HÉLIO PASCHOAL

Brics, quem?

Helio Paschoal
helio@rac.com.br
17/02/2013 às 05:00.
Atualizado em 26/04/2022 às 04:21

ig-helio-paschoal (AAN)

Os gigantes acordaram. E vão nos devorar sem dó.

O discurso feito pelo presidente dos EUA, Barack Obama, na semana passada, no qual divulgou a intenção de fechar um acordo de livre comércio com os países da União Européia dentro de um prazo de dois anos jogou uma pá de cal no sonho dos Brics de se tornarem mundialmente relevantes.

Até fomos, e ainda teremos uma sobrevida enquanto a crise nos EUA e na Europa não diminuírem. Mas voltaremos ao ostracismo assim que essa crise acabar (e é bom ninguém duvidar: ela vai acabar muito mais rápido se o acordo vingar).

E não adianta querer dizer que temos a China do nosso lado. Temos, sim. Mas não há China que possa fazer frente se os dois maiores mercados do mundo unirem suas forças. Para os chineses também será o fim do sonho dourado, assim como para os russos e os indianos. E para os brasileiros.

A culpa, contudo, é dos próprios Brics. Perdemos um tempo preciosíssimo, como o é todo tempo em economia, jogando conversa fora e achando que tínhamos nos tornado os reis da cocada preta do mercado mundial.

Ao invés de costurarmos alianças internacionais, investirmos nosso tempo em acordos econômicos que merecessem o nome ou de, pelo menos, tentarmos solidificar nossas relações e nos tornarmos alguma coisa mais do que uma mera sigla, preferimos continuar inertes, cada um defendendo o seu pedaço do bolo, cada um puxando a brasa para a sua sardinha e todos querendo dar lição de economia para os países ricos - como se a crise em que eles se meteram não fosse terminar nunca e como se nosso crescimento, que só conquistamos por causa da fragilidade deles, fosse permanente.

Já que nem uma coisa nem outra é verdade, está aí o resultado: Estados Unidos e Europa resolveram começar a enxugar suas lágrimas e partir para a ação.

Claro, ainda há um longo caminho para que o novo acordo comercial vingue (e pode ser até que tenhamos a grande, mas pouco provável, sorte dele não vingar). Afinal, são muitas as regras protecionistas e muitos os interesses envolvidos.

Mas o capitalismo, embora sofra de crises eventuais, não sofre de caducismo: sabe perfeitamente bem que ou supera esses obstáculos, ou vai condenar a si mesmo a um período muito mais longo de vacas magras do que o necessário para se recuperar. E como ninguém, capitalista ou não, gosta de vacas magras, o mais provável é que as coisas caminhem relativamente bem, com um ou outro nó mais difícil de ser desatado.

Mas que ninguém duvide: a não ser que a crise acabe num passe de mágica, tornando desnecessária uma aliança econômica desse porte, ou que haja algum grande tropeço no caminho da sua elaboração, o acordo vai acontecer. E então, ai de nós.

Ai de nós porque vamos perder de uma tacada só não apenas mercados internacionais (já que acordos comercias pressupõem beneficiar os parceiros, e não os “de fora”), mas pior, vamos perder de vez a chance de tentar recuperar o terreno perdido até agora para costurar nossos próprios acordos - tirando EUA e UE, quem sobra de verdade no mundo com quem valha a pena fazer negócios?

A China? A Rússia? A Índia? O Mercosul? Todos eles juntos? Que seja: mas todos eles juntos. Mas nem assim serão suficientes para substituir, nem de longe, o potencial dos EUA e da UE como mercados consumidores (e fornecedores). Nenhum dos Brics estará em situação confortável - o que tem o seu lado bom: pelo menos na penúra, estaremos irmanados.

E para piorar mais ainda o quadro (como se fosse preciso), o Brasil vem enrijecendo sua política infeliz de protecionismo, sob o mesmo velho e putrefato argumento de proteger a indústria e/ou os interesses nacionais.

Triste País este que não aprende com os próprios erros e que se esquece, em nome de uma ideologia não menos caduca, que fechar mercados e dificultar negócios é o melhor caminho para destruir o próprio mercado e destroçar por completo os próprios negócios.

Mas ideologias não aprendem lições. Ideologias são arrogantes por princípio, se acham sempre certas e acreditam piamente que podem ter sucesso onde outros fracassaram porque, afinal de contas, foram “os outros” que erraram.

Falar e fazer protecionismo neste momento em que nossos grandes parceiros comerciais estão em crise é fácil. Mas vá tentar restringir mercado quando eles estiverem recuperados para ver o que acontece: seremos solenemente ignorados. Ou alguém, fora os ideólogos gagás, acha mesmo que nós, o Brasil, ou nós, os Brics, somos mercados indispensáveis para os grandalhões mundiais?

Há saída para nós? Até há, mas ela vai continuar sendo solenemente ignorada pelo governo brasileiro. Ela passa pela abertura de mercado, pelo estabelecimento de novas parcerias antes que o novo acordo EUA/UE se concretize, passa pelo esforço de se proteger do jeito certo - demarcando espaços comerciais, de forma a tê-los bem definidos e bem protegidos depois. Coisas muito “capitalistas” para o gosto do atual poder.

Ao invés disso, vamos ficar sentados assistindo à associação de dois gigantes e dando de ombros, apostando que não vai dar certo e que nada vai mudar. O problema é que, se der, estamos encrencados. De novo.

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