GAUDÊNCIO TORQUATO

A estúpida banalização da maldade

Gaudêncio Torquato
17/05/2013 às 05:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 15:49

Qual é a relação entre a expansão da criminalidade e a da insatisfação social? Tudo a ver. A primeira argumenta que a queda da desigualdade entre classes diminui a insatisfação social, fazendo refluir a violência; a segunda levanta a hipótese de que o ganho com ações ilegais diminui ante o aumento da renda das famílias.Entre 2001 e 2011, a renda dos 10% mais ricos cresceu 16,6% e a dos mais pobres, 91,2%. Diante da evidência de que o País ganhou um dos maiores programas de distribuição de renda da contemporaneidade, restaria fechar o parágrafo com aplausos ao corolário: a violência diminui no Brasil graças ao aumento do Produto Nacional Bruto da Felicidade. Verdade? Não. Sofisma. A comunidade vive em clima de medo e insegurança. Por todo lado, se multiplica a marca da violência.O fato é que o roteiro de monstruosidades não combina com o retrato de bem-estar com o qual se procura apresentar o País. O que explica o clima de insegurança, quando as trombetas da administração fazem ecoar hinos ao conforto social resultante de um programa-símbolo de distribuição de renda? Ou será que, no caso da criminalidade, não se pode usar o termômetro da igualdade/desigualdade social para explicar o fenômeno? A questão causa polêmica e boa dose de contradição.A PUC-Rio fez um estudo para o Banco Mundial em que mostra que a redução da desigualdade via Bolsa Família foi a principal causa da diminuição da violência em São Paulo entre 2006 e 2009. A expansão do programa teria sido responsável por 21% do total da queda de criminalidade. Em 2012, porém, o número de homicídios em São Paulo cresceu 34% em relação ao ano anterior. No quadro geral da criminalidade em todo o Estado, o incremento foi de 15%.Diante da aparente contradição entre mais igualdade social e maior taxa de criminalidade, faz-se necessário colocar no caldeirão da violência outros ingredientes, a começar pela obsolescência do Código Penal. O mesmo se pode dizer do Estatuto da Criança e do Adolescente, que carece de atualização para acompanhar os avanços tecnológicos e o instrumental formativo/informativo que eleva as condições dos jovens. A par de problemas endógenos da estrutura policial, espraia-se pelo território o consumo de drogas e álcool, na esteira da massificação dos produtos identificados com diversão e ócio. Também a morosidade da Justiça leva à sensação de impunidade.A conclusão é inescapável. O Brasil prepara-se, com muito temor, para sediar os dois mais importantes eventos esportivos da era moderna, Copa do Mundo e Olimpíada. A esta altura, deveria empenhar-se para exibir a estética de seus estádios e cidades e estender os braços do Cristo aos milhares de turistas que para cá se deslocarão.Sejamos realistas. Daqui a um ano, é pouco provável que tenhamos um ambiente social mais harmônico e menos turbulento. Continuaremos a ser o país que concentra 3% da população e 9% dos homicídios no mundo. Não é de se espantar que a onda de crimes cada vez mais hediondos esteja banalizada.

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