ZEZA AMARAL

A vergonha republicana

21/11/2013 às 05:00.
Atualizado em 24/04/2022 às 23:10

As ruas da cidade estão silenciosas. Os homens das praças estão silenciosos. Há um desânimo completo nos rostos dos homens que se movem em almas répteis, à altura de suas cloacas. Tudo é vagar e conformista. Ninguém quer saber de nada e a dúvida já não é produto de fácil consumo. As drogas se abundam nas portas das escolas e antros suburbanos. Bebe-se nos bares e lares. A moda jovem das mocinhas se confunde entre ser, estar ou parecer garota de programa. Daslu ou Daspu, não importa. Ser sem nunca ter sido é muito mais importante. E quem se importa com a vida de quem tem sido sem nunca ter sido ser? Dá grana? Vai em frente, meu. Consciência só pesa no travesseiro dos poetas e otários de sempre.A cidade não é tão grande assim, mas os amigos estão rareando no bar da esquina. Pior, estão morrendo sem que a gente seja avisado. Parece que a morte não determina mais as nossas ações mais prosaicas. Morreu? Reza, enterra e a vida segue. Que vida? Que morte? Ninguém mais quer saber de pensar na morte, nas honras finais que os vermes oferecem aos corpos. As catedrais e os templos de todas as crenças oferecem há séculos um destino bem-aventurado aos puros de coração, ou seja lá o que isso queira dizer. Mas para isso é preciso, antes de tudo, morrer.O homem que ganhava algum dinheiro reservando lugar na fila do INSS parecia não querer morrer. Mas os seus olhos enxergavam apenas as pedras portuguesas encardidas da calçada. A bela e imponente igreja à sua frente não lhe comovia nem um pouco; e nem a igreja se importava com ele. A igreja sempre foi a casa da Morte, do conforto do Paraíso. E também da vida espiritual na Terra. Mas o homem da fila era o homem da fila. E assim nada fazia sentido na avançada hora da madrugada da fila que nascia atrás da igreja, agora desfeita porque a política do momento trocou a fila da calçada por horas de assento em novas instalações, longe dos olhos da cidade.A cidade está silenciosa. Carros e lotações roncam pelas avenidas e é tudo que podem e fazem rotineiramente. Comensais entram e saem dos restaurantes aparentemente satisfeitos com o silêncio de seus estômagos. Em grupos, ou em casais, conversam baixo e aguardam bovinamente que algum valete lhes traga o carro ou um táxi.As casas lotéricas, durante o dia, já acolheram serpentárias filas de homens em sonhos de trocar o carro, comprar uma casa na praia, fazer uma plástica, ou qualquer outra coisa que não lhes venha a causar uma dúvida que seja. Alguém viu o Paulo Maluf passar pelo centro, em campanha para deputado? Naquele dia eu o vi falando alto e gesticulando falsos argumentos. E o povo seguia andando, em silêncio. Triste e conivente com tudo aquilo.Genoíno e Zé Dirceu ergueram seus braços esquerdos e com o punho cerrado tentaram mostrar que eram presos políticos. Vi a foto nos jornais e conclui que não passavam de políticos presos, de uns vigaristas da democracia, de bandidos que roubaram dinheiro público que bem poderia servir para construir escolas, hospitais e abastecer as farmácias públicas.Vi, também, a foto dos filhos e da mulher do Genoíno, todos com o semblante pesado e triste de ver o patriarca sendo levado preso. A cidade pergunta se a saúde do Genoíno era melhor ou pior quando assinou ofícios que o incriminaram no mensalão. Se rico ou pobre não interessa. O fato é que ele participou de um plano para desestabilizar o jogo democrático para, enfim, manter o PT no comando central da Nação. Calhordas pobres ou ricos também envelhecem, e isso é fato. E não me regozijo com nada disso. Antes, me entristece que alguns poucos roubem nossos sonhos republicanos para exercerem suas taras comunistas, trocar a nossa democrática individualidade pelo fascismo do coletivo.O Brasil segue mais uma noite de agonia republicana. E quem tem de trabalhar para produzir os impostos somos nós, as verdadeiras almas e vítimas do mensalão petista. E justiça feita não merece comemoração; antes, uma vergonha republicana: punir agentes públicos credenciados para cuidar dos interesses da Nação.Bom dia.

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