patrimônio cultural

70% dos prédios estão sem conservação

Entre fachadas destruídas, paredes pichadas, deterioração pelo tempo e por vândalos, Campinas vai perdendo, nas ruínas, boa parte de sua história

Maria Teresa Costa
04/07/2019 às 09:31.
Atualizado em 30/03/2022 às 23:37

Entre fachadas destruídas, paredes pichadas, deterioração pela ação do tempo e por vândalos, Campinas vai perdendo, nas ruínas, boa parte de sua história a cada dia. O tamanho do passivo é grande: cerca de 70% dos imóveis tombados como patrimônio cultural da cidade estão em estado razoável ou ruim de conservação, viraram ruínas ou foram demolidos, segundo levantamento da Coordenadoria Setorial do Patrimônio Cultural (CSPC). O retrato da situação vai embasar um plano de ação de gestão do patrimônio, que o Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (Condepacc), começa elaborar neste semestre. O levantamento, que vem sendo realizado desde 2018 pelos técnicos da CSPC, Sandra Milne-Watson e Augusto Bueno da Silva, mostrou que dos 582 imóveis avaliados, apenas 172 estão restaurados ou em bom estado de conservação. Mas 410 deles precisam de intervenção urgente. “A situação nos mostrou duas questões importantes. Uma, a necessidade de critérios mais rigorosos para não termos excesso de tombamentos porque é difícil para os setores privado e público restaurarem os imóveis por causa da disponibilidade de recursos. Outra é a necessidade de mais ferramentas, além da isenção do IPTU e da transferência de potencial construtivo, para incentivar proprietários a recuperar os bens tombados”, informou a historiadora e coordenadora da CSPC, Daisy Ribeiro. O acervo de bens tombados em Campinas é grande e documenta, nas ruas, como a cidade se desenvolveu ao longo das décadas. Mas sem uma ação efetiva de preservação, pode ser perder. O Condepacc, segundo Daisy, já vem adotando posições em relações aos tombamentos como, por exemplo, evitar tombar um imóvel se já existe outro, do mesmo período, técnica construtiva e importância tombado. “Por mais que a gente fique tentada a tombar todos, já temos com clareza que isso não garante a preservação”, afirmou. “O levantamento nos deixou estarrecidos, porque embora soubéssemos que havia muitos imóveis em situação ruim de conservação, ver os números nos chocou”, disse Daisy. Na reunião do Condepacc em que o inventário foi apresentado, surgiram várias propostas dos conselheiros, que concordam com a necessidade de um plano de ação para garantir a sobrevivência do patrimônio cultural da cidade. O conselheiro Roberto Simionatto propôs que os prédios públicos tombados sejam objeto de concessão e leilão, para que os interessados possam usar a área por 30 anos, arcando com a restauração e manutenção do manifesta preocupação com prédio tombado público, e cita particularmente as ruínas. Propõe que para este tipo de prédio, sejam feitas concessões e leilões, de forma que os interessados possam utilizar a área por 30 anos, arcando com a restauração do prédio e manutenção. O conselheiro Sinval Dorigon sugeriu que a proposta fosse estendida aos prédios particulares e que, após os 30 anos, fosse cobrado o valor de aluguel. Além disso, propôs que as contrapartidas investidas por empresas em Campinas, direcionadas para a área de saúde e educação, incluam também os bens tombados. Os prédios públicos tombados, segundo Daisy Ribeiro, vêm tendo algumas ações para a conservação, mas as propostas para restauração e recuperação de exemplares importantes para a história da cidade, ainda estão longe de ocorrer. Mas há alguns bons exemplos de restauração de imóveis públicos tombados, como a Estação Cultura e um dos edifícios do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), que foram recuperados pela mostra Campinas Decor. A mostra também recuperou o edifício do antigo Colégio Ateneu, em frente à Prefeitura. Prédios privados, como o Jockey Club Campinas, passaram por recente recuperação utilizando o mecanismo conhecido por transferência de potencial construtivo, que permite aos proprietários vender para investidores, o potencial que a área tem para construção se não houvesse no local um bem tombado. Os R$ 1,15 milhão usados nas intervenções do prédio vieram dessa transferência. História em ruínas ocupa bens públicos e privados As ruínas da história de Campinas incluem bens públicos e privados, praticamente na mesma proporção. Há alguns imóveis que já se tornaram símbolos do descaso com o patrimônio da cidade: a casa-sede da Fazenda Jambeiro, no Parque Jambeiro, e a antiga Cervejaria Columbia, na Avenida Andrade Neves. Os dois são ruínas: a ação do tempo e do vandalismo levou portas, janelas, telhados. O da Columbia só não caiu porque está escorado e a casa do Jambeiro, sem proteção, vai pelo mesmo caminho. A historiadora da Coordenadoria Setorial do Patrimônio Cultural, Daisy Ribeiro, disse que há projeto para a proteção da casa do Jambeiro e o edital para a contratação de conservação do telhado, as estruturas e proteção do entorno está em andamento na Prefeitura. “Nosso problema é falta de recurso”, disse. O antigo prédio da Cervejaria Colúmbia, na Avenida Andrade Neves. Têm 2,6 mil metros quadrados de área e foi construído em 1873 para abrigar a Cia MacHardy, primeira fundição de Campinas, que se transferiu para a avenida, bem próximo de sua concorrente, a Fábrica Lidgerwood. Já foi anunciada a intenção de recuperar o lugar para receber um centro de cultura popular que ainda permanece sendo apenas um plano. O complexo ferroviário central, que foi transformado em Parque Cultural pelo Condepacc, também precisa urgente de intervenção. A estação foi recuperada pela Campinas Decor, mas o restante continua esperando recuperação. Sem cuidados, o prédio da oficina da Companhia Mogiana, dentro do complexo, chegou a ser utilizado pela Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec) como depósito de carros apreendidos. A CSPC interferiu e este ano grande parte dos carros que estavam dentro do prédio foi retirada e a edificação foi limpa. Andando pelas ruas, se depara com muitas ruínas. Na Rua Cônego Cipião, no Centro, está o que restou da residência da professora Silvia Simões Magro, do final do século 19. A casa foi adquirida por uma construtora em 1988, que em 1989 demoliu parte do prédio, danificando forro e piso. O madeiramento em pinho de riga ficou exposto e desapareceu. A lista é longa de bens que precisam de socorro: a antiga fábrica da Lidgerwood onde funcionava o Museu da Cidade e que foi transferido por falta de segurança da edificação para a manutenção do acerto; vários imóveis no Centro precisam de restauro e há um acervo ferroviário esperando que o poder público arregace as mangas.

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