VICTOR ALMEIDA FILHO

Bíblia e fundamentalismo

Victor Almeida Filho
17/02/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 23:58

Nossa reflexão visa entender o fenômeno do fundamentalismo para superarmos certas dimensões fundamentalistas embutidas em nossa cultura e em nossos comportamentos individuais. O fundamentalismo surge quando um sujeito assume seus valores e suas verdades como fonte imutável e única verdade, excluindo pontos de vista discordantes. Eis porque fundamentalismo, intolerância e fanatismo estão sempre de mãos dadas. O nicho do fundamentalismo é o protestantismo norte-americano do século XIX. O termo foi cunhado em 1915, quando professores de Teologia da Universidade de Princeton, publicaram 15 tomos com o título Os fundamentos da fé cristã, onde propunham um cristianismo extremamente rigorista, ortodoxo, dogmático e como orientação contra a avalanche de modernização que era tomada a sociedade norte-americana. Essa ebulição não era só uma tendência de modernização tecnológica, mas também era modernização dos costumes. O liberalismo e a liberdade das opiniões contrastava fundamentalmente com a seguridade que a fé cristã sempre oferecia. A tese básica dos fundamentalistas, no âmbito religioso, é afirmar que a Bíblia é o fundamento básico da fé cristã. Cada palavra das Escrituras, cada sílaba, cada vírgula é inspirada por Deus, e como Deus é inerrante, então tudo na Bíblia é inerrante, a Bíblia não pode conter erros por que tem Deus como seu autor. Por isso deve se tomar tudo “ao pé da letra”. Ainda hoje, especialmente, no Sul dos Estados Unidos, o ensino religioso pode nas aulas de Biologia e História apresentar o mais alto Evolucionismo, mas nas aula de religião se segue estrito fundamentalismo, isto é, que Deus criou o mundo em seis dias; que o ser humano é feito de barro mesmo; que Eva é tirada de uma costela física de Adão. Essa atitude se opõe a toda interpretação contemporânea a qual parte de um pressuposto válido que estes textos bíblicos estão distantes de nós de 2000-3000 anos e como não podemos engessar a história temos que interpretar esses textos para manter a sua mensagem no hoje de nossa história e para resgatar sua mensagem numa linguagem originalmente não mais compreensiva para os dias atuais. Mas tudo isso é considerado pelos fundamentalistas obra de Satanás. A Bíblia não precisa ser interpretada, ela é Palavra de Deus e Deus tem o Espírito Santo que ilumina as pessoas para compreenderem os textos. Dessa forma, se opõem fundamentalmente aos avanços da Biologia, da História e das demais ciências. Até em questões geográficas a Bíblia tem razão, quando na verdade as verificações históricas mostram que muitos lugares citados em textos sagrados mudaram. Logicamente nem todos os protestantes são fundamentalistas. Sabem interpretar a Bíblia e torná-la contemporânea dentro dos métodos histórico-críticos que fazemos com todos os textos antigos. E a Bíblia é um texto como outros textos antigos. Devemos continuamente interpretá-la em função das demandas de nossa história.   As Sagradas Escrituras devem ser interpretadas a partir de Jesus Cristo. Os bispos reunidos na grande assembleia do Concilio Vaticano II (1962-1964) disseram que nem tudo na Bíblia deve ser considerado verdade histórica. Ela é inerrante com referência às verdades importantes para a nossa Salvação. Bíblia não tem a pretensão de ser tratado de Geografia, História ou Biologia. Portanto, hoje evitamos a identificação da Bíblia como Palavra de Deus, mas na Bíblia se contém a Palavra de Deus. Bíblia é Palavra. E como Palavra é palavra como as demais palavras que deve ser analisada na gramática e no dicionário. Não existe um dicionário divino nem uma gramática divina. Devemos adentrar em seus mais diversos significados e extrair dela sua mensagem. Dessa forma, superando uma visão literalista e fundamentalista.

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