protestos

Alunos pedem a troca da direção na escola de Campinas

Em ato, eles pediram justiça no caso de agressão envolvendo a PM e o fim do assédio sexual na unidade

Isadora Stentzler
27/05/2022 às 21:05.
Atualizado em 28/05/2022 às 10:00
Estudantes se concentraram no pátio da escola para depois rumarem até a Prefeitura: uma das exigências deles é a troca da direção da unidade (Ricardo Lima)

Estudantes se concentraram no pátio da escola para depois rumarem até a Prefeitura: uma das exigências deles é a troca da direção da unidade (Ricardo Lima)

Os estudantes da Escola Estadual Francisco Glicério protestaram na manhã de ontem contra os casos de assédio sexual na escola e ainda da ação da Polícia Militar (PM), ocorrida anteontem (26), que deixou um aluno desacordado na instituição. Eles caminharam da escola até o Paço Municipal de Campinas, com cartazes e palavras de ordem, pedindo Justiça para o estudante e o fim dos abusos na unidade. Os estudantes ainda declararam greve e exigiram a troca da direção da unidade escolar. 

De acordo com os alunos, há dois meses são feitas denúncias de casos de assédio na instituição e a direção da unidade estaria se omitindo sobre eles. Os estudantes falam em pelo menos sete casos. O último teria ocorrido na manhã da quinta-feira, quando uma adolescente foi alvo de outro aluno, que passou a mão nas partes íntimas dela. Ao levar o ocorrido à direção, ela não teria sido ouvida, o que inflamou os estudantes a brigarem contra o acusado. Neste contexto, a PM foi acionada. 

“A PM entrou, após chamarem o reforço da Ronda Escolar, mas não conseguiu conter os alunos. Os policiais entraram armados com fuzis, apontaram as armas diversas vezes aos alunos, ameaçando para que ficassem quietos, que os deixassem ‘trabalhar’. Muitos alunos foram agredidos, inclusive o coordenador do ensino médio. Todos os jovens que conheço levaram, no mínimo, um tapa ou soco na cara”, contou um estudante à reportagem do Correio Popular

Novos vídeos revelaram a ação dos agentes na escola. Em um deles, é possível ver os agentes imobilizando o estudante que acabou desacordado, enquanto outros gritam: “tá machucando”, e questionam: “pra que isso?”.

As imagens mostram o aluno sendo retirado da escola imobilizado pelos pés e ombros com algemas. Ele foi encaminhado ao Hospital Dr.Mário Gatti e liberado na tarde do mesmo dia. 

Família pede justiça

A tia da adolescente, Janaína Pereira, de 29 anos, soube do que ocorreu ao sobrinho por meio de uma mensagem que sua irmã recebeu. O adolescente vive com a mãe de Janaína e, para ela, ver as imagens dele sendo carregado pelos policiais foi chocante. 

“Na hora que eu vi os policias carregando meu sobrinho daquela forma, foi como ver meu filho ali. Meu sobrinho é tudo para mim. Não tem justificativa o que aconteceu com ele. Porque apenas um policial conseguiria resolver a situação e não precisava de tudo aquilo. Tiraram meu sobrinho desacordado da escola, parecendo um saco de lixo”, desabafou.

Segundo ela, a família entrará com um processo contra os excessos dos policiais durante a ação. Ela relatou que o adolescente está abalado psicologicamente e com marcas no corpo, causadas pelas agressões.

“Eu quero justiça”, clamou. “A professora fez uma reunião com os pais e disseram que não foi nada de mais, apenas uma briga. Mas isso é grave, não pode ocorrer em uma escola de adolescentes. A polícia anuncia que garante a proteção da população, mas não há proteção quando a população se sente insegura diante dos policiais. Lembro do George Floyd [americano morto sufocado pela polícia]... E se acontece com meu sobrinho? Quem vai trazer ele de volta? Agora não adianta dizer que vai fazer isso e aquilo. Até quando a população vai ver isso? É essa a segurança que a gente tem? O governo colocar policias para agredir um adolescente, quase tirar a vida dele?” 

Greve 

A direção da escola esteve reunida ontem com os estudantes e representantes da comunidade escolar. Os alunos ameaçam entrar em greve e programaram um novo ato para a próxima segunda-feira (30). “Nós declaramos greve geral até que a direção e, principalmente, a Polícia Militar sofram todas as consequências. Depois de uma assembleia com os alunos, a direção, Secretaria da Educação e diretoria de ensino, deixamos claro que só voltaremos para a escola quando a gestão, principalmente a diretora, deixar o cargo. Sobre a polícia, queremos e exigimos que eles não possam mais exercer a profissão”, defendeu o estudante. 

Procurado, o Conselho Tutelar de Campinas informou que questionou a escola sobre quais medidas o estabelecimento de ensino pretende adotar sobre o ocorrido para que isso não se repita. E ainda que pediu um relatório detalhado do episódio, bem como a qualificação dos estudantes envolvidos. “De posse dessas informações, iniciaremos a adoção de medidas protetivas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Estamos nos colocando à disposição da direção da escola e dos alunos para a realização de encontros para avaliarmos o assunto à luz do ECA”, apontou o conselho, em nota.

Apeoesp

A diretora Estadual do Sindicato de Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Suely Fátima de Oliveira, esteve em reunião com a escola e criticou a decisão de chamar a PM para resolver o conflito na escola. “Conversamos com a direção da escola e definimos como inadmissível ter policiais dentro da escola. Não podemos permitir isso em hipótese alguma”, defendeu. 

“Primeiro tem que haver o diálogo, chamar os pais, os responsáveis, o conselho da escola, o grêmio, o Conselho Tutelar, pessoas envolvidas que saibam, justamente, tratar e conversar, buscar soluções, seja para quaisquer problemas que venham a ocorrer dentro das escolas. Polícia não deve estar dentro da escola em hipótese alguma”.

Suely definiu como grotesca a ação da Polícia Militar e o Sindicato se colocou à disposição dos estudantes e também da direção. “Penso que a gestão da escola não pode ser ela o pivô de tudo. Em hipótese alguma podemos permitir que esse tipo de violência venha a ocorrer em qualquer uma das escolas, seja ela estadual, municipal ou privada, porque a escola é um espaço de desenvolvimento e esse desenvolvimento do ser, da criança, é para uma sociedade, então, não tem como, não tem espaço para violência e discussões.”

A reportagem questionou a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) sobre o registro dos sete casos de assédio, denunciados pelos estudantes, e quais foram as medidas tomadas. Também pediu a posição da instituição frente à greve e o pedido da saída da direção. Em nota, a Seduc informou que foi aberta uma apuração sobre o caso, e que todas as partes serão ouvidas. Já a PM reforçou que toda a ação está gravada pelas câmeras acopladas às fardas dos agentes e que houve uso escalonado da força. 

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