Internacional

Em debate, Macron pressiona Le Pen por relação de 'dependência' com Putin

Estadão Conteúdo
20/04/2022 às 19:29.
Atualizado em 20/04/2022 às 19:34

O presidente francês, Emmanuel Macron, de centro, e sua opositora de extrema direita, Marine Le Pen, trocaram farpas e acusações nesta quarta-feira, 20, em debate às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais francesas. Em uma discussão acirrada, Macron acusou Le Pen de depender da Rússia e de Putin; a candidata do Reagrupamento Nacional, por sua vez, disse que o presidente centrista fez os franceses "sofrerem".

Le Pen começou o debate defendendo sua proposta de baixar o IVA "perenemente" de 20% para 5,5% em todas as fontes de energia, afirmando que esta medida, junto a outras, poderá aumentar o rendimento líquido das famílias em 150 a 200 euros. A líder de extrema direita prometeu compensar a diminuição dos rendimentos nos cofres públicos, que estimou em cerca de 12 milhões de euros, com um corte nas despesas desnecessárias.

"Quero devolver o dinheiro aos franceses", disse Le Pen, criticando o histórico de Macron no cargo, dizendo que nos últimos cinco anos viu os cidadãos do país "sofrerem". "Gostaria de dizer a eles que outra escolha é possível. Eu serei a presidente do custo de vida".

Macron defendeu as medidas já tomadas pelo seu governo para bloquear os preços do gás e da eletricidade, afirmando que o corte do IVA promoveria o consumo de "energia fóssil que deve ser importada". Macron também questionou a sustentabilidade de uma queda tão acentuada do IVA e afirmou que suas propostas são "duas vezes mais eficazes" do que as prometidas por Le Pen.

Com o desemprego em baixa em 13 anos, Macron disse estar orgulhoso da criação de empregos durante seu mandato e acrescentou: "a melhor maneira de ganhar poder de compra é combater o desemprego".

A linha de ataque inicial mais forte de Macron contra sua rival de extrema-direita, no entanto, foi a relação de Le Pen com a Rússia, o que inclui uma admiração publicamente manifestada pelo presidente russo, Vladimir Putin, um empréstimo para a campanha de 2017 contratado por meio de um banco russo e o reconhecimento da anexação da Crimeia.

"Você depende do poder da Rússia, você depende de Putin. Você fez um empréstimo de um banco russo", disse Macron a sua oponente. "Muitas de suas escolhas podem ser explicadas por essa dependência", disse ele, acrescentando: "você fez uma escolha que a restringiu politicamente".

Em uma discussão acalorada, durante a qual Macron em um ponto disse a Le Pen "Você está brincando comigo?", Le Pen rejeitou as acusações, dizendo: "Sou uma mulher completamente livre e independente".

Macron também acusou Le Pen de não admitir sua intenção de tirar a França da zona do euro. O centrista afirmou que, como há cinco anos, o projeto de Le Pen culminaria na saída da França da União Europeia. "Reitero minha confiança na Europa e no eixo franco-alemão, que permitirá avançar na soberania europeia contra outras superportências", disse Macron. "A soberania europeia não existe porque não há cidadania europeia", disse Le Pen. "Você quer substituir a soberania francesa pela soberania europeia e é por isso que você coloca a bandeira europeia sob o Arco do Triunfo".

A candidata de extrema direita insistiu em sua ideia de reformar "profundamente" a UE para transformá-la em uma aliança de nações e acusou a Comissão Europeia de interferir nas decisões nacionais de seus membros.

Bandeiras

Le Pen aproveitou o fim do debate para levantar bandeiras clássicas de seu partido, como crime e imigração. "Estamos enfrentando a barbárie, um verdadeiro sauvagement. Estamos cercados de insegurança em nossas cidades, no campo, no transporte público", disse a candidata de extrema direita, relacionando o cenário à imigração. "Devemos lidar com o problema da imigração maciça e desregulada, que agrava a insegurança em nosso país."

A proibição de uso do véu muçulmano, antiga bandeira de Le Pen, também entrou em discussão. Macron afirmou que uma medida neste sentido provocaria uma "guerra civil". Le Pen classificou as palavras de Macron como "extremamente sérias". "Não sou a favor da proibição de símbolos religiosos em público. O secularismo é uma liberdade", disse o centrista. "Quantos policiais estariam correndo atrás de véus, quipás e outros símbolos religiosos?", questionou. "Tantos quanto aqueles que correram atrás de pessoas que não usavam máscaras (contra a covid-19) ", rebateu Le Pen.

Visões opostas

A eleição apresenta aos eleitores duas visões opostas da França: Macron oferece uma plataforma pró-europeia e liberal, enquanto o manifesto nacionalista de Le Pen se baseia em profundo euroceticismo.

O debate foi marcado por tensão. "Pare de misturar tudo", Macron disse a Le Pen durante uma discussão sobre a dívida da França. "Não me dê sermão", respondeu Le Pen. "Você está brincando comigo?" também surgiu pelo menos duas vezes.

Para Le Pen, que está atrás de Macron nas pesquisas eleitorais, o confronto foi uma chance de persuadir os eleitores de que ela tem capacidade para ser presidente e não há motivos para temer a extrema direita no poder. O desempenho de Le Pen foi negativo na última vez que os dois candidatos se enfrentaram em um debate, em 2017, ocasião que cimentou o favoritismo de Macron à época.

Mas pesquisas mais recentes indicam um crescimento nas intenções de voto da candidata, de 33,9%, em 2017, para um patamar entre 44,5 e 47% nessas eleições.

Macron não é mais um disruptor da política externa e agora tem um histórico a ser julgado pelos eleitores franceses. Enquanto isso, Le Pen conseguiu maior adesão entre os eleitores tradicionais e trabalhou duro para suavizar sua imagem. "Ele não é mais o mesmo oponente. Ele agora passou cinco anos no poder, o que não foi o caso da última vez", disse Le Pen antes do debate.

Depois que mais da metade do eleitorado votou em candidatos de extrema direita ou de extrema esquerda no primeiro turno, a liderança de Macron nas pesquisas de opinião é muito menor do que há cinco anos, quando ele venceu Le Pen com 66,1% dos votos. Pesquisas projetam 55,5-56,5% desta vez.

Cerca de 14% dos eleitores estão esperando o debate para decidir em quem votar, mostrou uma pesquisa da OpinionWay-Kea Partners para o jornal Les Echos.

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