Há mais de cem anos foram comemorados os acordos comerciais do Brasil com o Japão, o que me faz voltar aos temas de cultura japonesa, que sempre apreciei muito. Por isso mesmo, volto hoje ao haicai, que muitos escrevem Hai-kai, deliciosa modalidade de verso, com seguidores no mundo inteiro, e que tão bem retrata as sutilezas e mistérios da alma japonesa.
Devo meu primeiro encontro com o haicai à escritora Ana Suzuki, da Academia Campinense de Letras. Ana é brasileira, casada com um engenheiro japonês, e manteve durante anos, aqui mesmo no Correio Popular, na página infantil “” O Mundo da Criança “”, a coluna Janelinha para o Japão, onde contava aspectos da vida e da cultura do país do Sol Nascente.É também autora de vários romances, como O Jardim Japonês e A Terceira Flor da Paixão.
Ela falou-me dos encontros brasileiros de Haicai, no Centro de Cultura de São Paulo, um deles dedicado à memória de Matsuo Bashô, homenageado em 1987, pela passagem dos 273 anos de seu falecimento. O haicai tem adeptos no mundo inteiro, e o nosso Guilherme de Almeida foi dos mais entusiastas.
Agora algumas amostras.
Estas são de Jorge de Olinda : “Noite sem lua / a treva engole estrelas / sobre vagalumes. “,e ainda “Verão...pássaros / breve nos fios / flauta em sol.” E também :” No giro do sol / o girassol gira”. Este é de Sílvia Meira: ” Luz prateada de noite cheia/ Reflexo de Gaivotas!”
Percebe-se que este gênero de verso,dentro de rigorosa métrica, sugere um aspecto da natureza, um flash de lirismo e de graça, sempre evocando a presença ou a passagem de uma estação do ano.
São de Ana Suzuki : “Boi de chocolate / vem pastar no meu quintal ! É noite de Natal.” “As renas galopam sobre nuvem e algodão / Ah, esta solidão”.
“Sol esbraseia / um gato busca refúgio na sombra do cão.” “ Na fria cascata / perfume de sabonete / e brilho de lata.” “O sol do Nordeste ! O menino que buscas / morreu. Não soubeste ? “ ”Haicai moreno tem tacape e tamborim.”
Finalizando, o número de sílabas é 5-7-5 e o recheio é apenas talento e emoção.