HENRIQUE NUNES

Bebemos todos da mesma água

Henrique Nunes
15/02/2013 às 15:11.
Atualizado em 26/04/2022 às 04:29

A bomba explode quase sempre nos dias de paz. Quando enfim encontramos a estabilidade, traçamos um esquema aparentemente infalível, o alicerce sucumbe diante de uma traição inesperada. Como se o vilão da vez estivesse na espreita apenas esperando o nosso cochilo para apertar o botão da discórdia e mandar para os ares tudo que construímos sem alarde, apenas apostando em dias melhores. E a lição que fica é exemplar: somos traídos por acreditar demais.

E o pior é que, mais uma vez, fica impossível contrariar o que mestre Nelson Rodrigues carregava como lápide: “Não se faz futebol apenas com bons sentimentos. Às vezes é a falta de caráter que decide uma partida”. Troque o futebol por qualquer outro tema e a lição será inevitavelmente a mesma.

A vítima reluta em acusar o golpe porque jamais esperava que fulano ou beltrano seria capaz de tamanho desvio de percurso. E nem sempre o julgamento do que é certo ou errado, que não raro se apropria de conceitos morais defasados e pouco eficientes na prática, servirá para justificar o que acabou de acontecer. Barcos foi traído pelo Palmeiras ou vice-versa? Ronaldinho traiu quem lhe matou a sede ou simplesmente foi “esperto” “malandro”? Não há resposta correta.

Uma mulher que trai o namorado durante meses e em seguida pede o mesmo em casamento está errada ou apenas confirmou o desejo alimentado de antemão? Quem tem o direito de julgar é somente a “vítima”: como não sabe de nada, a vida continua do mesmo jeito. Mas caso soubesse, perdoaria para viver em paz ao lado de alguém que lhe escondeu tamanho fato?

Difícil dizer. Por isso é melhor nunca saber de nada. Porque a verdade dói, destrói e quem decide ser sincero paga um preço alto por isso. Quando Pato chegou ao Corinthians ouviu de um torcedor. “Não precisa nem comemorar gol contra o Internacional nem dizer que é corintiano desde criança. A gente quer que você apenas jogue com raça”.

É isso. Ninguém quer a verdade nua e crua. Quer apenas encenar de cabeça tranquila o roteiro traçado de forma egoísta por nós mesmos. Aos que escolhemos para fazer parte desse teatro, apenas torcemos para que não desconfiem, não duvidem e não discordem do papel que lhe foi destinado. Bebemos todos da mesma água que Ronaldinho.

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