Ela é neta de dois dos maiores escritores e novelistas brasileiros, Dias Gomes e Janete Clair
A roterirista carioca Renata Dias Gomes: família de famosos (Arquivo pessoal)
Com apenas 5 anos ela escreveu uma redação sobre uma viagem imaginária sem saber que ela seria escolhida pela professora e publicada no jornalzinho da escola. Quando viu seu trabalho exposto ali, já sabia que queria ser escritora. “Aprendi a ler e a escrever sozinha com 4 anos para poder contar histórias”. Neta de dois dos maiores escritores e novelistas brasileiros, Dias Gomes e Janete Clair, ícones da teledramaturgia nacional, aos 29 anos a carioca Renata Dias Gomes é uma das mais jovens e promissoras roteiristas que tem despontado no mercado.
Nos últimos anos passou pela Record e SBT e teve a chance de trabalhar com diferentes autores, como Margareth Boury, Cristianne Fridman e Tiago Santiago. Contratada pela Globo em 2012, Renata trabalhou como colaboradora da autora Ingrid Zavarezzi na temporada da novela Malhação. Em 2014, assumirá um dos maiores desafios da carreira, até o momento, colaborar na trama das 21 horas, de um dos grandes dramaturgos brasileiros: o autor Aguinaldo Silva.
Nesta entrevista exclusiva, Renata fala sobre a profissão de colaboradora, a influência dos avós e sobre os novos projetos. “Meu sonho um dia é contar as minhas próprias histórias”.
iG Paulista — Quando você nasceu, sua avó (Janete Clair) já tinha morrido, mas você teve a companhia do seu avô (Dias Gomes) até os 15 anos. Você teve algum tipo de referência profissional dele nessa época?
Renata Dias Gomes — Nossa relação era só familiar exatamente porque eu sabia que seria escritora. Eu procurei me afastar o máximo possível do lado profissional para não me influenciar. Além disso, meu avô era um cara que não misturava as estações. Tenho certeza que ele estaria ali caso eu o procurasse para falar disso, mas eu nunca procurei. Meu primeiro contato com a obra dele foi quando na oitava série meu colégio adotou O Pagador de Promessas e O Santo Inquérito. Aí fui obrigada a ler para fazer a prova. E ele foi à minha escola dar uma palestra, o que foi uma das maiores emoções da minha vida. Não sei dizer se essas decisões foram certas porque ao mesmo tempo sei que perdi a oportunidade de conhecer a fundo um escritor extraordinário, mas foi o que meu coração mandou fazer na época.
É verdade que seu pai enviava seus textos secretamente para seu avô?
Meu pai mandou alguns textos para meu avô por fax. Era um pai babão e eu me surpreendia quando atendia o telefone e ele dizia: “Renata, é o vovô. Olha, li sua poesia ou seu conto e gostei muito”. Eu devia ficar vermelha, roxa, violeta, morrendo de vergonha, mas muito feliz. O papo nunca se estendia por esse lado. Como eu falei, me afastar da obra dele para não me influenciar.
E com sua avó, como foi crescer sabendo que era neta de um símbolo da dramaturgia?
Com ela vivi uma relação diferente. Eu não a conheci e ela era um quadro na parede de casa, mas um quadro muito amado. Eram sentimentos muito loucos e contraditórios que cresciam comigo. Eu tinha dois meses e cresci escutando que ela me esperou nascer para morrer. Não sei é verdade, mas isso despertou em mim um amor gigante e idealizado por aquela mulher. Quando fiz 13 anos vários textos dela chegaram em casa e comecei a organizar. Foi um encontro incrível! A paixão só aumentou. Depois, descobri também que além de ter um excelente avô, ele era um escritor porreta! Depois que ele morreu li alguns textos e amei todos. Cheguei a questionar minha decisão de ter ficado tanto tempo longe da obra de um dos maiores dramaturgos do Brasil. Meu pai é músico e sempre foi meu maior incentivador. Não tenho o menor dom pra música, mas ele me incentivava como podia. Minha mãe era atriz, mas já há alguns anos deixou a profissão de lado por opção própria.
Seu primeiro trabalho, o curta Exílio Aqui Mesmo, de 2001, foi sua primeira experiência profissional na área?
Minha “carreira” de cineasta nunca ultrapassou os muros da faculdade. Exceto Pretérito Imperfeito (que nunca foi finalizado), os outros todos são curtas de trabalhos universitários. Apenas Exílio Aqui Mesmo alcançou um pequeno êxito e foi selecionado pra alguns festivais. Tenho vontade de fazer cinema, mas me considero virgem. Na verdade, o maior ganho dos meus roteiros escritos na faculdade veio de um curta que nunca foi filmado. Foi um texto com o qual concorri ao projeto de final de curso e não foi aprovado (talvez porque nunca fui boa de fazer projeto apesar do bom roteiro)e acabei usando pra apresentar meu trabalho ao Tiago Santiago (autor), que me levou para Record.
A sua terceira novela, 'Uma Rosa com Amor', foi sua primeira adaptação. O processo criativo fica mais restritivo?
Durante boa parte da novela as mudanças em relação ao original foram bem pequenas. Eu amei escrevê-la. Tive acesso aos originais do Vicente Sesso, que são uma verdadeira aula. Pegamos um horário que dava quatro pontos e no final da novela dava 10. Tínhamos um fã-clube fiel e o SBT vinha de uma fase sem novelas. Então acho que foi bem sucedido se a gente analisar esses pontos. Trabalhar com o Tiago (Santiago) foi uma delícia. Ele me dava bastante liberdade. Era muito generoso, trocávamos muito. Tive um outro presente: o Miguel Paiva entrou para nossa equipe e foi uma experiência incrível trabalhar com ele. No finalzinho, meu filho mais novo nasceu e eles me deram licença maternidade compulsória, mas continuei dando pitaco nas revisões dos capítulos.
'Amor e Revolução' tinha um tema forte, mas naufragou no Ibope...
Foi uma novela difícil em vários aspectos. Na produção perdemos o Sergio Madureira logo no início (ele faleceu depois no meio da novela), no texto também houve dificuldades. Mas não sei explicar porque naufragou no Ibope.
'Amor e Revolução' ousou em quebrar um grande tabu da TV brasileira, o beijo gay, mas esbarrou na proibição do beijo masculino. Por quê?
Eu não sei dizer porque o SBT proibiu porque meu trabalho não chega nessa esfera. A cena do beijo gay veio depois de uma sugestão do Miguel. Foi ele quem numa reunião sugeriu que personagem da Luciana Vendramini tentasse a da Gisele Tigre. Depois a cena veio na escaleta e acho que foi o Miguel que escreveu também. No ar achei muito bonita e bem realizada. Fico feliz de ter feito parte dessa quebra de tabu. Não vejo motivos para tanto tabu em cima do tema, já que todo mundo se beija.
Com menos de 30 anos, você já trabalhou com três autores e, em 2014, trabalhará com um dos grandes mestres da teledramaturgia brasileira, o autor Aguinaldo Silva.
Eu trabalhei com quatro autores: Margareth, Cristianne, Tiago e Ingrid Zavarezzi, além da Ana Moretzhon e do Ricardo Linhares, que supervisionaram Malhação. É muito bacana trabalhar com estilos diferentes porque vou absorvendo um pouquinho de cada um, vendo com qual me identifico, o que acho que pode funcionar quando chegar a minha vez. Fui eu que procurei o Aguinaldo. Meu contrato com a Globo estava no final porque acabava junto com a temporada da Malhação. Procurei alguns autores, foram quase todos muito receptivos, mas dos que me convidaram nenhum estava escalado pra entrar. O Aguinaldo também me respondeu e pediu que mandasse um texto para ele avaliar. Mandei um curta e um conto. Ele respondeu dizendo que tinha gostado e me chamou para a equipe. Tenho certeza que vai ser maravilhoso. Estou empolgadíssima. Sobre o estilo dos autores, gosto de assistir novelas como telespectadora. Já era noveleira antes de ser novelista, mas é inevitável notar alguns detalhes do estilo de cada um.
Como você vê o mercado brasileiro para novos roteiristas?
Conheço muita gente que chegou lá, mas nenhum da mesma forma que o outro. Não existe um caminho formal. Acho que fazer cursos é sempre bacana pra trocar experiências, conhecer pessoas do meio e principalmente para ter seu texto lido. Escrever pra teatro também é uma boa alternativa pra ter seu texto conhecido. Mas não sei apontar um caminho. Posso dizer qual foi o meu que foi através das produtoras de conteúdo até conseguir a chance na Record.
Os grandes autores da TV já dão sinais de cansaço, mas são poucos os que dividem o conhecimento e que se preocupam com essa renovação no mercado.
Eu acho que as novelas ainda vão durar muito tempo. Brasileiro gosta de novela e ela é muito rentável para a TV. Vejo a renovação acontecendo aos poucos e acho injusto falar que os autores não têm incentivado isso. Sempre vejo que o primeiro trabalho de um autor tem supervisão de alguém mais experiente. Quer incentivo maior que esse? Vários nomes surgiram nos últimos anos. Acho natural que a renovação seja lenta porque o mercado de TV é pequeno. Você tem poucas novelas produzidas por ano. Na Globo, que é a maior, umas seis novelas por ano? É pouco se você pensar na quantidade de roteirista contratado da casa! Então não acho que a renovação não seja incentivada. Acho que ela tem o volume que dá pra ter. Não sei apontar um ou dois sem ser injusta. Acho que os novos autores têm aproveitado bem suas oportunidades.