Paisagens gélidas do mais ermo território dos EUA compõem uma experiência sem comparações
O exuberante cenário conta com uma abundante vida selvagem (Fábio Trindade/AAN)
Muitas pessoas sonham em conhecer cidades como Nova York, Roma, Londres e Paris. Mas, certamente, poucas um dia chegaram a pensar em visitar o maior e mais ermo território dos Estados Unidos: o Alasca. Isso seria insano, imaginam. Aliás, o que vem à sua mente quando o assunto é o Alasca? Provavelmente, frio, esquimós, iglus, neve, ursos e mais frio. Mesmo que tudo isso seja verdade, saiba que é indiscutivelmente pouco — para não dizer desrespeitoso — ao tentar definir um dos lugares mais impressionantes do mundo. Afinal, com um imponente e exuberante cenário, ladeado por geleiras do período glacial e uma abundante vida selvagem, nada se compara ao Alasca.Tudo bem, o destino pode parecer, num primeiro momento, exótico demais. Porém, ao entender um pouco mais o local, fica claro que, se há exagero, é porque tudo ali é grandioso. E, se para os brasileiros só agora a rota começou a aparecer em guias de turismo, entre os norte-americanos, as gélidas paisagens já fazem parte dos planos de férias há um bom tempo. Uma recente pesquisa do Departamento de Administração de Transportes Marítimos dos Estados Unidos revelou que, depois do Caribe, o segundo destino preferido entre as pessoas que pretendem fazer um cruzeiro marítimo é, pasmem, o Alasca. Por isso, esqueça as Ilhas Gregas, a costa da Itália e Ibiza. Chegou a hora de entrar numa fria.Sem dúvida, a melhor forma de chegar — e visitar — o estado é mesmo pelo mar. Não que seja a única. Seis grandes companhias aéreas possuem voos regulares para Anchorage, a maior cidade do estado: Alaska Airlines, Delta, Continental, American Airlines, US Airways e United Airlines. Porém, além das enormes distâncias, o maior território americano só possui oito estradas pavimentadas. A capital Juneau, por exemplo, tem acesso apenas por ar ou mar. Terra? Nem pensar.Ainda está achando que o Alasca é um lugar inóspito? Não se preocupe. Os cerca de 40 navios de luxo que navegam nessa área no Verão, transportando um terço de todos os visitantes do local, vão eliminar essa ideia rapidinho. Companhias como Royal Caribbean, Celebrity, Norwegian Cruise, Princess e Regent Seven Seas oferecem rotas entre maio e setembro, única época do ano em que o clima permite esse tipo de turismo. Lembrando que aquela história de que viajar de navio era programa típico de aposentados ficou no passado há muito tempo, tornando-se uma opção também para jovens. Com a grande oferta de navios no mundo, o preço médio da viagem caiu drasticamente e as companhias têm formado um público que prefere ver cenários naturais a monumentos históricos. Tanto que os preços de cruzeiros internacionais são, na maioria das vezes, mais em conta do que viajar pela costa do Brasil. Com R$ 3,5 mil, por exemplo, um casal consegue uma boa cabine para uma semana.Com partidas de Seattle e Whittier, nos Estados Unidos, Vancouver, no Canadá, e Seward, no próprio Alasca (percurso dispensável), em viagens de sete noites, os passageiros vão conferir a região conhecida como Inside Passage e apreciar fiordes, picos nevados e densas florestas que se estendem até onde a vista alcança. Isso sem falar na vida selvagem tão comum por lá, como águias carecas, cabras montesas e ursos negros, além de baleias humpback, golfinhos, lontras do mar, papagaios do mar e leões-marinhos.Na terra do sol da meia-noite, inusitado é pouco, e cada minuto extra de luz do dia serve para transformar a diversão em muito mais do que um bronzeado. E, em cada porto visitado, há inúmeros passeios disponíveis e totalmente diferentes, desde as óbvias escaladas de montanhas e rafting até visitas à região da Corrida do Ouro e jornadas em trenós puxados por cães. Mas, entre todos, os passeios de helicópteros que levam turistas para o topo das geleiras tornam, sem dúvida, essa viagem uma das melhores experiências que você jamais poderia imaginar ter um dia. Foto: Fábio Trindade/AAN A bucólica Skagway, onde vivem cerca de duas mil pessoas no Verão e 800 no Inverno ESCOLHA O MELHOR ROTEIROIr ao Alasca requer muito mais do que um transporte – no caso, o cruzeiro. Para conhecer realmente as belezas selvagens desse estado, é preciso passar por uma difícil missão: escolher uma (ou no máximo duas, dependendo da cidade) excursão numa lista enorme e variada e, assim, conseguir aproveitar o porto da vez. As cidades navegadas são todas interessantes, mas normalmente minúsculas, portanto, precisam de pouco tempo para serem exploradas. Mais do que isso, todas as atividades interessantes são distantes ou de difícil acesso. Dessa forma, as excursões se fazem necessárias. E mais um detalhe importantíssimo: elas são caras. Mas, ir ao Alasca e não comprar passeios é como não ir, por isso, conte com gastos extras que, adianto, podem dobrar o custo da viagem. Justamente pelo cruzeiro só ficar interessante com excursões, muitas delas esgotam-se antes mesmo do navio zarpar. Portanto, planeje-se.RoteiroA rota dos cruzeiros são praticamente todas iguais. A única mudança no itinerário acontece entre os round trip (começam e terminam no mesmo porto), normalmente saindo de Seattle ou Vancouver, e os one way (roteiros Sul e Norte). A viagem bate-volta é uma opção para quem deseja economizar, visto que o turista terá uma passagem aérea a menos para comprar e os voos de Anchorage não são baratos. Porém, consequentemente, os lugares visitados diminuem e há mais dias de navegação no percurso. Como praticamente todos os cruzeiros são de sete noites, compensa guardar um pouco mais e aproveitar a viagem da melhor forma possível. Até porque as cidades e excursões são muito diferentes e nenhum lugar é igual ao outro. Cidade das chuvasKetchikan, a cidade mais ao Sul do Alasca, a Capital Mundial do Salmão, é a primeira parada da maioria dos cruzeiros que visitam a região. Como o roteiro escolhido aqui partiu de Vancouver, a Rain City, como também é conhecida por causa da média de 300 dias de chuva por ano — sim, é isso mesmo —, marca por ser o primeiro contato real com o estado. Para a minha alegria (e sorte), peguei em Ketchikan um dos 65 dias do ano de sol. No caso, ele ainda estava forte e brilhante, deixando a cidade linda e com temperaturas bem agradáveis.O município, basicamente, oferece lojas de suvenires e joalherias, portanto, procure agendar uma excursão bem cedo. Ketchikan é o ponto de partida para o monumento nacional dos Misty Fjords. De barco, os passeios duram entre quatro e cinco horas, mas os hidroaviões também são populares. No caminho, veja ninhos de águias carecas — mais uma vez a sorte ajudou, já que a proprietária do ninho observado estava em casa —, uma imensa rocha vulcânica que emerge do mar, penhascos de três mil metros de altura, cachoeiras e muito mais, sempre com um guia explicando a histórias dos fiordes.AdrenalinaO pequeno porto de Icy Strait Point oferece vistas incríveis do próprio navio parado no meio do mar em meio a picos nevados que enchem os olhos, já que ele fica ancorado longe da cidade e barcos menores transportam os passeios entre a embarcação e a cidadezinha. Portanto, tire fotos também do cruzeiro.Mas é aqui, por incrível que pareça, que se encontra a maior tirolesa do mundo, com 1,6 mil metros de extensão e 400 metros de altura, um “brinquedo” no qual o participante chega a alcançar 100 km/h em um minuto e meio de pura adrenalina. A princípio, a tirolesa realmente assusta, principalmente pela altura, mas garanto: é apenas impressão. Pessoas de todas as idades se divertem nessa inusitada descida. A viagem é suave e conseguimos apreciar a bela paisagem local. Velho OesteDuas mil pessoas vivem na bucólica Skagway, a cidade mais encantadora do roteiro. Esse número representa os moradores no Verão, durante a temporada de cruzeiros, pois, a partir de outubro, apenas 800 corajosos enfrentam o pesado inverno do Alasca, que vai até final de março. Os demais moradores se mudam temporariamente para outros estados, como o Havaí. A vila tem duas ruas, mas o clima que o turista encontra lá é o melhor possível. Isso graças ao passado de Skagway, que viveu e respira até hoje os tempos da Corrida do Ouro. O passeio imperdível na cidade é o famoso tour no trem panorâmico da região, o White Pass & Yukon Route. São 176 quilômetros de paisagens cenográficas, que se transformam a cada curva, literalmente. Os belos cenários vão de geleiras derretendo, rios cristalinos e montanhas, até pontes que parecem ter saído de filmes do Velho Oeste, cachoeiras e muito verde. A fronteira entre o Canadá e Estados Unidos é cruzada mais de uma vez, portanto, leve o passaporte.Na volta, viste o Red Onion Saloon, bar que preserva a época áurea da cidade, com direito a atendentes vestidas como prostitutas de época. É um barato. Última paradaSeward é onde todos os cruzeiros one way terminam. É a cidade mais próxima de Anchorage. O caminho entre elas, que pode ser feito de trem ou ônibus, é exuberante. Bom, isso não quer dizer, porém, que o passeio acabou. Visite o encantador Alaska SeaLife Center e programe o dia para visitar o Parque Nacional dos Kenai Fjords e encontrar mais vida animal. Fique de olho nos papagaios do mar. E aproveite para degustar o King Crab, um caranguejo gigante que, fora do Alasca, custa uma fortuna. VISTA AÉREA É IMPERDÍVELDizem que a melhor forma de se conhecer o Alasca é por cima. Saiba que a afirmativa é verdadeira. Mas é fácil entender o porquê. O estado, como todos sabem, é famoso principalmente por suas geleiras e, certamente, você não vai querer deixar a região sem conhecer uma delas. As geleiras podem apresentar extensões e espessuras de quilômetros e são inabitáveis, mesmo assim, é possível vê-las de perto e, mais do que isso, o turista tem a oportunidade de caminhar sobre uma delas. Experiência é ímpar e emocionante.Obviamente, a única forma de conseguir isso é contratando um passeio de helicóptero. Os próprios navios oferecem inúmeras excursões com esse meio de transporte para geleiras, mas é possível reservar com empresas diretamente na cidade. Neste caso, a escolhida foi a Era Helicopters, mas agende pelo site com antecedência.Sugiro fazer o passeio na capital do Alasca, Juneau, por alguns motivos. Primeiro, porque é a cidade que o cruzeiro fica mais tempo ancorado – cerca de 12 horas. Como os pacotes de helicópteros duram em média duas horas, sobra muito tempo para fazer outros passeios. Além disso, por ser uma cidade “grande”, a oferta é maior e os preços caem um pouco, ainda assim, mas continuam sendo salgados. A volta mais simples, que inclui translado entre a empresa e o porto, além de voo de 40 minutos e caminhada pela geleira de meia hora, sai para o casal por cerca de R$ 1,3 mil. Se quiser incluir um passeio de trenó puxado por huskies na geleira, considere esse mesmo valor, mas por pessoa.É caro, mas vale cada centavo. Sem qualquer dúvida, é o ponto alto de toda a viagem. Afinal, não é todo dia que podemos apreciar aquela imensidão sem fim de um cativante azul misturado com branco, pousar no meio do gelo como se você fizesse parte de um documentário do 'Discovery Channel' e caminhar por tudo aquilo, deparar-se com fendas que formam enormes cachoeiras glaciais no meio do nada e ainda provar da mais pura água. É tão impressionante que é preciso segurar a emoção diante de tudo isso. Foto: Fábio Trindade/AAN O encontro com as baleias em alto-mar é garantido ]BaleiasComo o tempo na capital Juneau é grande, após fazer o tour de helicóptero, uma boa pedida é a excursão de observação de baleias.O encontro com os enormes mamíferos em alto-mar é 100% garantido, ou você terá o seu dinheiro de volta. Elas estão sempre lá, para se alimentar, e pelo menos um vislumbre da cauda vai acontecer. Em alguns casos, quando a sorte está ao seu lado, raros momentos podem surgir diante dos seus olhos, como aconteceu comigo: uma baleia Humpback de mais de 30 toneladas saltar com quase todo o corpo para fora d’água a poucos metros de distância – mais de uma vez. É inacreditável. Mas os guias avisaram que isso quase não acontece. As excursões ainda contemplam visitas a Mendenhall Glacier, a mais famosa do Alasca. Nela, é possível chegar bem próximo a pé e ver pequenos icebergs descolarem-se e ganharem o mar aberto. GELEIRAS QUE SE DESPRENDEM SÃO ATRAÇÃO Não há nada mais eletrizante do que assistir — bem de perto — a um enorme e maciço pedaço de gelo vir em sua direção como se fosse abraçar o navio. Tão excitante quanto ouvir o estrondo feito por placas que se soltam desse gelo e despencam na água. É uma experiência única, definitivamente. Encontrar-se com a Geleira Hubbard, um dos glaciares mais ativos no Alasca, do próprio cruzeiro, impressiona. São poucos os roteiros que incluem uma visita ao local, por isso, os turistas mais atentos que separam um dia de navegação para ver essa imensa maravilha natural ganham pontos preciosos. São quase 3,5 mil quilômetros quadrados de gelo azul translúcido, por isso , para contemplar todos os passageiros, indiferentemente do lugar que estiverem, ao chegar em frente à geleira,o navio fica girando em 180 graus, oferecendo ótimas vistas. Mas prepare-se, pois o frio nas áreas externas, principalmente quando o navio está se aproximando da geleira, é cortante. Apesar disso, para compensar, depois, com a movimentação bem mais suave, o tempo volta a ficar agradável e é quase impossível tirar os olhos daquele paredão de proporções impressionantes e beleza estonteante.