DECADENTES

Boca do Lixo e Cury esperam revitalização

Área, no Centro de Campinas, é dominada pelo tráfico, prostituição e irregularidades

Rogério Verzignasse
rogerio@rac.com.br
14/08/2013 às 10:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 05:33

Mulheres sentadas em calçada da Rua Ferreira Penteado, perto da antiga estação ferroviária da cidade (Elcio Alves/AAN)

Em meados do século passado, os passageiros desembarcavam do trem e disputavam vaga nos hotéis ao redor. O setor gerava emprego e renda. O entorno da estação era o cartão de visitas da Campinas moderna. Mas o tempo passou. A inauguração do Terminal Central e a explosão do comércio informal nas ruas próximas do Viaduto Cury provocaram a decadência do trecho. O hóspede desapareceu. Alguns estabelecimentos se mudaram ou baixaram as portas. Brotaram por ali a prostituição, o tráfico de drogas, o subemprego, a mendicância. Agora, as fachadas de antigos hotéis nem são notadas. Os letreiros nas paredes e os luminosos se misturam ao cenário urbano poluído. Ruas como Saldanha Marinho, Ferreira Penteado e Visconde do Rio Branco, por exemplo, no passado eram tomadas por lojas finas, escolas, residências de famílias tradicionais. Mas, atualmente, muitas daquelas quadras se tornaram retrato fiel da exclusão social. Na hoje chamada Boca do Lixo, alguns empresários optaram por lacrar os imóveis, à espera de uma revitalização que nunca chega. Outros sobrevivem do aluguel dos quartos, usados para atividades suspeitas. Ninguém dá entrevista. E quem explora o mercado do sexo afasta as mulheres de programa que poderiam ser entrevistadas. O cenário, aparentemente desordenado, é um submundo com leis próprias, onde o poder público tenta, mas não consegue entrar. De acordo com o 1º tenente Hercilio de Almeida Costa, do comando da Polícia Militar (PM), os hotéis e pensões de curta duração colaboram decisivamente para a degradação da área. Os estabelecimentos, afirma, hospedam clientes sem coletar informações pessoais. Não existe nenhum controle de quem entra e sai, e do que se faz dentro dos quartos. A compra e a venda de drogas ou o aliciamento de menores de programa podem pode ser praticados sem que as forças policiais saibam. Para o PM, a Prefeitura precisa modernizar a legislação que define o zoneamento do trecho e aprimorar a fiscalização em estabelecimentos que funcionam sem qualquer regulamentação. O comando da corporação, diz, faz alertas constantes ao governo municipal para que se implante uma política pública com ações consistentes. “Fiscalizar é competência exclusiva do Município. É preciso saber das condições de higiene, da existência de alvará para funcionamento”, afirma. Hoje em dia, diz o policial, os flagrantes de tráfico e exploração sexual só podem ser feitos a partir de denúncias à corporação. Mas o tenente reconhece que as denúncias são raras. Os clientes compactuam com o silêncio. Quem busca prazer sem compromisso não quer ser apontado como responsável por aquela realidade social agressiva. E o crime lucra com a conivência de prostitutas ou donos de pensão que levam algum tipo de vantagem. Segundo o diretor de Controle Urbano da Prefeitura, o engenheiro Moacir Menegaldo Martins, na última operação de fiscalização, há duas semanas, cinco pensões irregulares foram lacradas. “Vamos nos aproximar da PM para ações conjuntas efetivas, que precisam acontecer com mais fequência”, diz. Luta inglória De acordo com Adriana Flosi, presidente da Associação Comercial e Industrial de Campinas (Acic), o cenário nunca esteve tão degradado no trecho entre a Estação Cultura e o Terminal Central. Ela lembra que, desde 2001, o governo municipal debate a revitalização do Centro e planos de reurbanização e qualificação do espaço são anunciados. Mas, na prática, nada muda. “Ninguém quer mexer no que é difícil. Mas a sociedade espera pelas ações do poder público. É a Prefeitura quem precisa acolher os excluídos, organizar e fiscalizar a ocupação do solo, criar condições para que o comércio funcione, volte a gerar emprego e renda por ali”, afirma. Projetos se acumulam na Prefeitura A Administração, pressionada pela opinião pública, lançou na última década diversos projetos para a revitalização do Centro velho, nas imediações do Terminal Central. Durante o governo do prefeito cassado Hélio (PDT), se falou em incentivar a preservação de prédios centenários, incrementar atividades comerciais, aprimorar equipamentos públicos para estimular a circulação do público e acabar com o tráfico e a exploração sexual. Mas o plano nunca saiu da gaveta. No começo, faltaram parceiros para o projeto. Depois, a cidade mergulhou em uma crise política sem precedentes. Se sucederam prefeitos e as velhas propostas foram engavetadas. A Prefeitura agora planeja implementar ações de resgate do Centro, mas o projeto definitivo só será divulgado quando ele estiver detalhadamente planejado. Hoje, o poder público só organiza ações pontuais e emergenciais conjuntas — das secretarias que tratam de urbanismo, inclusão social, segurança pública e saúde.

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