CÉLIA FARJALATT

A pena e o garfo

14/02/2013 às 05:00.
Atualizado em 26/04/2022 às 04:39

Escritores entendem de culinária? A pena (hoje diríamos o computador) e os pratos se entendem? Parece que sim. Nomes respeitáveis como os de Balzac, Chateaubriand. Rossini comprovam que a literatura e as comidas podem manter amizade estreita. Entre nós, o exemplo mais conhecido disso aparece em Guilherme de Almeida, que se confessava guloso e foi esplêndido escritor. Conseguiu aliar o pitoresco da história dos alimentos, e até de receitas, ao fascínio de um estilo literário muito atraente.Em “Comidas meu Santo”, ele traça o histórico de alimentos comuns e exóticos, em linguagem tão gostosa, que provoca água na boca. Elogiou as excelências e os horrores da cozinha antiga. Em sua viagem pela culinária brasileira começa com os colonizadores portugueses, que ao contrário do que se pensa, comiam mal. Na orgulhosa Espanha quinhentista, a mesa também era pobre.Recorrendo ao humanista Juan Luís Vives, que nasceu em Valência, no ano em que Colombo descobriu transcreve as críticas, menciona o almoço do colégio, onde estudou: um pedaço de pão e algumas frutas e um naco de carne, cerveja fraca ou um pouco de vinho. O cardápio melhorava quando os alunos iam 'a granja e se regalavam com leite, coalhado, carneiro cozido e a panelada de legumes e carnes, o famoso cozido, que chegou até nósDivulgando certas normas de civilidade à mesa, Vives retrata costumes da época. Não limpes os lábios com as mãos nem com a manga, mas com o guardanapo. Tu, que te recostas sobre a mesa, onde aprendeste isso? Cada um limpe sua faca e meta-a na bainha Não escarves com a faca; faze um palito com uma pena ou um pauzinho e palita pouco a pouco para que não sangres. Depois levanta-te e lava as mãos. Dá graças a Deus...Vieram os franceses, e logo foi a chegada de Villegaignon. E aprenderam a fazer o moqueado de caças e pescas, e até o precioso moqueado de cobras com pimenta. Em lugar do faisão europeu, cozinhavam a jacutinga, o jacu, perdizes, a rola e passarinhos diversos. Sem pão, sem vinho, não se faz um cristão, dizia-se. Mas anos depois já se plantava trigo em São Vicente, e importava-se vinho em barris, do Douro ou do Loire. Comia-se farinha de pau, prato aprendido com os índios. Foi produto salvador tanto dos colonizadores como dos índios, consistindo em pulverizar um pedaço de pau, espremer o pó, sem secá-lo ao sol. O mesmo era feito com a mandioca, da qual se faziam beijús. E havia que o milho, que o índio assava e cozia , e mais as caças e peixes, muito abundantes. Só o bacalhau vinha da Europa.Tempo do Império. Caça, pesca, legumes, e como privilégios da Coroa, a farinha, o azeite de oliva e o bacalhau e a feijoada. Esta, responsável por homéricas indigestões. Cuidam-se os estrangeiros desta iguaria e os vegetarianos também.Acompanho o requinte exagerado de certas iguarias, pensando no contraste. Enquanto alguns adoeciam e morriam pelo excesso, e padeciam de gota, já havia muitos que morriam de fome. Ainda hoje, há milhões de crianças brasileiras vivendo na pobreza? Bom examinar os documentos do Unicef e do IBGE sobre as crianças brasileiras. Examinem estes documentos e afinal concluam os resultados sobre a pobreza e a falta de boa alimentação. . Há milhares de crianças e de adolescentes em situações calamitosas. Não é que faltem possibilidades de alimentação, o que falta é vontade.

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