COMPORTAMENTO

Afeto e segurança são essenciais na 1ª infância

Novas pesquisas mostram importância de dar carinho às crianças

Inaê Miranda
06/10/2013 às 14:18.
Atualizado em 25/04/2022 às 00:50
O pediatra César Tonello: "Muito mais do que pesar e olhar a garganta" (Érica Dezonne/AAN)

O pediatra César Tonello: "Muito mais do que pesar e olhar a garganta" (Érica Dezonne/AAN)

Cuidar de uma criança vai muito além de alimentar, educar e levar ao médico para avaliação rotineira. Apesar de parecer difícil de ser mensurado pelas ciências exatas, pesquisas neurocientíficas mostram que proporcionar uma relação de afeto, estável, segura e estimulante nos primeiros meses e anos de vida é fundamental para o desenvolvimento cognitivo, social, emocional e físico de um ser humano. As informações do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) foram repassadas a médicos do mundo inteiro durante o Congresso da Associação Internacional de Pediatria, realizado há três semanas na Austrália.Os primeiros anos da infância, já começando dentro da barriga da mãe, são os principais para o desenvolvimento da criança e responsáveis por formar um ser saudável e bem ajustado socialmente, segundo explica o médico pediatra César Tonello, com base em pesquisas apresentadas durante congresso. “É nessa primeira infância que bilhões de interações dos neurocircuitos cerebrais são estabelecidas, sob a ação direta do ambiente e das experiências vividas, modulando a ação dos genes”, afirma. A fase é tão essencial que alguns programas são traçados para os primeiros mil dias de vida da criança, o correspondente a quase três anos, e a Unicef produziu um cartão com orientações para essa faixa etária.De acordo com Tonello, é cada vez mais claro que apesar de a genética ter uma forte influência, os fatores ambientais, que incluem carinho, nutrição, cuidados e paz, têm uma capacidade enorme de alterar tendências genéticas inatas. “Embora a plasticidade do cérebro persista por mais uns anos além desses citados, sabe-se que as grandes transformações são obtidas com intervenções nessa fase precoce da vida”, afirma. Além disso, Tonello ressalta que as ações são consideradas muito mais baratas e factíveis do ponto de vista econômico e social. Pediatria socialOs cuidados abordados durante o congresso da Associação Internacional de Pediatria também passam, claro, pela maior presença dos pais na vida da criança. “Essa história de licença maternidade de quatro meses é absurda. Nos países desenvolvidos, como a Alemanha, essa licença chega a dois ou três anos”, diz. O desenvolvimento da criança também está baseado na detecção de distorções no processo de educação, na estimulação e em ações preventivas. Nesse contexto, o pediatra tem papel fundamental, orientando os pais em relação aos cuidados psicossociais. “Pediatria é muito mais do que pesar a criança e olhar a garganta. Costumo questionar os pais quanto ao rendimento na escola, falo sobre a importância da autoestima e da necessidade de se estabelecer regras claras e de ser coerente com as suas atitudes”, afirma.Segundo Tonello, apesar da falta de estrutura que muitos pediatras têm para trabalhar, é possível desenvolver um trabalho eficaz. “Cuidar de doença é fácil, agora fazer pediatria vai muito além. Muitos profissionais chegam a realizar um atendimento em cinco minutos, mas a criança precisa de um olhar global. É preciso monitorar os riscos potenciais aos quais ela pode está exposta no aspecto social, físico e nutricional. E não simplesmente dispensar uma bateria de exames para serem realizados na tentativa de tranquilizar os pais. Para se ter uma ideia, uma única tomografia já expõe o sujeito a mais radiação do que a população de Fukushima”, diz.A atenção básica e cuidadosa na primeira infância requer um gasto mínimo, mas com resultados recompensadores. “O gasto é pequeno e você muda o futuro do sujeito para sempre. Temos um longo caminho, mas só com discurso não temos conseguido mudar muita coisa. Parafraseando o novo presidente da AIP, o paquistanês Zulfiqar Bhutta, ‘a estrada da inércia está pavimentada com relatórios e mais relatórios’, e enquanto o tempo passa, cada centavo gasto inadequadamente na saúde é responsável por um problema ou até por uma morte infantil que poderiam ser evitados”, completa.

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