ZEZA AMARAL

A banana e o feijão

Zeza Amaral
28/04/2014 às 21:25.
Atualizado em 24/04/2022 às 14:26

Um torcedor do Villarreal jogou uma banana no gramado e o ala brasileiro Daniel Alves pegou a fruta e a comeu e, em seguida, bateu um escanteio. E o ato racista virou uma piada mundial, graças ao bom humor e altivez do jogador de bola. O torcedor racista foi identificado, horas depois, por outros torcedores da equipe, e teve a sua carteira de sócio cassada pela diretoria do clube que, também, proibiu a presença desse torcedor em seu estádio pelo resto da vida.No Brasil, torcedores invadem o campo, jogam objetos no gramado, quebram o que podem no campo adversário e a vida segue, sem maiores problemas até mesmo quando a violência resulta em lesões físicas e assassinatos.O Ministério Público Estadual do nosso estado, por exemplo, já obrigou as torcidas organizadas dos grandes (!?) clubes de São Paulo a um termo de compromisso e a sanha violenta ainda segue imperando em nossos estádios, constrangendo torcedores pacíficos e fazendo sofrer famílias que têm seus parentes sendo feridos e mortos por conta de uma festa que deveria ser alegre e sem a menor chance de ser transformada em um filme de extrema violência.Daniel Alves pegou a banana e a comeu, sem que tal gesto significasse o dar a outra face para ser agredida, visto que ele bem sabe não ser um Cristo que perdoa os que não sabem o que fazem. Disso ele sabe: os racistas sabem muito bem o que fazem. Daí não merecerem o perdão de quem quer que seja. E ele não é nenhum santo, apenas um jogador de futebol que ganha a vida para fazer a diversão de quem gosta do assunto. Um ato emblemático porque naquele mesmo dia, ou quase na mesma hora, dois Papas estavam sendo canonizados pela Igreja Católica.Futebol e santos fazem parte da vida. Sou agnóstico tanto ao futebol quanto aos santos. Mas o ato de Daniel Alves comer e dar uma banana metafórica ao racismo é uma das coisas mais didáticas que já vi na minha vida, um pouco longa o bastante para finalmente acreditar que o bom humor ainda é a melhor arma para combater idiotas males da humanidade, principalmente o pior deles: o racismo — que nem racismo é porque negros, brancos, amarelos, vermelhos e mestiços são todos pertencentes à raça humana (ou será que preciso explicar com maçãs?).Sou ponte-pretano e torcedor da Macaca, um racismo que já superamos há mais de cem anos. Mas algo me diz que nem todos os homens que comem banana são um ponte-pretano. No caso, admiro a inteligente atitude cívica do ala Daniel Alves, mas, sinceramente, ele ainda tem de comer muito feijão para jogar na minha seleção. E muito mais no meu time. É isso.

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