Espaço Gourmet

A mais pop da horta: Melanzane alla siciliana

Infinitas possibilidades: em casa ou no restaurante, a berinjela dá um show de popularidade e versatilidade, indo da entrada à sobremesa; há quem diga, ainda, que faz um bem danado à saúde

Chef Lauro Lucchesi
26/07/2015 às 08:00.
Atualizado em 28/04/2022 às 17:29
Berinjela (Ciéte Silvério/ Especial para Metrópole)

Berinjela (Ciéte Silvério/ Especial para Metrópole)

Não conheço fruto mais versátil do que a berinjela. Sem perder a calma e a personalidade, aceitando bem qualquer combinação, ela permite a elaboração de um número infinito de pratos e divertidas investidas na cozinha. Há algumas literaturas estranhas sobre ela. Li sei lá quando, onde e em que página que membros de uma seita naturalista a excluem do cardápio porque sua delicada flor violácea é fecundada somente à noite por insetos (óbvio) notívagos – está mais para besouros encarapuçados de negro do que para simpáticas abelhinhas, joaninhas e borboletas do bem. Como isso pouco importa, nem fui atrás para conferir se a informação procede. A fecundação à noite me parece atividade rotineira entre alguns seres vivos catalogados, em especial os humanos. Então, vamos ao que interessa. Nos últimos 40 anos, a berinjela avançou em popularidade e abocanhou espaço na mesa dos brasileiros. Foi chegando mansamente em saladas, recheadas com carne moída, fritas com pimentões, empanadas, à parmegiana. Até que hoje não existe um só restaurante que não tenha no menu entrada ou couvert com uma singela caponata nadando em bom azeite. E têm nome e sobrenome os culpados por tanta popularidade. São, principalmente, os imigrantes italianos, árabes, iranianos (antigos persas), gregos e indianos, uma galera da pesada quando o assunto é culinária regional. Mas tem mais. Em blogs de adeptos da cozinha vegetariana, a berinjela compete pau a pau na preferência com a idolatrada soja e seus derivados. Quer fazer o teste? Junte uma dúzia de vegetarianos e afins e bote em votação: soja ou berinjela? Dará segundo turno, com certeza. Com este fruto de casca fina e reluzente, oblongo e ovoide (não à toa, os norte-americanos o batizaram de egg plant, ou seja, planta ovo) é possível elaborar lasanhas (caso da grega mussaká), rechear massas ou reforçar pastas junto de tomates e manjericão, tudo salteado com alho e azeite. A berinjela também acompanha peixes e carnes, recheia tortas e cuscuz e pode ser simplesmente grelhada, com sal grosso e azeite, parceira de uma suculenta carne no churrasco. Há quem faça dela sucos, entradas e até sobremesas, recheada de nozes e frutas secas e mergulhada no chocolate. E não para por aí. Sussurra a sabedoria popular que o fruto é um santo remédio. Nada provado até hoje, mas dizem alguns pesquisadores que seu suco é um aliado feroz para eliminar quilinhos incômodos. Também já vi quem a utiliza em pó, agregada a sal marinho, para escovar os dentes e combater cáries. Há, ainda, estudos recentes que mostram que a berinjela pode reduzir em até 30% a taxa de colesterol – os técnicos suspeitam de um alcaloide com princípio ativo existente nela, mas não identificado. Alguns cientistas, porém, repelem tanta publicidade. Profissionais mais críticos da pesquisa medicinal e científica torcem o nariz para tanta fama.Natural da Índia, de onde se esparramou pelo mundo graças ao apetite dos mouros, chegou há séculos ao Oriente Médio e de lá rumou para a Europa Ocidental e para a China Imperial. Pertencente à família do jiló e do tomate, do pimentão e da pimenta, é encontrada em aproximadamente 2,5 mil variedades, como as brancas, rajadas, finas, longas, vermelhas e de tantas outras cores. É rica em vitaminas e minerais, e sua polpa flexível e macia é composta por 90% de água, o que lhe confere propriedades de um bom laxante. Entre as centenas de receitas da qual a berinjela participa, tem uma excelente à moda siciliana, do Sul da Itália, onde é bastante apreciada e leva o nome de melanzane. Ainda restrito aos cadernos familiares da ponta da bota, o prato é simples, mas sua apresentação ilustra a mesa e atrai olhares. Cai bem como entrada, como petisco em reuniões informais, junto de uma generosa tábua de frios ou de queijos e pães, ou para abrir a mesa num jantar entre amigos. Já para a cozinha! MELANZANE ALLA SICILIANA(para 6 pessoas)INGREDIENTES_3 berinjelas na flor da idade, grandes (cada unidade renderá 2 ou 3 nacos)_3 colheres (sopa) de sal grosso_6 bolotinhas de mozarela de búfala, cortadas em fatias finas_Queijo parmesão grosseiramente ralado_Orégano desidratado_Alcaparras em botões o quanto baste_Um bom e encorpado molho de tomates, bem temperadinho_Azeite de oliva o quanto baste_Pontas de manjericão fresco, recém-saído da horta_Sal e pimenta-do-reino moída na horaAO TRABALHO Corto cada berinjela em pedaços idênticos, de seis a oito centímetros cada um. Com uma faca afiada, faço uma cruz rasa nas extremidades, bem de leve. Massageio as extremidades de cada pedaço com sal grosso e permito que descansem por duas horas. Feito isso, escorro e seco as berinjelas com pano limpo ou papel toalha. Enquanto isso, preparo o refogado de tomate, tempero e reservo. Levo uma frigideira de ferro, de fundo grosso, ao fogo baixo e espero aquecer. Dou-lhe um pouco de azeite, coloco as berinjelas e, com uma pinça, vou manipulando cada pedaço: primeiro frito de um lado, depois do outro, rolo pra lá e pra cá, repito a operação várias vezes, sempre agregando azeite, até o interior estar macio. É uma operação um pouco demorada. Retiro os pedaços fritos com uma espátula, acomodo sobre papel toalha para subtrair o excesso de óleo e reservo em lugar aquecido. Repito a operação com todas as berinjelas. Com uma concha, forro o fundo de um prato com o molho de tomate, dou-lhe uma pitada de pimenta-do-reino e sobre ele acomodo um pedaço de berinjela. Delicadamente, acrescento um pouco do molho na parte superior, sem deixar escorrer pelas bordas. Acomodo fatias de mozarela, salpico queijo ralado, orégano e alcaparras. Sirvo assim, em temperatura ambiente ou levo ao forno preaquecido para gratinar por dez minutos. Decoro com as pontinhas de manjericão e sirvo. É possível, ainda, deixar descansar na geladeira e servir o prato frio. Se optar por levar ao forno, coloque os galhinhos de manjericão depois, para não queimarem.Veja só: quando possível, escolha berinjelas parecidas em tamanho e peso, com o mesmo porte, longas, retas e com as cinturas semelhantes. Prefira as mais leves, de pele lisa e brilhante, jovens. Quando estão pesadas demais, foscas e murchas, é porque estão velhas, as sementes já amadureceram, ficam escuras e pesam mais.Veja só 2: berinjela frita é ótima, mas seu miolo suculento funciona como uma esponja. No processo, ela absorve todo o óleo, o que pode deixá-la perigosa para sua saúde. Ela suga, por exemplo, quatro vezes mais gordura do que a batata. Portanto, é aconselhável utilizar óleo de canola ou azeite extravirgem no preparo.E tem mais: para a berinjela não soltar tanta água na confecção do prato, em especial em lasanhas e caponatas, coloque-a para suar. Corte no formato pretendido, passe uma boa pitada de sal grosso, deixe descansar por cerca de duas horas e escorra a água eliminada. Assim, ela perderá, também, um pouco de seu gosto amargo e picante.

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