suspenso pela Corte em virtude de, na época, estar em andamento a tentativa de acordo entre a ABV e a Anac para manter a empresa e evitar uma nova concorrência, o que acabou fracassando.

Em nota oficial, a concessionária de Viracopos divulgou que “confia que a Anac apresentará o cálculo da justa e correta indenização à ABV, auditada por empresa independente antes do edital, conforme a legislação vigente à época da assinatura do termo aditivo”. A empresa acrescentou ainda esperar “que o respectivo pagamento ocorrerá previamente à possível transferência do ativo, também conforme previsto em lei vigente na época da assinatura do termo aditivo de relicitação.”

A concessionária acrescentou ainda que conquistou no mês passado, pela 5ª vez, o prêmio de Melhor Aeroporto do Brasil em sua categoria (acima de 10 milhões de passageiros/ano) e “reafirmou seu compromisso com a continuidade da prestação de serviços nos elevados padrões de qualidade já reconhecidos ao longo dos quase 13 anos de vigência do contrato.”

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU) sugeriu em manifestação feita em abril que a data para lançamento da relicitação fosse postergada para 17 de agosto próximo, mas a Corte manteve o prazo vencido ontem. 

MINISTRO NA REGIÃO

O ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, disse ontem, em Americana, que apoia a permanência da ABV na administração de Viracopos. “Eu estou defendendo que a concessionária atual possa ser preservada. Foi solicitado pelo próprio TCU que pudesse ser feito alguns estudos, ou seja, que a concessionária fizesse estudos do ponto de vista de viabilidade econômica e técnica. E a gente está esperando que ao final o TCU possa dar uma solução definitiva sobre isso”, disse Costa Filho. Para ele, Viracopos é um dos melhores aeroportos do país, o que o fez defender a manutenção desse padrão.

Ele fez a afirmação durante o lançamento de obras de ampliação do Aeroporto Municipal de Americana (SP). O ministro assinou uma ordem de serviço para obras orçadas em R$ 16,3 milhões. Estão previstos o alargamento da pista de pouso e decolagem de 18 para 23 metros, a implantação de áreas de segurança nas cabeceiras e outras melhorias.

PUNIÇÃO

Para a advogada Michèle Stoffel, especialista em Direito Público, o descumprimento do prazo para início da relicitação de Viracopos pode resultar em punição para a Anac, como multa e processo por improbidade administrativa. “Todo gestor público responde não só pelas ações que ele toma, mas também pelas omissões”, destacou. Porém, explicou a advogada, o TCU consideraria o que motivou a infração antes de tomar uma decisão. De acordo com a advogada, o mais importante nesse momento é garantir a prestação de serviço aos usuários do aeroporto.

“Qualquer decisão que seja tomada em relação à administração pública, o foco é o interesse público, é o interesse das pessoas”, afirmou Michèle Stoffel. Na opinião da especialista, a relicitação pode ser realizada paralelamente à auditoria. A realização da relicitação de Viracopos se arrasta há quase cinco anos, desde que foi publicado no Diário Oficial da União, em 17 de julho de 2020, o decreto que qualificou o aeroporto para concorrência pública para escolha de uma nova concessionária.

Ele foi sancionado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) após, em março daquele ano, a ABV ter oficializado, junto à Anac, o pedido de devolução amigável do aeroporto. A empresa alegou descumprimento pelo governo federal de cláusulas prevista na concorrência pública, o que afetou o seu equilíbrio econômico-financeiro. Ela citou como principal ponto não ter recebido o sítio aeroportuário de 27 quilômetros quadrados, o que inviabilizou o desenvolvimento de projetos que aumentariam a receita. Eles previam a construção de hotel, centro de convenções, edifícios comerciais e universidade. Viracopos ocupa hoje em torno de um terço dessa área.

Desde a privatização, o governo federal não desapropriou as outras áreas, o que seria sua obrigação. Além disso, as tarifas operacionais ficaram abaixo dos valores previstos na licitação. Para completar, em junho de 2017, a Agência Nacional de Aviação Civil adicionou uma terceira contribuição não prevista, a Contribuição Mensal, resultante da aplicação de alíquota sobre a receita mensal proveniente da cobrança de Tarifas de Embarque, Pouso e Permanência, Preços Unificados e de Permanência, domésticas e internacionais, além da cobrança de Armazenagem e Capatazia.

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