MOBILIDADE

Acessibilidade em viagens aéreas está longe do ideal

Para passageiros com deficiências, companhias e aeroportos precisam melhorar serviços

Vilma Gasques
01/04/2013 às 11:59.
Atualizado em 25/04/2022 às 22:25
Emmanuelle Alkimin, secretária de Deficiência e Mobilidade Reduzida: diálogo com Viracopos (Dominique Torquato/AAN)

Emmanuelle Alkimin, secretária de Deficiência e Mobilidade Reduzida: diálogo com Viracopos (Dominique Torquato/AAN)

Quando pensamos em acessibilidade, logo nos vem à mente elementos como uma rampa ou calçadas rebaixadas para cadeirantes. Porém, o universo de possibilidades para melhorar a qualidade do que é acessível é quase infinito para tornar a utilização de certos locais e equipamentos, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços e mobiliários urbanos, inclusive dos serviços de transporte. Em resumo, é um direito de todos, e para todos. Acontece que algumas pessoas dependem desse direito mais do que outras.

Viajar de avião parece simples, mas para quem não enxerga, fala ou escuta, uma viagem pode ser muito mais difícil. Há uma legislação própria para esses casos. A resolução 009 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), de 5 de junho de 2007, determina, entre outras coisas, que os aeroportos estejam sinalizados com o símbolo internacional de acesso, livres de obstáculos, e que reservem 2% das vagas de estacionamento — próximas a entradas principais ou elevador — para pessoas com dificuldade de locomoção. Informações para passageiros com deficiência visual têm de ser prestadas em Braille; para passageiros com deficiência auditiva, em Libras. Os terminais também devem ter telefones para surdos. Passageiros que usam transplante coclear não podem passar por detector de metais.

No Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, a concessionária Aeroportos Brasil, que administra o terminal, informa que os banheiros estão adaptados para o acesso de pessoas com deficiência, as guias estão rebaixadas nas vias de acesso ao terminal de passageiros e dos bolsões de estacionamento; há ponto de embarque e desembarque para pessoas com deficiência; 140 vagas reservadas próximas aos acessos do terminal; piso tátil; balcões de check-in rebaixados; telefones para deficientes auditivos; elevadores e canais de inspeção especiais para quem não pode passar no detector de metais.

A empresa informa ainda que Viracopos recebeu no início do ano o secretário de Estado Adjunto dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Marco Antônio Pellegrini, e do diretor técnico da Coordenadoria de Acessibilidade do Estado de São Paulo, Roque Duarte Cruz. Os executivos foram recebidos pelo diretor-presidente da concessionária, Luiz Alberto Küster.

Companhias

As companhias aéreas garantem que atendem as determinações para o melhor atendimento a todos os passageiros. Pela legislação, elas devem acomodar os deficientes visuais acompanhados de cão-guia, a ser transportado sem custo adicional, com apresentação da carteira de vacinação atualizada.

As empresas disponibilizam profissionais para acompanhamento de deficientes visuais ou auditivos. De acordo com as empresas, a assistência é feita no embarque e no desembarque.

As companhias informam que o passageiro, quando estiver efetuando a compra do bilhete, pode solicitar a assistência. Já o deficiente auditivo também pode requisitar o auxílio para ser atendido de forma ideal. O cão-guia, quando necessário ao passageiro, é transportado junto com seu dono, dentro da cabine da aeronave, com assento preferencial.

Falta muito 

Apesar dos avanços conferidos aos aeroportos e pelas companhias aéreas, quem não enxerga, não ouve ou fala ainda enfrenta dificuldades quando viaja de avião. A advogada e secretária municipal de Deficiência e Mobilidade Reduzida Campinas Emmanuelle Alkimin, que é deficiente visual, diz que hoje em dia os aeroportos estão muito eficientes no atendimento à pessoa deficiente e as companhias disponibilizam um profissional para acompanhar o cliente desde o check-in até a sala de embarque. O problema é que isso deixa o passageiro sem autonomia e liberdade de escolhas. “Existe uma presteza, uma disponibilidade das empresas em acompanhar o embarque e desembarque, que não leva em conta a autonomia da pessoa que deseja se virar sozinha. O profissional recebe o passageiro deficiente no check-in e leva para a sala de embarque, onde ele tem que ficar esperando a chamada, sem poder sair desse lugar. O que falta nos aeroportos é uma maquete em Braile, uma lista de restaurantes e lojas para que o deficiente visual possa transitar pelo aeroporto enquanto espera o voo, como os outros passageiros”, define.

É claro que se deve levar em consideração a segurança dos passageiros. E Emmanuelle sabe que isso não pode ser negligenciado. "Viracopos, por exemplo, o embarque é na pista e o deficiente visual não pode ir sozinho. E as pessoas que não ouvem não contam com o alfabeto em libras nos painéis. A comunicação é em português ou inglês", reclama.

Como secretária de Deficiência e Mobilidade Reduzida, Emmanuelle diz que já iniciou um diálogo com os representantes da Aeroportos Brasil, concessionária de Viracopos, para apresentar o conceito de acessibilidade que vai além da segurança dos passageiros.

A psicóloga Fabiana Bonilha, que também é deficiente visual, diz que a oferta de assistência dada pelas empresas tem aumentado. “Minhas últimas experiência mostram que a preocupação é maior em ter um funcionário para acompanhar o passageiro com deficiência. Eu viajo bastante e percebo essa evolução. Porém, ainda falta treinamento para esses funcionários em relação à atitude”, reclama, explicando que um dos exemplos clássicos da falta de treinamento é que nos casos em que está com um acompanhante, os funcionários se dirigem ao acompanhante, e não a ela. “Quando precisam perguntar alguma coisa, como as opções desejadas no cardápio podem perguntar diretamente para mim. Não precisa perguntar para meu acompanhante para que ele me pergunte”, orienta.

Fabiana também lembra que o principal é que o deficiente visual tenha autonomia para fazer a viagem, mesmo quando está sem acompanhante.

Direitos

A coordenadora técnica da Pró-Visão, Maria Cristina Von Zuben de Arruda Camargo diz que a mobilidade se constitui num dos direitos fundamentais de todo ser humano e que no Brasil trata-se do Direito Constitucional de ir e vir de todo cidadão, sem discriminação. “A cegueira não pode ser um presídio. As pessoas com deficiência visual têm, como toda pessoa, o direito à locomoção independente. Especificamente, às viagens aéreas são as que apresentam menores dificuldades”, ressalta.

Ela diz que as empresas aéreas, quando informadas no processo de compra da passagem, de que se trata de um passageiro com deficiência visual, já emitem uma passagem diferenciada e oferecem ao passageiro um funcionário que o acompanha por todo o aeroporto e entra com ele na aeronave para localizar sua poltrona. O mesmo ocorre no aeroporto de destino.

Porém, ela também compartilha a ideia de que é preciso avançar com ações inclusivas nos edifícios dos aeroportos de maneira que a pessoa com cegueira possa se manter orientado ainda que sendo guiado por outra pessoa. “Faltam pisos táteis, elevadores inclusivos com voz, maquete tátil e informação em Braile sobre os recursos disponíveis no aeroporto”, observa.

Além dos prédios, Maria Cristina diz que é preciso abrir as aeronaves para visita e reconhecimento de pessoas com cegueira, o que é fundamental para sua orientação quando estiver em viagem aérea, além de manter os profissionais do aeroporto atualizados com treinamentos periódicos. “É necessário lembrar que os eventos internacionais que virão para o Brasil, inclusive a Paralimpíada, exigem atuação rápida no que diz respeito a ações inclusivas dos aeroportos”, destaca.

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