Segundo a polícia, auxiliar não foi a responsável por injetar perfluorocarbono em pacientes
Hospital Vera Cruz, em Campinas, onde aconteceram as mortes (Elcio Alves/AAN)
A Polícia Civil de Campinas esclareceu nesta sexta-feira (26) que a auxiliar de enfermagem que estava em treinamento havia dez dias no Hospital Vera Cruz, em Campinas, apenas separou e preparou por engano o perfluorocarbono no lugar do soro fisiológico. "A auxiliar em treinamento apenas preparou a substância que foi injetada na veia dos pacientes, antes da aplicação do contraste, que foi realizada por outra auxiliar de enfermagem" , esclareceu o delegado José Carlos Fernandes, que conduz o inquérito.
Nesta quinta-feira (25) em entrevista coletiva, foi informado equivocadamente que a auxiliar em treinamento teria preparado e injetado a substância nos três pacientes que morreram após passarem por exames de ressonância.
De acordo com os laudos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Instituto de Criminalística (IC) cada paciente recebeu 10 mililitros da substância química - que vinha sendo utilizada em procedimentos específicos e nunca entrava em contato com o organismo - na veia, o que provocou a formação de bolhas que causam uma série de eventos, como parada cardiorrespiratória, que levam à morte por embolia gasosa.
A investigação também concluiu que a funcionária foi induzida ao erro, uma vez que não tinha conhecimento que o produto estava na embalagem do soro, que foi reaproveitada para armazenar a substância.
A polícia também explicou que a demora na solução do caso ocorreu porque a clínica teria omitido a presença do perfluoricarbono no setor de exames. A substância só foi apreendia e passou a fazer parte da investigação no início deste mês após novas buscas feitas pela polícia.
Com o caso praticamente encerrado, o inquérito segue para um segunda fase, que deve levar mais 15 dias. "Na próxima semana vou ouvir ao menos seis pessoas e individualizar a conduta de cada profissional para chegar ao enquadramento da responsabilidade penal" , informou o delegado responsável pelo caso. A clínica poderá responder por omissão. "Houve no mínimo uma omissão da clínica em relação ao uso do produto" , completou.
A atribuição de responsabilidade no caso sairá a partir dessas oitivas. "Já sabemos inclusive que no dia das mortes a clínica contava apenas com três auxiliares de enfermagem - incluindo a que estava em treinamento - e não havia supervisão de nenhuma enfermeira chefe" , concluiu Fernandes.
A RMC reafirmou ontem que está colaborando com as investigações e que vai abrir uma investigação interna para apurar o caso. A empresa também negou omissão e disse que, na época do incidente, o laboratório foi interditado pela polícia e Vigilância e ficou à disposição.
O caso
Três pessoas, com idades entre 25 e 38 anos, morreram no dia 28 de janeiro após a realização de exames de ressonância magnética no Hospital Vera Cruz. A primeira a passar mal foi Mayra Cristina Augusto Monteiro, de 25 anos, que fez o exame e foi liberada. Mas teve de voltar para o pronto-socorro do hospital, onde morreu.
As outras vítimas, Manuel Pereira de Souza, de 38 anos, e Pedro José Ribeiro Porto Filho, de 36,
morreram logo após a realização da ressonância.
Todos realizaram o exame na cabeça e fizeram uso do contraste. Eles tiveram parada cardiorrespiratória.
Devisa desconhecia uso na clínica
A diretora do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa), Brigina Kemp, informou que desconhecia a utilização do perfluorocarbono na clínica, mesmo em procedimentos específicos. Ela disse ainda que a substância é usada em processos industriais e que não é registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Além disso, relatou que foram encontradas algumas “fragilidades como a falta de treinamento dos funcionários na realização dos trabalhos que colocavam em risco os procedimentos e inclusive o reaproveitamento de embalagens”.
Segundo Brigina, a clínica foi advertida, multada e interditada. “Ao todo, as multas giram em torno de R$ 10 mil. Entretanto, ao longo da investigação, foram apresentadas adequações e por isso decidimos por autorizar a reabertura da clínica para a realização dos exames, mas sem uso de contraste”, explicou. A diretora ressaltou que os resultados da investigação reafirmam que não há risco nos exames, mesmo com uso de contraste.
Segundo Eduardo Mello de Capitani, coordenador do Centro de Controle de Intoxicações da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o perfluorocarbono começou a ser usado pela indústria eletroeletrônica nos anos 1940.
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