Doutora Miriam Sabino: "Buscar um modelo de beleza nem sempre resolve um incômodo" (Divulgação)
Cremes, pinturas, injeções, cirurgias, estica ali, puxa aqui. Aperta, fecha, abre. O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking mundial de cirurgias plásticas estéticas, segundo pesquisa da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (Isaps) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBPC). Foram 905.124 procedimentos em 2011. O país ficou atrás apenas dos Estados Unidos, que realizou 1.094.146 procedimentos no mesmo ano.
Aumento de mama e lipoaspiração são as cirurgias plásticas mais comuns no Brasil.
O desejo por uma aparência melhor é legítimo. Afinal, para muitas mulheres um par de seios mais atraentes ou um bumbum um pouco mais volumoso significam uma revolução na autoestima e sensualidade.
Barriga "tanquinho" e braços torneados podem significar, para os homens, o ápice da masculinidade. Mas o que se observa, porém, são casos de pessoas ainda muito jovens - por exemplo, adolescentes -, procurando fazer cirurgias desnecessárias. Brasileiros têm recorrido à cirurgia plástica como quem vai às compras. Perdeu-se a ideia de que tudo tem limite?
Na filosofia, a beleza tem um lugar considerável. Uma questão fundamental sobre seu tema consiste em perguntar se o belo está na coisa ou no sujeito que o contempla. O conceito de beleza, portanto, muda através da história. Assim, observa-se que antigamente as mulheres mais gordinhas eram mais belas do que as modelos magérrimas de hoje.
Outra busca incessante é pelo retardamento das rugas, dos cabelos brancos, do envelhecimento. "É possível retardar os efeitos do envelhecimento", afirma a médica paulistana Miriam Sabino, especialista em dermatologia e acupuntura. A médica explica ainda que existem cosméticos muito eficientes e que dão resultados satisfatórios. Mas é importante procurar um profissional para indicar o melhor produto para a pessoa. "Não se pode esperar, porém, o efeito de uma plástica. O paciente precisa saber que há limitações", afirmou.
Miriam Sabino frisa que a avaliação de um profissional é importante em todos os casos. "Não vejo exagero em corrigir, por exemplo, uma orelha de abano, um nariz saliente, cicatrizes inestéticas de acne, estrias acentuadas. Enfim usar a tecnologia para minimizar algo que o torne socialmente tímido. Porém, realizar uma cirurgia para ficar parecida com a atriz favorita ou porque a coleguinha a fez, precisa ser muito bem avaliada", orienta a especialista.
Isso porque há todo um aspecto psicológico do adolescente. "É uma idade com mudanças no corpo e precisa de um tempo para a sua própria aceitação". Uma mudança radical será tão impactante como todo o turbilhão de mudanças pelo que o adolescente vem passando.
Miriam, nessa Série Debates, alerta sobre "os pecados" da busca desenfreada pela aparência perfeita. Veja os principais trechos da entrevista à Gazeta de Piracicaba:
Gazeta de Piracicaba: O que existe de verdade e mito no retardamento da velhice?
Miriam Sabino: Com a tecnologia existente se consegue retardar os efeitos do envelhecimento, ou minimizá-los em todos os aspectos, seja do ponto de vista estético como também do que se refere à qualidade de vida do paciente. Porém, ainda não se consegue interromper o envelhecimento. Há a expectativa que futuramente a célula tronco possa rejuvenescer órgãos envelhecidos, porém isso ainda não é uma realidade. Não se sabe tudo o que se poderá obter com essa nova tecnologia.
A partir de que idade homens e mulheres devem começar a pensar na aparência?
Desde a infância são necessários cuidados para futuramente estarmos saudáveis física e esteticamente. Cuidados com a alimentação, educação alimentar, estímulo à prática de exercícios, uso de protetor solar antes das brincadeiras sob o sol são hábitos simples que devem ser estimulados desde cedo. Mas todos nós sabemos o quanto se torna difícil mudar velhos costumes e adquirir novas e boas atitudes.
Quais os principais pecados nos tratamentos de beleza?
Eu considero que o maior pecado e a indicação errada. O paciente é leigo e não tem conhecimento suficiente para discernir o que é melhor para o seu caso. A pessoa somente possui a expectativa de melhora. Se os profissionais de saúde não estiverem preparados para esse tipo de situação, muitas vezes "venderão" um sonho irrealizável. O paciente deve ser convencido que suas feições, no caso de tratamentos estéticos, serão preservadas, porém evidenciando aspectos positivos, reduzindo os pontos mais "inestéticos". Mesmo com plástica, o paciente sempre terá a mesma identidade.
Como a mídia influencia negativamente as pessoas?
A mídia traz um apelo muito grande para o "exterior" do ser humano. Bota a capacidade da pessoa intimamente ligada a sua aparência.
Como isso acontece?
Com a influência das mídias, todos têm a impressão de que não serão aceitos socialmente se não estiverem dentro do padrão mostrado pela mídia (novelas, filmes, cartazes, programas de TV etc). É quando surgem os problemas que vemos ocorrer muito entre os adolescentes.
Dê exemplos.
As meninas , por exemplo, entram numa fixação pelo corpo esguio das modelos. Isso pode evoluir com distúrbios alimentares como bulimia e anorexia. Os meninos também entram numa fixação por estarem malhados e colocam em risco a saúde usando complementos alimentares. Nessa mesma linha de raciocínio vêm as pessoas que se submetem incansavelmente a procedimentos estéticos. Buscam uma imagem perfeita, que na verdade se torna uma obsessão. É uma distorção de sua própria mente em relação ao que os outros pensam sobre o seu corpo.
O que mais incomoda as mulheres?
Estrias, celulite, gordura localizada e rugas de expressão lideram os itens mais abordados em consultas. A situação melhora, mas vão surgindo outros procedimentos como desejo de lipoaspiração ou aumento ou diminuição das mamas. O que geralmente observo é que pelo ritmo de vida das pessoas, ou pelo medo muitas vezes de realizar cirurgias, procuram primeiramente procedimentos menos invasivos. Após a melhora da autoestima, então buscam procedimentos mais complexos, como as cirurgias.
Homens também têm 'neuras'?
Calvície e as rugas de expressão são os campeões. Realizo muitos procedimentos que buscam melhorar a queda capilar, a textura da pele e minimizar linhas de expressão. Curioso é que os homens não gostam de aparentar o procedimento ao qual foram submetidos. Procuram, assim, meios menos invasivos, também.
Qual a sua orientação sobre as cirurgias por modismo?
É importante a orientação dos pontos positivos e negativos, dos efeitos colaterais e principalmente abstrair do paciente a sua real expectativa. Por exemplo, recebo pacientes no consultório com fotos de atrizes, modelos etc. Querem a "mesma boca" da atriz. Avalio as feições da paciente e tento explicar que iremos deixar a sua boca evidenciada, respeitando os seus traços (...). Buscar um modelo de beleza nem sempre resolve um incômodo. É preciso que a pessoa esteja apta também a aceitar limitações do profissional, dos métodos e dos produtos, É necessário respeitar a sua natureza e compleição.
