CARLO CARCANI

À espera do próximo Kevin

Carlo Carcani
26/02/2013 às 15:11.
Atualizado em 26/04/2022 às 03:13

Com agilidade incomum, a torcida Gaviões da Fiel não apenas identificou e localizou o suposto autor do crime que tirou a vida de uma criança boliviana, como ainda o levou para dar entrevista ao Fantástico e se apresentar à Justiça.

É curioso notar que, no mesmo País onde um motorista alcoolizado não precisa se submeter ao bafômetro para não criar uma prova contra si mesmo, um advogado afirma com todas as letras que seu cliente, um menor de 17 anos, disparou o sinalizador naval que matou Kevin em Oruro.

O discurso do advogado Roberto Cabral parece mais o de um promotor. Ele garante que não há a menor dúvida que foi seu cliente que acidentalmente disparou o sinalizador e ainda dá a informação adicional que todos os artefatos encontrados no estádio pertenciam a ele. Advogados criminalistas costumam ignorar as mais óbvias evidências para tentar convencer a Justiça e a opinião pública de que seus clientes são inocentes, mas nesse caso ocorre exatamente o contrário. O advogado se esforça para mostrar ao mundo que um menor foi o único responsável por tudo de ruim que aconteceu. Os outros todos são inocentes.

Vamos partir do princípio que o garoto apresentado tenha sido mesmo o autor do disparo. Afinal, como diria o presidente corintiano Mário Gobbi, é difícil imaginar que alguém seja capaz de forçar um menor a assumir um crime de repercussão mundial apenas para livrar os 12 torcedores detidos na Bolívia e eliminar a punição imposta pela Conmebol ao Corinthians.

Sendo assim, notem que as preocupações dos personagens de todos os atos dos últimos dias se concentram em libertar os 12 indiciados na Bolívia e livrar o Corinthians. Nenhuma figura importante manifestou preocupação em trabalhar para impedir novas atrocidades como essas. Ninguém fala em um estudo de ações conjuntas para combater a violência das torcidas.

Um garoto morreu na Bolívia, uma garota foi ameaçada em Curitiba por que pediu uma camisa para um ídolo da Seleção e do “outro time”, um jovem campineiro foi morto em uma briga após um “derbinho”, o corpo de um torcedor foi jogado no Tietê, emboscadas a ônibus são cada vez mais comuns e por aí vai. Esses são apenas alguns de muitos casos semelhantes. Mas os dirigentes ignoram tudo isso. E a consequência é que logo teremos novas tragédias inadmissíveis como a de Kevin.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por