Sessão de Cinema

A Travessia

Seria inevitável rever no cinema as torres gêmeas de Nova York ainda intactas e não sentir o peso do desaparecimento delas em A Travessia ...

João Nunes
08/10/2015 às 09:15.
Atualizado em 23/04/2022 às 04:07
A Travessia (João Nunes)

A Travessia (João Nunes)

Seria inevitável rever no cinema as torres gêmeas de Nova York ainda intactas e não sentir o peso do desaparecimento delas em A Travessia (The Walk, EUA, 2015), de Robert Zemeckis, assim como seria inevitável que o filme não mencionasse a terrível tragédia de 2001 – também de uma forma nostálgica, mas sutil e com um toque de ternura.

“Você deu vida a elas”, comenta Annie (Charlotte Le Bon) ao namorado Philippe Petit (o ótimo Joseph Gordon-Levitt) ao final, como se dissesse: elas não existem mais, porém, permanecem vivas no inconsciente coletivo do mundo inteiro.

O filme se traduz de duas maneiras: o relato real da façanha de um francês obsessivo, que no dia 6 de agosto de 1974 cruzou num cabo de aço o imenso vazio entre as torres do World Trade Center (glória francesa), e o orgulho americano de ter sido o objeto dessa ingênua obsessão e que anos depois foi alvo de uma tragédia que o país soube superar – o novo prédio edificado no mesmo lugar é o maior indício dessa superação.

Visto pelo olhar americano, o feito de Philippe Petit é grandioso, mas as famosas torres, que se tornaram símbolo contra o terrorismo, ganha destaque. O filme é sobre Philippe, mas também sobre as torres. Afinal, no roteiro do próprio diretor, o performer e artista (como ele se intitula) tem na tal travessia o alvo principal da vida dele.

A caraterística mais interessante da estrutura narrativa de Zemeckis foi eliminar o off e fazer do próprio personagem o contador da história. A partir da estátua da liberdade – outro ícone americano que só reforça a importância das antigas torres no filme – Joseph Gordon-Levitt (no papel do protagonista) nos conta a história.

Uma história de obsessão, mas também de superação – outro paralelo com o espírito americano. Philippe tem a noção exata do que deseja e, para isso, se prepara desde garoto, aprende inglês e se acostuma a fugir da polícia por conta dos shows de equilibrista feitos nas ruas de Paris.

Na arriscada empreitada, ele terá mesmo de saber como lidar com policiais e seguranças, pois para chegar ao objetivo irá driblá-los constantemente. Afinal, a ação do francês foi engendrada e materializada de forma ilegal. Ele e a desastrada equipe não tinham autorização para entrar no edifício.

Quem viu o documentário James Marsh (2008), ganhador do Oscar da categoria em 2009, conhece bem a história e pode não ter muito interesse na narrativa, até porque Marsh encenou muitos dos eventos que veremos transformados em ficção no filme de Zemeckis.

Estão nos dois os relatos da formação de Philippe, o encontro com os diversos cúmplices da aventura, uma trupe nada confiável, mas que dá conta do recado, os obstáculos que surgem para impedir de alcançar o objetivo e a determinação do protagonista.

O filme mistura drama, ação, aventura e suspense. Sabemos a história de antemão, conhecemos o personagem, acompanhamos a trajetória dele e o desfecho – está tudo em O Equilibrista. Então, de onde vem a atração de A Travessia?

Primeiro, da própria e excepcional história. Depois, quem viu o documentário? Pouquíssima gente. Portanto, acompanhar os eventos como um suspense é o grande atrativo – lembrando que o 3D cumpre bem o papel dele.

Com uma boa trilha de Alan Silvestri, que não se impõe sobre o filme, A Travessia cresce muito na parte final – do instante em que conseguem chegar o topo das torres até ao espetáculo que se verá. Na dúvida, assista a A Travessia e veja O Equilibrista. Eles funcionam como complementos de uma aventura inesquecível.

* Publicado no Correio Popular de Campinas em 8/10/2015

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por